O desmatamento no Cerrado quase dobrou em dezembro de 2022 em comparação com o mesmo período em 2021. Foram 83.998 hectares derrubados, alta de 89% sobre os 44.486 ha desmatados no mesmo mês em 2021.
Os números são do SAD Cerrado (Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado), ferramenta de monitoramento do bioma desenvolvida pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com a rede MapBiomas e com o LAPIG (Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento), da UFG (Universidade Federal de Goiás).
O SAD revela que, em 2022, o desmatamento do Cerrado foi quase 20% maior do que em 2021 (com 691.296 ha derrubados), totalizando 815.532 hectares desmatados – uma área maior que a do Distrito Federal.
Durante os dois últimos anos, o Maranhão segue liderando como o estado que mais desmata, com destaque para o município de Balsas (MA), que em 2021 desmatou 14.527 ha e, em 2022, subiu para 24.581 ha, crescimento de quase 60% do desmatamento. O mês de dezembro foi o que mais acumulou área desmatada em 2022 neste município, totalizando 3.948 ha.
Estados e municípios
A devastação da vegetação nativa em Tocantins se sobressai quando comparada aos meses de dezembro dos dois últimos anos. Foram 2.650 ha, em 2021, e 20.257 ha em 2022 – um crescimento quase oito vezes maior.
Os municípios que aparecem no topo da lista do acumulado anual de 2022 são Balsas (MA), com 24.581 ha derrubados, São Desidério (BA) com 17.187 ha, e Alto Parnaíba (TO) com 11.112 ha – todos localizados na região do Matopiba. Em dezembro de 2022, foram 52.263 ha desmatados nesta região, representando 62% do total desmatado neste mês.
“Matopiba é a região com os últimos grandes remanescentes de Cerrado, mas também é a principal fronteira agrícola no bioma nos últimos anos, principalmente para soja“, afirma a pesquisadora do IPAM que atua no SAD Cerrado, Tarsila Cutrim Andrade. “Essa é a região onde se deveriam focar esforços para combater e reduzir o desmatamento no bioma”.
Tipos de vegetação
As formações savânicas, entre os diferentes tipos de vegetação do Cerrado, foram as mais afetadas pelo desmatamento em 2022: nessa vegetação se concentra 65% da área desmatada. Um fato alarmante é que, apesar de representar 10,6% da área de vegetação natural remanescente no bioma, as formações campestres já somam 23,8% do total do desmatamento em 2022.
Caso as propostas de legislações internacionais anti desmatamento considerem como áreas a serem protegidas apenas aquelas caracterizadas como florestas, de acordo com a definição da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), os biomas brasileiros que possuem prioritariamente outros tipos de vegetação nativa não florestal estarão descobertos, permitindo que as commodities ocupem essas áreas sem nenhuma repreensão do mercado, conforme aponta a diretora de Ciência do IPAM e coordenadora do MapBiomas Fogo e da equipe do Cerrado no MapBiomas, Ane Alencar.
“Grande parte da soja brasileira é produzida no Cerrado, por exemplo. Ao utilizar a caracterização de floresta da FAO, mais de 74% da área de vegetação nativa do bioma estaria desprotegida pela legislação europeia, justamente onde ocorre grande parte do desmatamento: mais de 85% do total”, destaca Alencar.
Categorias fundiárias
Os dados do SAD Cerrado revelam que a maior parte do desmatamento no bioma ocorre em propriedades privadas. Em 2022, cerca de 80% da área desmatada está nesta categoria. O restante está em vazio fundiário (13,5%), assentamentos (4,5%) e áreas protegidas (3,6%).
“Para combater o desmatamento no Cerrado, é necessário que exista uma ação conjunta entre setores privado, financeiro, e governos Estadual e Federal. Além de intensificar a fiscalização, é crucial que planos importantes sejam retomados, como o PPCerrado [Plano de ação para prevenção e controle do desmatamento e das queimadas no Cerrado]. O governo atual sinalizou que irá retomar essas ações, o que pode significar uma oportunidade”, afirma a pesquisadora no IPAM e coordenadora científica do MapBiomas, Julia Shimbo