Ataques às escolas demandam o desenvolvimento de políticas públicas, diz pesquisadora

Diário Carioca

Os recentes ataques em escolas no Brasil não são fatos isolados. Somente nas duas últimas semanas, foram três ataques com mortes e feridos, em São Paulo, Blumenau e Belém, e outros dois que foram desmobilizados antes de serem concretizados, em Londrina e no Rio de Janeiro, além de dezenas de ameaças registradas.

A onda de ataques em curto espaço de tempo pode começar a ser explicada pelo efeito de imitação. “Os agressores fazem isso por imitação, por inspiração principalmente em relação aos episódios de Columbine [1996, nos EUA], Suzano [2019] e Realengo [2011]”, afirma Cleo Garcia, coautora da pesquisa Ataques de violência extrema em escolas no Brasil pela Unicamp, advogada e especialista em Justiça Restaurativa. “Através desses ataques, eles esperam o reconhecimento, a fama, se tornar, como nas palavras deles, uma lenda, como eles entendem que esses outros que já perpetraram esse tipo de crime se tornaram.”

Existem, no entanto, muitos outros fatores que contribuem para a concretização desse tipo de violência. Um deles é a cooptação de crianças e jovens por grupos de extrema direita por meio da internet. “Nós podemos dizer também que eles cooptados por discursos extremistas”, explica. “Existem grupos extremistas com discursos de ódio que se amplificaram no Brasil a partir do segundo semestre do ano passado, por conta também do processo eleitoral. Então há muitos discursos de ódio, incitando ao crime e à violência contra esses grupos sociais, minorias sociais”, diz a pesquisadora.

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O perfil geral dos agressores também é homogêneo. “Eles são do sexo masculino, brancos, demonstravam um gosto por violência, um culto às armas”, afirma Garcia.

Na maior parte dos casos, esses ataques são executados por alunos ou ex-alunos das escolas atacadas. A pesquisa em questão tem como objetivo entender a motivação por trás desses ataques ao ambiente escolar. “Nosso objetivo é descobrir o significado da escola para esses alunos e ex-alunos e porque eles voltam para a escola”, explica.

Além disso, esses jovens geralmente relatam algum tipo de sofrimento emocional. “Esse aluno ou ex-aluno que já vem de um sofrimento — que pode ser de vários tipos, pode ser um sofrimento em escola, na família, de bullying, exclusão, uma sensação de rejeição, de não pertencimento — que se agrava relacionando entre si, escola, família, sociedade”, afirma.

Nos grupos extremistas, encontram acolhimento e senso de pertencimento, acrescido de um ambiente seguro para vazão a ideias violentas. “Um adolescente que se encontra em situação de sofrimento, com ódio, com raiva por N fatores que possam estar ocorrendo, ele se encontra num ambiente desses extremamente tóxicos, que fazem discurso contra mulheres, discurso racista, homofóbico, e ele encontra ali um acolhimento a sua dor, ressentimento, a sua ira, e ali ele se sente visto e valorizado.”

Prevenção e cuidado

Para Cleo, a solução não é simples nem será rápida, porque envolve muitos fatores e depende de uma ação intersetorial. “Essa solução passa por criação de políticas públicas que possam trazer programas tanto de prevenção quanto posvenção e esses programas incluem também protocolos.”

Há, no entanto, mais perguntas do que respostas. “O que seriam esses protocolos? Por exemplo, o adolescente mais recente fez divulgação nas redes sociais, conversou com amigos, divulgou de todas as formas o que ele ia fazer. O que as pessoas fazem com uma informação dessa? E se a pessoa recebe uma denúncia sobre algo do tipo, o que deve fazer? Para onde isso vai ser encaminhado? Será dado um tratamento rápido ou será que vai entrar numa fila? Quais são os protocolos para acolher essas pessoas que foram atingidas por um ataque desses?”, questiona Garcia.

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É importante também haver cuidado com as vítimas, não apenas as diretas. A comunidade escolar e a sociedade em geral também são vítimas do trauma, que pode perdurar por anos.

O agressor, que na maior parte das vezes é menor de idade, também deve ser alvo de política pública. “O adolescente que faz esse tipo de ataque precisa de um acompanhamento. Como que vai se dar a saída dele de uma internação numa Fundação CASA [instituição que atende jovens autores de atos infracionais em São Paulo], por exemplo? Ele vai cumprir um período de pelo menos uns 3 anos, mas depois disso ele retorna à sociedade. Como é esse retorno desse adolescente?”

A pesquisadora também destaca a importância de responsabilizar as redes sociais. “Você encontra de tudo nessas redes sociais atualmente, que não têm uma regulação e também não se responsabilizam pelo conteúdo. Isso já está sendo debatido, mas ainda não tem nada a curto ou médio prazo”, diz.

Edição: Thalita Pires

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