Diante do suposto esquema de corrupção na distribuição de verbas do Ministério da Educação para prefeituras, o presidente Jair Bolsonaro (PL) saiu em defesa do ministro Milton Ribeiro e disse que “bota a cara no fogo” pelo pastor. "O Milton, coisa rara de eu falar aqui: eu boto minha cara toda no fogo pelo Milton. Estão fazendo uma covardia contra ele", disse Bolsonaro, durante sua live semanal no Facebook, nesta quinta-feira (24).
O capitão reformado, entretanto, ignora as movimentações ao redor do caso. Para os ministros do Supremo Tribuna Federal (STF), Ribeiro não dura nem mesmo até o fim do inquérito instaurado pela Corte a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), segundo apuração da CNN Brasil.
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Bolsonaro: “O Milton, coisa rara de eu falar aqui: eu boto minha cara toda no fogo pelo Milton” / Reprodução/Twitter
Além de determinar a abertura da investigação nesta quinta-feira (24), a ministra Cármen Lúcia aceitou o pedido da PGR para que Milton Ribeiro e os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura sejam ouvidos, além de prefeitos que denunciaram os supostos pedidos de propina em troca de verbas. Os pastores seriam os responsáveis por intermediar os negócios a pedido do presidente Bolsonaro.
Em sua decisão, a ministra afirmou que “a gravidade do quadro descrito é inconteste e não poderia deixar de ser objeto de investigação imediata, aprofundada e elucidativa sobre os fatos e suas consequências, incluídas as penais”.
A ministra disse ainda que “as circunstâncias expostas, que evidenciariam ocorrência de práticas delituosas a serem apuradas com o prosseguimento de ação penal pública incondicionada, tornam indispensável, segundo a manifestação do Ministério Público, o aprofundamento da investigação dos noticiados crimes”.
Cármen Lúcia ainda determinou que o Ministério da Educação e a Controladoria-Geral da União (CGU) enviem esclarecimentos sobre o cronograma e os critérios de distribuição de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
No pedido enviado ao STF, o procurador-geral Augusto Aras justificou que é necessário investigar se os envolvidos cometeram “os delitos de corrupção passiva privilegiada (art. 317, § 2- do Código Penal), prevaricação (art. 319 do Código Penal), advocacia administrativa (art. 321 do Código Penal) e tráfico de influência (art. 332 do Código Penal)”, escreveu o procurador-geral. O PGR, no entanto, não incluiu o presidente Bolsonaro em seu pedido.
Com sete meses de apuração, CGU envia investigação para a PF
Depois de sete meses e o caso vir à tona, a CGU enviou, nesta quinta-feira (24), uma investigação preliminar sobre os supostos pagamentos de propinas no Ministério da Educação para a Polícia Federal (PF). O órgão informou que encaminhou um “relatório produzido e das evidências coletadas” durante instrução preliminar aberta em agosto de 2021, 20 após a conclusão dos trabalhos, em 3 de março.
Na quarta-feira (23), Ribeiro, que vinha evitando se pronunciar sobre o caso publicamente, disse que solicitou uma investigação dos pastores Gilmar dos Santos e Arilton Moura, citados no esquema, à CGU por “ações não republicanas”, em agosto de 2021. “Quando em agosto eu recebi uma denúncia anônima a respeito da possibilidade de que eles [os pastores Gilmar e Arilton] estariam praticando algum tipo de ação não republicana, imediatamente eu procurei a CGU e fiz redigir um ofício em que eu noticio o ministro da CGU que houve esse tipo de indicação”, disse o ministro em entrevista à Jovem Pan.
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Mesmo após levar o caso à CGU, o ministro Milton Ribeiro se encontrou pelo menos cinco vezes com o pastor Arilton Moura no Ministério da Educação e outras duas fora da pasta, sendo uma delas em Camboriú (SC), segundo um levantamento do Estadão. Na ocasião Ribeiro destacou a amizade “ao pastor Gilmar e Arilton, que estão lá em Brasília mais perto”. No total, o ministro recebeu ao menos 44 prefeitos ao lado dos pastores Moura e Santos, entre visitas tidas como “cortesia” e “alinhamento político”.
Esquema na Educação envolvia compra de bíblia, dinheiro para igrejas e propina em ouro
De acordo com entrevistas de prefeitos, o esquema de negociação de recursos no Ministério da Educação esbarrava em compra de bíblias, pedidos de propina em ouro e fila de pastores para participar das negociações.
Ao O Globo, os prefeitos de Bonfinópolis (GO), Professor Kelton, e de Boa Esperança do Sul (SP), José Manoel de Souza, afirmaram que o esquema envolvia a compra de bíblias para serem distribuídas nos municípios visitados pelo ministro Milton Ribeiro e dinheiro da igreja evangélica. Um dos pastores supostamente envolvidos no conluio, Gilmar Santos, é dono da editora Cristo para Todos, que fabrica versões da bíblia.
Em outra ocasião, o pastor Arilton Moura teria pedido um quilo de ouro para o prefeito do município de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB) em troca da liberação de recursos para a construção de escolas e creches. “Ele [Arilton] disse: ‘Traz um quilo de ouro para mim’. Eu fiquei calado. Não disse nem que sim nem que não”, afirmou Braga sobre uma conversa que teria ocorrido em abril de 2021, durante um almoço no restaurante Tia Zélia, em Brasília, depois de uma reunião com Milton Ribeiro, ministro da Educação.
No total, pelo menos 10 prefeitos relataram a presença de pastores na intermediação de recursos ou no acesso direto ao ministro da Educação, depois que o esquema foi revelado pela imprensa: Gilberto Braga (Luis Domingues - MA), Kelton Pinheiro (Bonfinópolis - GO), José Manoel de Souza (Boa Esperança do Sul - SP), Nilson Caffer (Guarani D'Oeste - SP), Adelícia Moura (Israelândia - GO), Laerte Dourado (Jaupaci - GO), Doutor Sato (Jandira - SP), Fabiano Moreti (Ijaci - MG), André Kozan (Dracena - SP) e (Edmario de Castro Barbosa (Ceres - GO).
Edição: Vivian Virissimo