Oito milhões e meio de quilômetros quadrados. É a área territorial do país continente chamado Brasil. São 214 milhões de pessoas vivendo entre as mais densamente habitadas metrópoles e os mais longínquos rincões em florestas, por exemplo. Para que os serviços públicos alcancem essa complexidade demográfica, os órgãos estatais demandam deslocamentos constantes de seus servidores e estruturas. Um Raio-X das viagens governamentais mostra, contudo, que uma maior eficiência com esses gastos se faz necessária.
O comparativo de dados mais recente ilustra essa necessidade. De 2020 para 2021, os gastos com passagens e diárias cresceram 38%, chegando a R$ 752,8 milhões. É um acréscimo superior aos 23% processos de viagens (395,4 mil em 2021). Os números incluem viagens nacionais (91% do total) e internacionais (9%), de órgãos da administração direta (ministérios) e indireta (autarquias, institutos, fundações, universidades).
Além de o salto nas despesas ter sido maior que o incremento no número de viagens, foi bem superior ainda (o triplo) em relação à inflação oficial de 2021 (10,16%). É importante dizer que o aumento não decorre só do reajuste nos preços dos produtos e serviços (como passagens aéreas, hospedagem e alimentação). Os dados – todos disponíveis no Portal da Transparência, atendendo à legislação de 2014 que determina ampla publicidade dos gastos públicos – indicam haver outros motivos.
Entre eles, o planejamento com antecedência das viagens. Em 2021, as compras de passagens aéreas pelos órgãos governamentais federais foram feitas com, em média, 12 dias de antecedência. No ano anterior, essa antecipação era de 21 dias. Há situações, conforme se vê em levantamento no mesmo portal, em que as compras são feitas de um dia para outro ou, no máximo, em três dias.
“Sabemos que as passagens aéreas quanto mais compradas ‘em cima da hora’ mais caro custam. É bem verdade que nem todas as viagens corporativas podem ser previamente planejadas; imprevistos podem exigir deslocamentos emergenciais. Mas isso deve ser exceção”, observa o executivo Marcelo Linhares, fundador e CEO da Onfly – startup de gestão de viagens corporativas há três anos no mercado –, que antes dela já acumulava mais de dez anos em gestão de logística on-line.
Os gastos com passagens aéreas representam em torno de 25% das despesas das viagens governamentais federais. Os outros 75% se referem às diárias, isto é, o quanto os servidores recebem para cobrir despesas com hospedagem, alimentação e transporte terrestre (como táxi). Principalmente no item hospedagem, o planejamento com antecedência é também fundamental para encontrar diárias de hotéis mais em conta.
Outro problema constatado é a redução da transparência com esses gastos. O critério do “sigilo” vem sendo aplicado em praticamente um em cada quatro reais destinados ao pagamento de passagens e diárias, nos últimos dois anos.
MÉDIA ANUAL E RETOMADA
Apesar do crescimento das despesas das viagens governamentais em 2021, elas se encontram em patamar inferior ao do período pré-pandemia de Covid-19. Em 2019, por exemplo, o montante chegou a R$ 1,3 bilhão. No acumulado entre 2014 e 2021, são R$ 8,9 bilhões – isto é, média anual acima do bilhão (R$ 1,1 bi, aproximadamente).
Portanto, projeta Linhares, a partir deste ano, com a estabilização da pandemia, e principalmente pós-2023 – em um cenário de mínimas restrições fitossanitárias –, a tendência é de reaquecimento das viagens governamentais. Até porque, acrescenta, serviços represados nos momentos mais graves da pandemia serão retomados.
O especialista ressalva, ainda, que os números se referem apenas a viagens governamentais federais. Além dessas, há os deslocamentos corporativos dos servidores das 27 unidades da federação.
Dessa forma, maior eficiência na gestão das viagens governamentais se impõe. “Afinal, é um tipo de despesa necessária, indispensável. Mas é gasta com o nosso dinheiro. Precisamos, então, saber quanto custa, quanto pagamos e se esse custo é justo e eficiente”, sublinha Linhares.
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ALGUNS NÚMEROS DAS VIAGENS GOVERNAMENTAIS FEDERAIS
Comparativo 2021 x 2020
Despesas (passagens e diárias)
2020: R$ 542,8 milhões
2021: R$ 752,6 milhões
Crescimento de 38%
Número de viagens
2020: 319,8 mil
2021: 395,4 mil
Crescimento: 23%
Acumulado 2014-2021
R$ 8,9 bilhões (R$ 1,1 bilhão/ano)
Em 2021
91% viagens nacionais; 9% viagens internacionais
75% dos gastos com diárias; 25% com passagens aéreas
Órgãos com maior participação nesses gastos:
Ministério da Justiça: 52%
Ministério da Defesa: 17%
Ministério da Educação: 4%
OUTRAS INFORMAÇÕES
Sobre as despesas com viagens governamentais, acessar o Portal da Transparência:
https://portaltransparencia.gov.br/viagens?ano=2022