Em mais uma audiência pública para se aprofundar nas 215 emendas enviadas pelo Poder Executivo à proposta do Plano Diretor da Cidade (Projeto de Lei Complementar nº 44/2021), a Comissão Especial do Plano Diretor se reuniu com representantes da Prefeitura e da sociedade civil para tratar das mudanças que impactam bairros da Zona Sul e a Grande Tijuca.
A Área de Planejamento 2 (AP2) é formada pelos bairros do Flamengo, Glória, Laranjeiras, Catete, Cosme Velho, Botafogo, Humaitá, Urca, Leme, Copacabana, Ipanema, Leblon, Lagoa, Jardim Botânico, Gávea, Vidigal, São Conrado, Rocinha, Alto da Boa Vista, Andaraí, Grajaú, Maracanã, Praça da Bandeira, Tijuca e Vila Isabel.
Para esta região, no geral o projeto não prevê grandes mudanças nos parâmetros urbanísticos, tendo em vista que já são regiões bem infraestruturadas. Em grande parte da Zona Sul serão mantidos os potenciais construtivos, com ligeiro aumento em alguns pontos, enquanto está prevista uma redução dos coeficientes na região de Vila Isabel, Andaraí e parte da Tijuca.
O assessor técnico do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM), Henrique Barandier, afirma que, de um modo geral, há um aumento de gabarito e intensidade do uso comercial na Zona Sul em relação ao texto original do projeto de lei. Já para a região no entorno da Tijuca, há uma redução de gabarito em vários trechos e também do número de subzonas, sem intensificação do uso não residencial, que tendem ser os usos de maior impacto.
Barandier explica, no entanto, que analisando outros parâmetros, como o gabarito permitido, o potencial construtivo de algumas dessas regiões pode se elevar. “O potencial construtivo se mantém, mas há mudança em outros parâmetros, como o gabarito. Em muitos casos isso vai representar uma possibilidade maior de realizar aquele adensamento que em tese seria possível pelo potencial construtivo”, complementa.
Entre os itens levantados, a secretária municipal de Ambiente e Clima, Tainá de Paula, louvou o fato de haver a revisão de diversos parâmetros urbanísticos, principalmente nas zonas Norte e Sul da cidade, mas teme que alguns pontos não possam deixar dúvidas. “Tem que ficar mais claro que a cobertura a mais, que a flexibilização ou não da construção da divisa, que a fachada ativa e que o uso comercial do térreo serão cobrados pela Prefeitura e entrarão no cálculo da outorga. A gente vai abrir mão destes recursos?”, indagou.
Moradores temem que qualquer incentivo a mais empreendimentos nesta área traga problemas para quem já vive no local, como os impactos na mobilidade urbana. O diretor da Federação das Associações de Moradores do Município do Rio de Janeiro (FAM-Rio), Mauro Salinas, demonstra preocupação com o aumento de parâmetros em diversos bairros da Zona Sul.
“Eu verifiquei 14 alterações com aumento de parâmetros em São Conrado, Leblon, Ipanema, Copacabana, Laranjeiras, Flamengo, Catete e Glória. Em São Conrado continua o absurdo de 18 andares em uma região de cenário paisagístico”, aponta.
Já o vereador Pedro Duarte (Novo) apontou alguns contrassensos entre o desejo de mais aproximar os trabalhadores de seus locais de trabalho e a rejeição a novas construções nessas localidades e levantou a possibilidade da favelização, uma vez que muitos, se não conseguirem ter ou construir suas moradias nas áreas centrais ou em locais mais distantes, irão ocupar, de alguma forma, as áreas mais próximas aos seus empregos. Para o parlamentar, é o Poder Público que deve atuar para aqueles que não têm condição de comprar suas unidades habitacionais, já que, dificilmente, o mercado imobiliário irá resolver a situação desta população.
“Este ano, o orçamento para a produção de habitações de interesse social era de R$ 46 milhões, ou seja, 0,2 ponto percentual do orçamento da cidade do Rio. Porém, o prefeito já remanejou R$ 33 milhões. A culpa então é do mercado imobiliário ou do Poder Público?”, questionou.
Uso não residencial em Botafogo
No bairro de Botafogo, uma das emendas altera a legislação atual que hoje permite um gabarito máximo de três pavimentos para edificações não residenciais de uso exclusivo, além do controle construtivo que é dado pelo zoneamento previsto. A ideia é a partir de agora adotar um novo critério, o Índice de Comércio e Serviços.
A coordenadora de Planejamento local da Secretaria Municipal de Planejamento Urbano (SMPU), Mariana Barroso, pontua que a adoção do índice é uma estratégia da Prefeitura que pretende utilizar critérios diferentes para o uso não residencial em edificações já existentes e nas novas construções que forem feitas.
“São utilizados dois critérios: a edificação existente até três pavimentos pode transformar o uso para o uso não residencial, mas se vai fazer uma construção nova de uso misto, tem que obedecer ao Índice de Comércio e Serviços que dá um resultado menor da incidência do uso comercial”, esclarece a gestora.
Região da Grande Tijuca
Foram destacadas ainda algumas especificidades das alterações causadas pelas emendas em bairros no entorno da Tijuca. Uma delas é com relação ao local onde funciona o Polo Gastronômico da Tijuca. Para o presidente da comissão, o vereador Rafael Aloisio Freitas (Cidadania), o ideal seria a implantação de uma zona de uso misto na região, mesclando as residências e o comércio. “No zoneamento atual, a principal rua deste polo é estritamente residencial, e, talvez, 70% dos estabelecimentos comerciais estejam ali. Então mudou e a gente precisa acompanhar esta dinâmica da cidade. O polo já está consolidado há vários anos e foi o primeiro da cidade do Rio de Janeiro. Depois dele vieram os outros”, explicou o parlamentar.
Outra questão levantada na audiência foi com relação à Praça da Bandeira, onde o licenciamento de construções e parcelamento nesta zona necessitará de um projeto de ocupação especial, com análise prévia da SMPU e de órgãos de tutela.
Preocupado com questões relacionadas à acessibilidade na região, Mauro Sérgio Rangel Martins, presidente da Associação de Moradores e Amigos da Praça da Bandeira, destacou a necessidade da renovação da passarela que atualmente dá acesso ao maior posto de perícia médica do INSS em atividade no Brasil. “É inadmissível que qualquer coisa seja feita para edificação ou urbanização no local sem a substituição da passarela que pega da Rua do Matoso até a sede do INSS”, pontua.
Em relação às construções irregulares no Alto da Boa Vista, o vereador Dr. Rogério Amorim (PTB) afirma que é preciso estar atento ao que já vem acontecendo no local, apesar das restrições urbanísticas. “Ali temos a maior floresta urbana do mundo todo, e por óbvio restrição de construções ali, mas o que vemos na realidade é a expansão imensa da grilagem e das comunidades e toda a preocupação com a proteção ambiental com ruído sonoro, com excesso de movimentação que afugenta os animais, está se perdendo”, revela o parlamentar.
A audiência pública contou ainda com a presença dos vereadores Alexandre Beça (PSD), Átila A. Nunes (PSD), Thais Ferreira (PSOL), Vitor Hugo (MDB) e Edson Santos (PT), além de representantes do Poder Público Municipal, como a Secretaria Municipal de Planejamento urbano, da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação, e de entidades da sociedade civil como a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, o Instituto dos Arquitetos do Brasil e do associações de moradores