A representante da secretaria municipal de Fazenda, Sandra Nunes, afirmou que o Ninho do Urubu estava interditado pela Prefeitura do Rio no dia do incêndio que causou a morte de dez atletas do Clube de Regatas do Flamengo, em 2019. A declaração foi feita nesta sexta-feira (14/02), durante reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), que investiga os recorrentes incêndios no Estado.
De acordo com Nunes, a interdição do Centro de Treinamento (CT) aconteceu em outubro de 2017, mas que tem caráter administrativo e, por isso, cabia ao clube acolhê-la. “O Flamengo recebeu o auto de infração e foi afixado um papel com o aviso da interdição no local”, disse. “Como isso não acorreu, o clube recebeu 31 autos de infração até fevereiro de 2019”, completou.
O ex-vice presidente de Patrimônio do Flamengo, Alexandre Wrobel, declarou que não sabia que o CT funcionava sem alvará. “Sei de todos os detalhes das construções dos prédios, mas não sabia de forma nenhuma dos contêineres. Não fazia ideia de como eles dormiam e quantos dormiam. Não era minha competência, meu trabalho era estratégico”, informou. “Chamou a minha atenção que todos os membros da gestão passada alegam que não têm conhecimento da interdição”, questionou o vice-presidente Jurídico do Flamengo, Rodrigo Dunshee.
O presidente da CPI, deputado Alexandre Knoploch (PSL), solicitou à secretaria o histórico de notificações que o Ninho do Urubu recebeu. “Quero saber quem assinou esses autos de infração e por que não tomou nenhuma atitude para resolver a questão do alvará de funcionamento”, disse o parlamentar. Ele ainda destacou que, no dia da inauguração do CT, a prefeitura do Rio participou da cerimônia.
O deputado Rodrigo Amorim (PSL), vice-presidente da CPI, reiterou que o clube possuía a autorização para a construção do local, mas não para o funcionamento. “Precisamos saber quem é responsável pelo não-cumprimento da medida”, disse.
Contêineres
A perícia aponta o uso de portas de correr e de janelas gradeadas nos contêineres que serviam de alojamento para os jovens como um dos motivos que dificultaram a fuga durante a tragédia. O ex-CEO do Flamengo, Fred Luz, disse que os equipamentos já estavam no CT quando assumiu a função no clube. “A área técnica sempre informou que os módulos tinham garantia de qualidade para os meninos ficarem ali. Não tínhamos motivo para acreditar que aquele tipo de alojamento era inadequado”, informou. Luz disse ainda que a NHJ (empresa que fornecia os módulos) dava garantias de que os contêineres poderiam ser usados como dormitórios. “Não temos isso documentado, era apenas uma declaração informal”, contou.
Gerente da NHJ, Claudia Rodrigues disse que a empresa fornecia os módulos de acordo com as informações enviados pelo clube (como o número de camas e sanitários necessários) e destacou que a perícia realizada pela empresa constatou que a propagação do fogo no painel do contêiner não ultrapassava as camadas internas, o apelidado “recheio”. “Podemos, inclusive, reproduzir esse teste na presença dos parlamentares”, comentou. Ela ainda afirmou que a utilização de janelas gradeadas e das portas de correr nos dormitórios estava de acordo com as normas regulatórias.
O ex-CEO Fred Luz foi questionado sobre quem eram os responsáveis pelos acordos com a empresa, mas não soube responder. “Nós tínhamos uma cadeia de comando envolvendo o setor de Futebol e a área de Patrimônio. O pessoal de Futebol se reportava ao Carlos Noval, que se dirigia ao diretor de Futebol. Na área de Patrimônio, a mim se reportava o Paulo Dutra, que tinha sob sua administração quatro áreas: Financeira, Administrativa, Patrimônio e Recursos Humanos. Ele saiu do Flamengo em 2017 e foi substituído por Marcio Garotti”, citou.
Relator da CPI , o deputado Jorge Felippe Neto (PSD) pediu a cópia do contrato entre a NHJ e o Flamengo. “Já que o CEO à época não sabe quem era responsável por esses acordos, a CPI precisa ter acesso ao contrato”, afirmou. O vice-presidente Jurídico do clube, Rodrigo Dunshee, disse que irá encaminhar o documento à comissão.
Relação com a família
Na última audiência da CPI, familiares e seus advogados criticaram a falta de acolhimento por parte do clube. No encontro de hoje, Wedson Candido de Matos, pai de Pablo Henrique (uma das vítimas), reiterou que ficou sabendo da tragédia pela mídia e que o clube não prestou nenhum tipo de atendimento. “Nesse um ano não, tivemos quase nenhum contato com o Flamengo. Total desprezo”, comentou.
No entanto, após a reunião desta sexta, a advogada da família de Pablo Henrique, Mariju Maciel, afirmou que via uma melhora na relação com o Flamengo. “Acho que estava faltando um pouquinho de humildade e humanidade. A gente agradece à vinda de membros da diretoria e a solidariedade que prestaram, mas isso não inclui o presidente Rodolfo Landim, que entendeu que tinha compromissos mais importantes hoje”, comentou.
Landim não compareceu à audiência da CPI na semana passada e por isso acabou sendo convocado pelos parlamentares. Ele, no entanto, foi representado pelo vice-presidente Jurídico do Flamengo, Rodrigo Dunshee.
O presidente da CPI, Alexandre Knoploch (PSL), ainda sugeriu que fosse realizado um jogo no Maracanã em homenagem às vítimas, sendo doado aos familiares o dinheiro arrecadado com os ingressos. Ele também sugeriu a entrega de uma Medalha Tiradentes a todas as vítimas e afirmou que irá discutir a possibilidade, com a prefeitura do Rio, de nomear ruas com os nomes dos jovens.
Entre os familiares das vítimas, também compareceram Darlei Pisetta, pai do Bernardo; Cristiano Esmerio, pai do Christian; e Wanderlei Dias e Alba Valéria, pais de Jorge Eduardo