Em comunicado com o título ‘Decisão com base em dados, não em datas’ a Selic foi mantida em 13,75%, em razão da permanência da desancoragem da inflação, do desvio em relação à meta da projeção no cenário de referência e da necessidade de consolidação do processo de desinflação. O Copom adotou um tom hawkish (elevação de juros e contração monetária) ao sinalizar que segue vigilante, com a estratégia de manutenção da taxa Selic, buscando assegurar a convergência da inflação.
Uma diminuição pode ocorrer na descrição do balanço de riscos e na possível supressão da menção referente à possibilidade de voltar a elevar os juros. Essa exclusão, decorreria do fato que as expectativas de inflação entre os anos de 2024 e 2026 se estabilizaram nas últimas semanas, da eliminação do “risco de cauda” de uma trajetória explosiva da relação dívida/PIB devido ao novo arcabouço fiscal e da melhora, ainda que lenta, dos indicadores recentes de inflação.
A projeção de inflação para 2024 no cenário de referência não apresentou variação relevante com relação aos 3,6% último comunicado. Vale destacar, a deterioração adicional das expectativas de inflação, ainda que em menor magnitude do que no período anterior.
Qual foi o recado da ata do BC?
Na ata do BC, o Copom reconhece a continuidade do processo de desinflação e uma abertura positiva das últimas divulgações, mas ressalta a permanência em patamar acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta de inflação e a necessidade de se observar os próximos números, para confirmar se o processo de desinflação seguirá em velocidade adequada.
A sinalização continua sendo de estabilidade da Selic, mas tem ênfase no alerta sobre a desancoragem das expectativas. Nesse sentido, o tom geral do Comitê permaneceu duro, mesmo admitindo algumas indicações positivas, tendo como objetivo o firme propósito de promover a ancoragem das expectativas.
O ciclo de queda da Selic começará quando?
Na minha percepção, o ciclo de relaxamento monetário deve se iniciar apenas em agosto, com a Selic atingindo os 11,50% no fim de 2023 e 9,5% no encerramento do ciclo.
Ao longo dos próximos meses, é importante acompanhar a tramitação no Congresso do projeto do arcabouço fiscal e quais medidas serão tomadas para se chegar a um resultado primário equilibrado em 2024, o que poderia contribuir não só para uma queda adicional dos prêmios de risco, como também para um melhor comportamento das expectativas de inflação. A propósito, a definição das metas de inflação pelo CMN é fundamental para que haja um processo de ancoragem das expectativas, o que abriria espaço para o início do processo de queda da Selic. Cabe ressaltar que a Área de Estratégia da Warren Rena já tinha, no começo do ano, uma visão mais otimista com relação à trajetória da taxa de câmbio. Consideramos que há espaço adicional para a valorização do BRL, o que contribuiria para um movimento mais rápido e intenso de desinflação e para o recuo das expectativas de inflação.
O arcabouço impactou a decisão do Copom?
Sem dúvidas. É quase unanimidade entre os economistas que analisaram o arcabouço que, a regra só se sustenta, se o governo ampliar a arrecadação de forma considerável e consistente. Na contramão, o mesmo governo promete não aumentar impostos, o que torna o cumprimento do arcabouço mais desafiador. No comunicado do Copom, houve um aceno reconhecendo a medida como positiva, mas sem relação direta com a condução da política monetária.
Temos que lembrar que, o próprio presidente do BC, Roberto Campos Neto, tem adotado um tom elogioso para a proposta fiscal apresentada pelo governo, mas isso, por si só, não é suficiente para que os juros comecem a cair em um curto prazo.
É o momento de baixar os juros da taxa Selic?
Se faz necessário um debate técnico a respeito do assunto. As falas agressivas entre Lula e Campos Neto dificultam um otimismo nesse sentido.
O mais importante nesse debate do juros é o custo efetivo do crédito para pessoa física financiar o seu consumo e para a pessoa jurídica financiar ou seu capital de giro ou os seus investimentos em expansão, modernização e novas instalações.
Desde o início do governo atual, esse debate tem ficado à margem de todo esse debate político sobre a Selic. É claro que a Selic tem sim uma grande importância, principalmente, no financiamento da dívida pública e no custo das despesas financeiras do governo.
Porém, o mais importante para o crescimento do setor privado da economia é o custo real do crédito. É sobre esse aspecto que deveria gerar o debate. Por que, com a Selic a 13,75% ao ano, tem taxas muito mais altas de crédito efetivo para as empresas e para o consumidor?
Em resumo, isso só vai conseguir ser reduzido com o aumento da competição, a diversificação do sistema financeiro – hoje, poucas instituições controlam praticamente todos os ativos financeiros do País – e com a redução da cunha fiscal do setor.
Quais setores mais prejudicados com a manutenção da taxa de juros e quais mais beneficiados?
Beneficiados
– Bancos
Uma vez que os juros baixos propiciaram maior oferta de crédito e mais competitividade para o setor, os bancos podem se beneficiar de um ciclo de alta da Selic
Isso acontece porque o movimento esperado diante de juros maiores é o contrário: crescerá também o nível de risco na concessão de empréstimos e financiamentos, o que impacta diretamente em um prêmio maior para remunerar as instituições credoras.
– Exportadores
A alta dos juros causa uma atividade econômica menos aquecida, com empresas investindo e produzindo menos, e famílias diminuindo o consumo. Neste cenário, empresas ligadas ao setor exportador tendem a se mostrar mais resilientes do que aquelas companhias mais dependentes do mercado doméstico. Ou seja, empresas de proteína animal, papel e celulose, commodities como o petróleo e o minério de ferro podem seguir avançando.
Prejudicados
– Imobiliário
As empresas do setor imobiliário tendem a ser impactadas, pois os financiamentos imobiliários consistem em linhas de crédito que são ajustadas mais rapidamente diante de aumentos na Selic. Dessa forma, a alta pode reduzir o apetite para a tomada de novos financiamentos, assim como aumentar o grau de inadimplência entre aqueles que já têm contratos.
Nada que se compare com os números do passado, é verdade, mas é um ponto de atenção. O mercado imobiliário vem de um ano histórico muito forte, com as taxas de juros em patamares historicamente baixos. Mas, à medida que os juros vão subindo, o preço vai aumentando pro consumidor, que pode acabar comprando menos.
– Varejo
As varejistas também sofrem com juros mais elevados, pois estes se tornam um incentivo para a realocação de renda das famílias, que optam por reduzir o consumo para aumentar a segurança financeira.
Além disso, juros mais altos impactam no aumento das despesas dos consumidores com crédito e, portanto, aumentam o endividamento e reduzem a renda disponível para realizar outros gastos.
Dessa forma, a alta na Selic pode prejudicar o volume de vendas e as receitas de companhias do varejo, como redes de supermercados, vestuário, calçados e bens de consumo duráveis.
O dólar fica mais atrativo?
Não concordo com as aplicações dolarizadas na carteira do investidor local. Afinal, o que o cenário tem nos mostrado é uma tendência de queda da moeda americana em relação ao real.
Temos que lembrar que o dólar fez o seu pico em setembro do ano passado e desde então já caiu cerca de 10%, dada a atividade mais fraca por causa dos juros mais altos para controlar a inflação, acredito que as oportunidades de crescimento estão fora dos Estados Unidos porque nos últimos anos a economia performou muito bem, mérito deles, mas neste ano deve ficar em 1%, com o resto do mundo crescendo mais.
Estimo que o processo de enfraquecimento da moeda americana dure de dois a três anos, embora não seja um “movimento em linha reta”. Nesse ciclo de revisão do jogo de forças econômicas, o real tende a acompanhar uma cesta de moedas globais.
Quais setores da bolsa devem se beneficiar?
Há dois setores que se beneficiam da alta dos juros e podem se tornar opções interessantes para o investidor de ações que quer driblar o aperto monetário: os bancos e as seguradoras.
Em relação aos bancos, quanto maior o juro, mais as instituições ganham nos empréstimos que concedem a seus clientes.
Mas há um ponto de alerta para os investidores. O dinheiro que os bancos emprestam não surge do nada. Em geral, trata-se de um recurso que a instituição financeira tomou emprestado de outra instituição financeira, a juros menores, para poder emprestar a juros maiores ao cliente.
Para as seguradoras, o cenário é mais ‘tranquilo’. As companhias desse setor ganham com os juros altos na hora que vão fazer a gestão do dinheiro que arrecadam todos os meses com os clientes que contratam seus seguros.Como o grande custo das seguradoras só ocorre quando o cliente aciona o seguro, no chamado “sinistro”, as empresas aproveitam o dinheiro do prêmio para fazê-lo render enquanto está parado.
A seguradora, então, aplica o recurso em títulos de renda fixa e, portanto, gera mais dinheiro quando a Selic está em alta.