Indígenas ameaçam de morte funcionários de empresa na restinga de Maricá

Andre Silva
Foto - Aldeia Mata Verde Bonita (Tekoa Ka' Aguy Ovy Porã) - Evelen Gouvêa

Um clima de apreensão pairou sobre a Restinga de Maricá (RJ), na manhã do dia 26 de março de 2024, quando um grupo de indígenas da Aldeia Mata Verde Bonita (Tekoa Ka’ Aguy Ovy Porã) protagonizou um episódio de conflito com funcionários da empresa IDB-BRASIL. De acordo com relatos exclusivos obtidos pelo Diário Carioca, os indígenas teriam feito ameaças de morte aos trabalhadores por volta das 11h, gerando momentos de grande tensão.

Segundo depoimentos das vítimas, os indígenas estavam armados com arco e flechas, facões, lanças e roçadeira a gasolina. Um deles também parecia estar portando uma arma de fogo, criando um ambiente de grande temor entre os trabalhadores.

Foto – Aldeia Mata Verde Bonita (Tekoa Ka’ Aguy Ovy Porã) – Evelen Gouvêa

O incidente teve início com a chegada de dois indígenas em um veículo vermelho, posteriormente identificados como Tupã Darci e a Cacique Jurema. Testemunhas afirmaram que a Cacique Jurema saiu do carro gritando e proibindo os trabalhadores de tirarem fotos, enquanto os indígenas os ameaçavam.

As ameaças incluíam expressões de violência explícita, como a intenção de cortar os braços de um dos trabalhadores e colocar fogo na restinga durante a noite. Os trabalhadores relataram que os indígenas afirmavam que não adiantava chamar as autoridades locais, pois seu “negócio” era com a polícia federal.

Confira alguns trechos do boletim de ocorrência feito pelas vítmas:

Vamos picotar vocês. Aquele negão, vamos cortar os braços dele porque tirou foto da gente. Vamos voltar de noite e colocar fogo em tudo”.

Seu negão safado, não pode tirar fotos. Vou te picotar, vou te cortar todo, sei onde você mora, vou na direção da sua família, à noite vamos voltar para queimar tudo”.

Além das ameaças diretas, os indígenas também proibiram rondas na área da lagoa, ameaçando queimar os veículos que desobedecessem. “Pode avisar que não é para fazer ronda lá na lagoa que vamos queimar o carro”.

Diante da gravidade da situação, algumas das vítimas se trancaram em um dos contêineres da obra e conseguiram contatar a polícia, que chegou ao local em cerca de 20 minutos, forçando os indígenas a se retirarem.

O Diário Carioca buscou posicionamentos das partes envolvidas, porém o Tupã Darci e Cacique Jurema não foram localizadas para comentar sobre o ocorrido. Já a empresa responsável pelas obras, Maraey, disse que “por se tratar de uma questão policial, não iriam comentar sobre o caso”.

Por não retornar as ligações e nem os e-mails, a FUNAI não pôde ser contatada para comentar sobre o caso.

O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) declarou “não ter recebido uma comunicação oficial quanto aos fatos narrados e esclareceu que não possui tutela sobre os povos indígenas, cuja autodeterminação é princípio constitucional e de direito internacional. Também ressaltaram que o dever de segurança do Estado precisa ser exercido, no caso, pelas instâncias policiais competentes, sempre em preservação à incolumidade de todos os envolvidos”.

Por fim, a prefeitura de Maricá também optou por não se pronunciar sobre o incidente.

Histórico de protestos

Em abril de 2023, a mesma comunidade indígena se mobilizou em um protesto contra as obras do resort de luxo na área de restinga de São José do Imbassaí, em Maricá, no Rio de Janeiro. O projeto Maraey prevê a construção em uma área de 840 mil metros quadrados de vegetação nativa, rica em biodiversidade e considerada um ecossistema frágil e ameaçado.

Os indígenas argumentam que a construção do resort trará diversos impactos negativos para a comunidade e para o meio ambiente. Entre as principais preocupações estão a restrição do acesso a áreas tradicionais de uso indígena, a degradação ambiental da restinga e os impactos socioculturais sobre a vida da aldeia.

A empresa responsável pelo projeto, por outro lado, defende a sustentabilidade do empreendimento e os benefícios econômicos que ele trará para a região. Afirma ainda que possui todas as licenças ambientais necessárias, dadas pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea), e que o projeto foi elaborado em consonância com as normas e legislações vigentes.

De acordo com a prefeitura de Maricá, a aldeia foi instalada em 2013 em uma área privada e busca um espaço que atenda às necessidades para um assentamento adequado.

Mas segundo o MPI, “a Constituição não autoriza a remoção de indígenas, salvo em restritíssimas hipóteses (catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País), dentre as quais, não se inclui conflitos envolvendo povos indígenas”.

Em 2023, o advogado que atua na defesa da comunidade ressaltou que, devido ao tempo de ocupação no local, é possível pleitear o usufruto da área.

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