Quando a imprensa é acusada de dar pouca atenção para conflitos e tragédias na África, infelizmente, é porque lá isso ainda é comum. Acontece o mesmo quando a tragédia é muito distante, como no início da Guerra no Vietnã, em que até Estados Unidos e União Soviética se envolverem, ninguém conhecia. Um lugar tão longe que a Cochinchina, que fica por lá, entrou para a cultura popular brasileira como sinônimo de lugar “no meio do nada”.
Entretanto, o caso da Ucrânia é diferente porque, apesar de pobre, a coisa está se desenrolando na Europa. Somada à questão geográfica, de um lado está um dos maiores exportadores de grãos contra um dos maiores produtores de petróleo, o que interfere na economia global, sem falar que além de uma potência nuclear, no teatro da política internacional, geralmente a Rússia encarna o papel de vilã.
Porém, o conflito vai caminhando para dois anos, sem esperança de uma solução. Primeiro, foram para a batalha os soldados da ativa, depois os reservistas mais jovens, os mais velhos e agora até as mulheres estão pegando em armas.
De acordo com o Ministério da Saúde de Kiev, capital ucraniana, o número de pessoas que tiveram membros amputados no país está aumentando rapidamente em 2023. Somente no primeiro semestre, foram registrados 15 mil novos casos. É aí que a raiva precisa entrar em acordo com o bom senso: como será o futuro do país com parte da população em idade economicamente ativa sem condição de trabalhar? Haverá como dar pensões para tantos aposentados por invalidez? Aliás, haverá um país ao fim do conflito?
Eles têm o direito de seguir o seu caminho, mas a que preço? O fato é que os dias passam e como notícia de ontem não é manchete de amanhã, o mundo vem se cansando dos problemas da Ucrânia. Além daqueles criados por ela. O caso mais recente ocorreu no último dia 20, quando o presidente da Polônia, Andrzej Duda comparou o vizinho a um “homem que está se afogando” e que “pode simplesmente afogar o salvador”. Pois é, solidariedade é fundamental, mas cada um tem as suas responsabilidades e o polonês anunciou que não vai mais fornecer armas para Zelensky. E esse não é um caso isolado, mas provavelmente uma consequência dos debates entre os membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), como os Estados Unidos, sobre custo excessivo da guerra.
Trata-se de uma conclusão lógica: depois de tanto dinheiro dado para comprar armas, até quando essa guerra vai continuar?
O encontro entre Lula e Zelensky
Como a política muda todo dia, e o custo do conflito não tem fim, os ucranianos têm olhado com mais atenção para parceiros que até então esnobaram. Sendo assim, o encontro bilateral realizado na semana passada foi primeiro entre os dois países, tendo um papel simbólico. Para o Brasil, foi uma demonstração de imparcialidade, já que o Lula tem sido acusado de apoiar a Rússia no conflito.
Do ponto de vista da Ucrânia, eles não têm muito a oferecer além de promessas de parcerias para o futuro, que obviamente seriam facilitadas com um apoio efetivo na guerra. Coisa que claramente não deve acontecer porque o Brasil quer consolidar a imagem de “amigo de todos”. De prático mesmo, o encontro com Lula foi uma demonstração de que eles não estão sozinhos.
No meio disso tudo, os mais atentos repararam na expressão séria de Lula na foto oficial. Talvez o tamanho do sorriso de Lula seja uma síntese do pouco espaço de manobra que ele tem, sustentando relações com os Estados Unidos, maior economia do mundo, a China, maior parceiro econômico brasileiro, a Rússia, fundamental para o nosso agronegócio e, agora, a Ucrânia. O que Zelensky levou de concreto do encontro foi o conselho para aproveitar as oportunidades para um encerramento honroso do conflito, além da certeza de que o Brasil vai ajudar nas negociações de paz. Enfim, na vida, na paz ou na guerra, cada um dá o que pode, que seja um aperto de mão e uma foto.