Os serviços para a população em situação de rua da maior cidade do país estão em condição precária e representam risco de vida para os usuários. A conclusão é da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Câmara Municipal de São Paulo, que divulgou nesta quinta-feira (14) um relatório a respeito dos centros de acolhida.
Os parlamentares que integram a comissão verificaram os centros de acolhimento e encontraram estruturas com risco de desabamento, ausência de fornecimento de água, rede elétrica incompatível com o número de equipamentos, ausência de extintores, móveis enferrujados e falta de tela de proteção.
“Foram encontrados espaços com condições de higiene péssimas, com presença de pombos nos refeitórios e percevejos nos quartos, vasos sanitários entupidos e ausência de limpeza”, diz a CDH.
Além disso, a quantidade de banheiros e lavanderias não é compatível com a quantia de pessoas acolhidas. “Colchões de péssima qualidade e ausência de distribuição de toalhas também foram vistos, com as pessoas se enxugando com a própria roupa após o banho”, informa o relatório.
A CDH destaca que, no momento em que ocorre uma crise humanitária gravíssima na cidade de São Paulo, com aumento vertiginoso de pessoas e famílias inteiras em situação de rua, apenas a sociedade civil tem se movimentado para ajudá-las “Não há respostas concretas e eficientes da Prefeitura, do Governo do Estado e do Governo Federal”, pontua o documento.
Violações vão além dos centros
O vice-presidente da CDH, Eduardo Suplicy, afirmou ao Brasil de Fato que tem recebido denúncias da população de rua a respeito dos auxílios que deveriam ser pagos a eles pelo governo. Segundo o ex-senador, muitos relataram que não conseguem nem se inscrever para receber o benefício.
"Eu tenho tido muita interação com os moradores e tenho perguntado a eles se estão escritos no cadastro único e se estão recebendo algum benefício. E um ou outro está recebendo, mas um grande número não está. João Roma chegou a afirmar que a fila está zerada, mas conversando com moradores em situação de rua eu percebo que muitos deles tentaram se inscrever e não conseguiram", disse Suplicy.
Para ele, é nítido que houve aumento da população de rua nos últimos anos, durante o governo de Jair Bolsonaro, em meio a desemprego e a pandemia. "É evidente que nesse período mais recente, nos últimos dois anos, aumentou significativamente a população em situação de rua", falou.
Em relação às denúncias do relatório da CDH, Suplicy conta que muitos moradores se recusam a ficar nos centros de acolhida por causa das condições insalubres. Ele diz que espera uma resposta eficiente da Prefeitura de São Paulo.
Segurança
O relatório mostra que a expressiva maioria (88,9%) dos espaços visitados apresentava questões de segurança que ameaçam a integridade física ou psicológica das pessoas em situação de rua.
O caso mais grave foi encontrado no CA Zaki Narchi I, no bairro do Carandiru, zona norte da cidade. Além do teto em ruínas, com chapas metálicas que se desprendem e ameaçam atingir os usuários do serviço, há a presença de gás metano no terreno, que se encontra contaminado.
Nos centros de acolhida em que havia a presença de crianças não havia tela de proteção nas janelas dos andares superiores, o que poderia ocasionar quedas fatais.
Alimentação
De acordo com o levantamento, dos espaços visitados, 77,8% apresentaram algum problema relacionado à alimentação, configurando uma das violações centrais detectadas pela Comissão de Direitos Humanos no âmbito geral do monitoramento realizado.
O documento também aponta a insuficiência da alimentação fornecida. A CDH ouviu relatos de que a quantidade de refeições servidas não supre a necessidade diária e os conviventes acabam procurando doações de marmitas.
Descaso com a alimentação nos centros de acolhida em SP / Divulgação/CDH
Quartos
O relatório aponta que todos os dormitórios dos centros de acolhida visitados apresentavam problemas. Em alguns locais foram identificados percevejos nas camas. Em outros havia mofo, limpeza deficiente, pouca ventilação e até fezes de pombo nos dormitórios. Também foi frequente a ausência de itens básicos como roupas de cama, iluminação, ventiladores e colchões.
Ao fundo, os riscos na parede são manchas de sangue das pessoas acolhidas após matarem os percevejos / Divulgação/CDH
“É urgente que o modelo de acolhimento seja superado em prol de políticas de moradia, trabalho e renda, educação, direitos humanos, cultura e direito à cidade voltadas para a população em situação de rua”, afirma a CDH.
Questionada sobre as denúncias trazidas nesta matéria, a prefeitura de São Paulo ainda não se manifestou. Este espaço estará aberto caso o Brasil de Fato receba respostas às perguntas feitas.
Edição: Rodrigo Durão Coelho