Um grupo de colonos e soldados israelenses cometeu uma série de agressões brutais contra três palestinos na Cisjordânia ocupada, confirmaram os jornais Haaretz e Times of Israel. As vítimas foram submetidas a horas de tortura no dia 12 de outubro.
Os agressores espancaram, despiram, algemaram e fotografaram as vítimas. Além disso, urinaram em duas das vítimas e apagaram cigarros em seus corpos. Um agressor tentou sodomizar uma das vítimas.
O exército israelense alegou dar início a um inquérito interno sobre o incidente. Um comandante envolvido foi destituído do cargo.
O abuso ocorreu na aldeia palestina de Wadi al-Seeq, situada a leste de Ramallah, que vive uma violenta escalada nos ataques coloniais contra pastores nativos, levando à expulsão da maioria da população nas últimas semanas.
Segundo o Haaretz, na manhã de 12 de outubro, alguns residentes palestinos, junto de um grupo de ativistas israelenses e dois ativistas de Ramallah, se preparavam para sair da área quando uma caminhonete com 20 a 25 colonos em uniforme militar os abordou.
Muhammad Mattar (46) virou rapidamente seu veículo em busca de uma rota alternativa e contactou o escritório da Autoridade Palestina incumbido de dialogar com a ocupação, com intuito de reportar o ataque.
Mattar e Muhammad Khaled (27) tiveram o caminho obstruído e foram removidos à força de seus assentos. Os colonos procederam ao pressionar suas cabeças contra a terra, chutá-los e atar suas mãos.
Os ativistas palestinos reconheceram alguns dos agressores como colonos radicados nos postos avançados coloniais próximos à aldeia — ilegais segundo o direito internacional e mesmo sob a lei israelense.
Mattar observou que os colonos, ao revistar sua mochila, plantaram facas para justificar o ataque. Mattar insistiu que não haveria lógica contactar as autoridades caso estivesse em posse de itens que certamente levariam a sua prisão.
Os colonos uniformizados então deram voz de prisão às vítimas, ao alegarem que agentes do Shin Bet — serviço de inteligência doméstica do Estado de Israel — estariam a caminho para interrogá-los.
Segundo Khaled, uma caminhonete ostentando uma Estrela de Davi trouxe seis a oito soldados supostamente ligados ao Shin Bet.
Mattar e Khaled foram levados a uma estrutura abandonada e vendados. Um soldado rasgou suas roupas com uma faca, deixando-os somente de cuecas, e ordenou que se prostrassem para torturá-los.
Os agressores espancaram ambos com um cano de ferro, com golpes em todo o corpo e na cabeça; queimaram Khaled com cigarros e tentaram extrair suas unhas.
Mattar observou que os soldados insistiam em incriminá-lo com a posse das facas. A tortura seguiu com tentativas de afogamento e mesmo com os soldados urinando sobre ambos. Um agressor tentou investir sexualmente contra as vítimas, mas parou ao encontrar resistência.
Após seis horas de abuso, ambos foram removidos do local e jogados com violência sobre o chão. Um colono os fotografou e compartilhou a imagem em um grupo ultranacionalista do Facebook, com a ameaça: “Um alerta à infiltração de terroristas na fazenda Ben Fazi, perto de Kochav HaShahar. Nossas tropas pegaram os terroristas”.
A postagem foi apagada mais tarde, após ativistas e jornalistas árabes denunciarem o episódio. Na imagem, outra vítima, desconhecida a Mattar e Khaled, então vendados, também estava presente.
A terceira pessoa, residente de Wadi al-Seeq, preferiu identificar-se apenas como Majed, reportou ao Haaretz ter sido sequestrado em sua própria casa pelos colonos. A agressão tomou também residências vizinhas, forçando as famílias a fugir do local.
Majed sofreu espancamento nas mãos antes e teve seus pertences roubados.
Apesar das alegações de portarem facas, nem Mattar nem as outras duas vítimas foram presas ou interrogadas em caráter oficial.
Ao contrário, a Administração Civil de Israel, na tentativa de encobrir o escândalo, pediu uma ambulância para transferi-los a um hospital. Mattar ficou internado por uma noite; Khaled e Majed passaram duas noites em observação. Neste entremeio, seus celulares, veículos e cartões foram confiscados pelas forças da ocupação.
Cinco ativistas israelenses detidos na área de Qadi al-Seeq, testemunhas do sequestro dos palestinos, foram eventualmente liberados. Os colonos lhes insistiram que tiveram “sorte” em não serem também agredidos.
Uma semana após o trauma, Mattar relatou ao Haaretz que os agressores queriam emitir duas mensagens: “A primeira, que os colonos perderam a cabeça com o que aconteceu na cerca de Gaza; a segunda, que nós, árabes, não devemos ousar mexer com eles”.
“Eu disse a eles que me opunha ao Hamas e à Jihad Islâmica, mas eles não ligaram. Disseram que todos os árabes são lixo e que devemos ser enviados para a Jordânia. Você já ouviu falar da prisão de Abu Ghraib no Iraque? É exatamente igual àquilo”.
O exército israelense divulgou uma nota fria sobre o caso: “Tropas capturaram os suspeitos com uma faca e um machado, após revistá-los. A forma com que a prisão foi conduzida e o uso da força em campo contradiz o que se espera dos soldados e comandantes do exército israelense. O incidente está sob investigação do alto comando, mas discrepâncias surgiram dos relatos”.
“Devido à gravidade das suspeitas, foi aberto um Inquérito Policial Militar”, acrescentou.
Não há expectativa de qualquer sanção aos agressores, ao contrário da violência política imposta aos palestinos, incluindo crianças condenadas a anos de prisão por atirar pedras contra os tanques de guerra da ocupação.
A Cisjordânia vive uma escalada de agressões coloniais a meses, incluindo pogroms contra aldeias palestinas. A crise se intensificou ainda mais após 7 de outubro, após Israel retaliar com brutalidade a uma ação de resistência do grupo Hamas, que cruzou a fronteira entre Gaza e o território designado Israel — isto é, ocupado mediante limpeza étnica, durante a Nakba ou “catástrofe”, em 1948.
A operação de resistência decorreu de meses de violações em Jerusalém e na Cisjordânia ocupada, além de 17 anos de cerco militar contra a Faixa de Gaza.