Em evento esvaziado, Marília Arraes se lança à governadora de Pernambuco pelo Solidariedade

Diário Carioca
               Na manhã desta sexta-feira a deputada federal Marília Arraes assinou sua ficha de filiação ao partido Solidariedade, pelo qual será candidata a governadora de Pernambuco. Apesar da convocatória nas redes sociais, foram poucos apoiadores compareceram ao evento para ver Marília fazer críticas aos seus dois ex-partidos: PSB e PT. Também não se viu outras lideranças políticas, de modo que Marília esteve acompanhada apenas do deputado Paulinho da Força (SP), presidente nacional do novo partido.
A decoração deu o tom do que será a campanha: imagem de Marília com o ex-presidente Lula (PT), sob a frase “Marília com Lula”; balões laranja misturados aos vermelhos, sinalizando que ela agora é do Solidariedade, mas pretende manter os votos do eleitorado petista. Houve poucos apoiadores (cerca de 15 ou 20), quase todos homens e de meia idade. Pouquíssimas mulheres ou jovens.
Agendado para as 9h, mas iniciado às 10h, o evento aconteceu no Recife Praia Hotel, bairro do Pina – coincidentemente o mesmo hotel em que seu adversário Danilo Cabral lançou a candidatura a governador, cinco semanas antes. Após breve fala de Paulinho da Força (SD), Marília Arraes fez um discurso de 15 minutos e em seguida respondeu por 45 minutos a perguntas da imprensa.
A deputada federal disse que, agora, no Solidariedade, ela entra no jogo [eleitoral] “com a segurança de que serei candidata”, em evidente referência ao fato de, em 2018, ter tido sua pré-candidatura vetada pelo PT em nome da aliança com o PSB. “É preciso coragem para não me acomodar, para enfrentar os poderosos”, disse ela. “Não escolhi a zona de conforto e nem o caminho mais fácil. (...) Às vezes vale muito mais a pena estar do lado dos que perderam”, emendou.
Apesar da tímida presença de apoiadores, a ex-petista disse estar representando “os anseios de muita gente”. “Esse projeto não é meu ou de um grupo pequeno”. Questionada por estar ingressando num partido que apoiou o impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016 e que apoiou Aécio Neves (PSDB) desde o 1º turno em 2014, Marília disse estar tranquila, porque o Solidariedade já declarou que estará apoiando Lula este ano. “Sigo outro caminho, mas com a mesma forma de caminhar”, disse Arraes.
“Fator Lula”
O uso da imagem e nome do ex-presidente Lula deve ser um tópico à parte na disputa eleitoral deste ano. Pernambucano, Lula tem grande popularidade e intenção de voto no estado. Mesmo candidatos de direita evitam fazer críticas ao petista. Oficialmente Lula e o PT estão apoiando a candidatura de Danilo Cabral (PSB), mas Marília Arraes passou os últimos 6 anos filiada ao PT e construiu relação – e muitas imagens – com o líder petista. Ela pretende usar o “fator Lula” a seu favor, enquanto o PSB busca ter exclusividade de uso da imagem do petista.


Marília teve encontro com Lula na última segunda, mas não recebeu garantias de apoio para uma postulação a governadora / Cláudio Kbene

Marília já está com o discurso pronto. Ela pontua que Lula, assim como Miguel Arraes, “não é propriedade de uma pessoa ou partido, mas um símbolo do povo brasileiro”. Na última disputa pela Prefeitura do Recife, contra seu primo João Campos (PSB), ela foi alvo de cartazes relacionando as imagens sua e de Lula à corrupção e a posições anticristãs. “Sempre estarei ao lado de Lula, mesmo enfrentando difamação. Estou com Lula não apenas pela pessoa, mas pelo projeto de país e sociedade mais justa que ele representa”, completou Marília.
A ex-petista se coloca como a verdadeira defensora do líder petista no estado. “Sempre estive ao lado de Lula e sempre vou estar. Não sou como o PSB, que foi aliado de Lula, depois virou oposição e fez campanhas antipetistas [2014 e 2016], depois voltou a apoiar Lula [2018], depois foi antipetista de novo [eleições municipais do Recife em 2020] e agora volta a virar amigo de Lula”, disparou Marília.
PT: críticas a caciques e chamado à militância
Apesar do desgaste de sua saída do Partido dos Trabalhadores, Arraes sabe que seu principal recall está junto aos simpatizantes do PT, de modo que ela precisa dos votos da base petista se quiser chegar ao segundo turno. Além das falas sobre Lula, ela também fez outros acenos aos petistas. “Sou muito grata ao PT, partido ao qual me filiei no seu momento mais difícil [2016], em que o partido era alvo de criminalização [Lava Jato] e impeachment”. Ela se dirigiu diretamente à “militância aguerrida do PT”: “quero dizer a eles que sempre estarei representando seus anseios. (...) Sigo com os mesmos princípios”, pontuou.
Mas ela também fez referência, já em seu discurso inicial no evento, à pré-candidatura frustrada de 2018, “que não se concretizou por motivos que Pernambuco conhece”. Ela também disse que “a forma de condução no PT local nos prejudica bastante”, afirmou que sua relação com o senador Humberto Costa (PT) tem um “desgaste que não é de hoje – e é sem motivos políticos” e ainda disparou que “Pernambuco sabe quem coloca o PT a serviço de projetos pessoais”.
Senadora pelo PT? Não
Sobre ter tido seu nome indicado ao Senado pelo PT, cargo que disputaria aliada ao PSB, dentro da chapa da Frente Popular, Marília reafirmou: “não fui questionada se gostaria ou não de estar nessa disputa”. E pontuou que “as pessoas sabem que sou uma pessoa de posicionamento, não chego de repente e ‘viro a chave’ só para ganhar um cargo”.


Em 2018 Marília foi pré-candidata ao governo, mas uma costura nacional levou o PT Pernambuco a fechar apoio à reeleição de Paulo Câmara (PSB) / Divulgação

Há pelo menos quatro anos Arraes mostra desejo de enfrentar disputas maiores, mirando o Palácio do Campo das Princesas. E devido aos seus últimos 8 anos como opositora do PSB, não seria fácil de explicar uma candidatura ao Senado numa chapa com o PSB – e nem havia, devido a política de alianças de seu partido, não havia espaço para sua candidatura própria no PT. De modo que o caminho para ela fazer disputas maiores era sair do partido. E isso já estava posto desde 2021.
Mas o discurso de que ela teria sido “vítima” novamente do processo interno do PT é algo controverso. Desde o dia 15 de fevereiro, quando Danilo Cabral (PSB) foi escolhido candidato pela Frente Popular, o PT confirmou o apoio a postulação e passou a reivindicar a candidatura ao Senado nessa chapa. Os debates para a indicação do PT para a vaga foram feitos através do “Grupo Tático Eleitoral”, que contava com representantes do grupo de Marília. Membros da Executiva do PT afirmam que Marília Arraes, assim como Carlos Veras, Teresa Leitão e Odacy Amorim colocaram seus nomes para a indicação.
Os debates se arrastaram por um mês e houve desgaste na relação. No último domingo (20) o partido decidiu pelo nome de Marília para o Senado, indicação que ela rejeitou e, desde então, tem dito que não postulou essa indicação.
O Brasil de Fato perguntou a deputada sobre a questão, se ela em algum momento cogitou ser candidata ao Senado pelo PT e pela Frente Popular, mas ela se negou a responder, alegando que só responderia a falas “com nome e CPF”. Ela se resumiu a dizer que pediu ao PT “responsabilidade na condução desse processo por parte do Partido dos Trabalhadores, mas não vi essa responsabilidade acontecer”.
Busca por aliados
Em 2020 Marília Arraes apoiou a candidatura do bolsonarista Anderson Ferreira (PL) à reeleição na Prefeitura de Jaboatão dos Guararapes. Ela também mantém boa relação e tem realizado reuniões com a prefeita de Caruaru, Raquel Lyra (PSDB), e com o prefeito de Petrolina, Miguel Coelho (União Brasil). Os três são também pré-candidatos ao Governo de Pernambuco.
Falou-se em uma possível composição com algum dos grupos, mas Marília refuta a possibilidade de ser candidata ao Senado. “Chapa se constrói até o dia da convenção”, adiantou ela, sinalizando não ter pressa. “Tenho diálogo e conversarei com atores políticos de qualquer frente, desde que possamos aumentar o palanque de Lula no estado. (...) Uma unidade contra Bolsonaro para resgatar o Brasil desse caos”, disse ela, que não vê contradição em buscar partidos que nacionalmente devem apoiar a reeleição do atual presidente. “O palanque do PSB também é assim”, resumiu. Ela reafirmou sua candidatura a governadora “para Pernambuco voltar a sonhar, ter esperança (...), voltar a crescer com justiça social”.


O dirigente do Solidariedade garantiu que a sigla em Pernambuco será comandada por Marília / PH Reinaux/divulgação

Marília deu pistas de que conquistar aliados na disputa contra o PSB tem sido difícil, por isso agradeceu sua “tropa, que tem enfrentado pressão, (...) mas vai enfrentar esse projeto de poder pelo poder”. Ela também disse que é preciso “atitudes de coragem para mudar Pernambuco e o Brasil”.
Uma candidatura competitiva para o Governo do Estado precisará de prefeitos aliados e de candidatos a deputados estaduais e federais, além de outros partidos que se somem. Marília tem pouco tempo para atrair candidatos proporcionais. O ex-presidente do Solidariedade em Pernambuco, Augusto Coutinho, abandonou o partido justamente por não ter conseguido viabilizar uma chapa competitiva para se reeleger para a Câmara Federal.
“Rainha das mulheres do Brasil”
Seu novo dirigente partidário, Paulinho da Força (SD-São Paulo), se referiu a Marília como “Rainha das mulheres do Brasil” e “símbolo da luta das mulheres”, garantindo espaço para ela na propaganda partidária do Solidariedade, que vai ao ar nacionalmente no mês de maio. Ele disse que a saída dela do PT “tirou as amarras que a prendiam”, confirmando que Marília “vai comandar o Solidariedade em Pernambuco” e somar forças “com Lula, para derrotar o bolsonarismo”.
Ele avalia que a candidatura de Marília “vai aglutinar a oposição” para “tirar essa turma que está aí há 16 anos”. O dirigente pode ter esquecido, mas o Soldiariedade desde sua fundação (2012) integra a Frente Popular, sendo base de apoio do PSB e apoiando as candidaturas socialistas em todas as eleições desde então – o que se repetiria novamente este ano, caso Augusto Coutinho não tivesse migrado para o Republicanos, deixando o Solidariedade no estado “livre” para ser dado a Marília Arraes. Noutro momento, enquanto tecia críticas à condução de Bolsonaro no tema pandemia, o deputado disse que conseguiu passar esses dois anos imune à covid. “Me perguntam se foi a vacina, mas foi a cachaça”.
            Edição: Vanessa Gonzaga


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