Diante de todas as notícias relacionadas à pandemia, ameaças de golpe, crises institucionais entre o judiciário e o presidente Jair Bolsonaro, e o aumento da inflação que corrói o poder de compra, os brasileiros foram informados na noite do dia 31 de agosto, pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que o país está em meio a uma das piores crises hídricas e energéticas de sua história. Em 90 anos, nunca choveu tão pouco na região centro-sul do país.
“Trata-se de um fenômeno natural que também ocorre com a mesma intensidade em outros países. Hoje informo a todos que nossa situação hidro energética piorou”, afirmava o ministro em cadeia de rádio e TV.
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Apesar das justificativas do mandatário da pasta, especialistas da área do clima já alertavam anos antes: o avanço das queimadas na Amazônia poderiam levar o país a um colapso hídrico e elétrico.
Mas qual a relação entre o avanço das queimadas na região norte, e a seca no sudeste e sul? De acordo com ambientalistas ouvidos pela reportagem do Brasil de Fato Paraná, é bem mais próxima do que se imagina, provocando inclusive uma ação judicial contra o Estado brasileiro por litígio climático.
Os rios no ar
Os rios voadores são cursos de água atmosféricos, formados por massas de ar carregadas com vapores de água, muitas vezes acompanhados por nuvens e propagado pelos ventos.
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O professor Eloy Casagrande, PhD em engenharia de recursos minerais e meio ambiente pela Universidade de Nottingham (Inglaterra), auditor ambiental pelo EARA, explica que a quantidade de umidade liberada na Amazônia irriga as chuvas no sul e sudeste.
“A quantidade de água que se desloca da região amazônica para o sul, sudeste e centro-oeste, e que as vezes pode chegar a ser maior com a água evaporada muitas vezes pela copa das árvores, pode ser maior que a vasão do Rio Amazonas, cerca de 200.000m³ por segundo”, conta.
Casagrande ainda explica que toda a água bombeada pelas árvores grandes, pode chegar a transpirar mais de mil litros em apenas uma copa. “Se você pegar 600 bilhões de árvores na Amazônia, imagine a quantidade de água que é formada em 24 horas em nuvens e trazidas para o sul do Brasil”, pontua o professor.
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As queimadas antecedem a seca
De acordo com artigo publicado em 2017 pela Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa), as florestas são responsáveis pela reciclagem das chuvas na Amazônia.
O meteorologista Pedro Silva Dias, da Universidade de São Paulo (USP), citado em um estudo publicado pelo biólogo norte-americano Philip Fearnside, destaca que, só em São Paulo, 70% das chuvas depende do vapor d’água amazônico e a sua redução, que poderia ser causada pelo desmatamento em larga escala, seria capaz de provocar consequências seríssimas ao abastecimento de água.
Neste último mês de agosto, de acordo com o Programa de Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a Amazônia registrou 28.060 focos de queimadas, sendo o terceiro maior índice para o mês desde 2010, perdendo apenas para as históricas queimadas de 2020 e 2019. Em paralelo, o país registrou a pior seca dos últimos 91 anos para o período de setembro, segundo o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE).
A relação de causalidade, para o professor Eloy Casagrande, é direta e custará um alto preço para a economia. “É um tiro no pé para o próprio agronegócio, um dos principais responsáveis pelo aumento das queimadas. O setor está colaborando para sua própria crise. Estamos vivendo um estado de desespero climático, somado a questão da Amazônia, será um alto preço para a agricultura”, analisa.
Além do preço para a agricultura, o governo federal já avisou que irá subir as tarifas de luz, com o aumento das bandeiras tarifárias em 50%, para conter o consumo de energia e segurar a situação das hidrelétricas.
Estabilidade climática é um direito
Para o advogado DéltonWinter de Carvalho, representante do Instituto de Estudos Amazônicos, que ajuizou uma ação de litígio climático contra o Estado brasileiro, a estabilidade climática deve ser um direito fundamental.
Uma ação que exige que o governo brasileiro cumpra metas ambientais está atualmente tramitando na justiça federal. Para Carvalho, a ação busca alertar o Estado para a crise ambiental. “O Estado brasileiro precisa garantir políticas de estabilidade climática para preservar os direitos sociais e fundamentais do cidadão.”
Fonte: BdF Paraná
Edição: Frédi Vasconcelos e Lia Bianchini