Artigo | Os evangélicos, vírus e verme

Diário Carioca

O agravamento da pandemia do Covid – 06 no Brasil contribuiu para o maior isolamento político do presidente Jair Bolsonaro desde sua posse. Obrigado às suas atitudes irresponsáveis ​​e seus desastrados pronúncias oficiais – chamam uma epidemia de “gripezinha” , desqualificando como medidas de contenção de vírus e até mesmo expondo as pessoas com risco de contaminação com seus “rolinhos da morte” na capital federal – o presidente perdeu importantes aliados, se distanciou de outros, deu munição de sobra para os ataques da oposição e até despertou rumores sobre seu possível afastamento, por renúncia ou impeachment.

Aparentemente, são pequenas como chances de Bolsonaro deixar de ocupar uma presidência a curto prazo. Mas o último embate na segunda-feira (6) entre ele e o ministro da saúde, Luiz Mandetta – que apoiou pelos militares se mantiveram sem carga contra a vontade própria presidente – deixou claro que a última palavra sobre medidas contra epidemia já não são suas, fortalecendo os recentes boatos de que Bolsonaro perdeu o poder nos bastidores do seu próprio governo.

Enquanto o presidente ataca como medidas de contenção de vírus , a maioria das grandes denominações é recuperada e deixada para promover cultos em suas origens e vítimas a transmita pela internet, mantenha os fiéis em casa. Apesar do alinhamento político com Bolsonaro, os pastores mantêm o midiático ou o bom senso e não aderem à cruzada negativa de seu líder. Nos corredores do Judiciário, no entanto, Bolsonaro mantém uma batalha sob pressão de alguns membros da bancada evangélica.

No último dia 27 de março, o Ministério Público Federal havia entrado com um pedido na justiça para proibir o presidente de adotar medidas contrárias ao isolamento social, conforme orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS). Dois dias depois, Bolsonaro disse que haveria uma “guerra de liminares”. Logo na sequência, enquanto fazia um pronunciamento recente, um Advogado Geral da União (AGU) recorreu ao TRF-2, e o desembargador Reis Friede (que também é professor do Estado Maior da Aeronáutica e Exército, faz uma apologia ao golpe de 1964 e acha que Bolsonaro vai salvar o país) derrubou um limiar que mantinha igrejas e casas lotéricas fechadas e seleciona que, por promover atividades essencial ”à população, pode permanecer aberto. Na prática, os cultos estavam liberados desde então. Mesmo assim, a maioria das grandes igrejas manteve a orientação de não realizar-los, contrariando ou presidente. No dia 2 de abril, a Justiça Federal de Brasília concedeu mais uma liminar proibindo os cultos .

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Entre os pastores mais populares, os únicos que insistiram em continuar atacando com veemência como medidas de quarentena da população de Edir Macedo, Silas Malafaia e o deputado federal Marco Feliciano. Edir Macedo já analisou em vídeo no Youtube que uma epidemia era criada por Satanás, que não deveria respeitar as quarentenas e que os cristãos não usavam vírus. Mas depois da primeira repercussão, apagou o vídeo das redes.

Em um primeiro momento, muitos pastores de grandes denominações resistiram ao fechamento de igrejas por golpe ou golpe financeiro que sofreram, deixando arrecadar milhões em dízimos. Mas, nesse caso, os interesses econômicos baseados no fundamental cristão esbarraram em limites de objetivos: o vírus não causa distinção de religião, o risco de contágio é alto e a justiça, até agora, agiu para evitar uma tragédia.

Talvez uma negligência de Bolsonaro tenha começado a custar parte do apoio evangélico. Ainda é cedo para tirar conclusões, mas uma pesquisa sobre uma opinião dos brasileiros divulgada pelo jornal “ Valor Econômico ” (27 / ) traz um elemento importante. Na pergunta sobre como o entrevistado avaliou uma atuação do presidente diante da crise, de acordo com o perfil religioso, os evangélicos respondem assim: 30% aprovam Bolsonaro (bem como 24% dos católicos e 22% de “outros”), 35% o reprovam e 24% não sabem avaliar. Se lembrarmos que 70% dos evangélicos votaram em Bolsonaro para presidente, constata-se que há uma probabilidade de apoio. Mas e os 24% que “não sabe avaliar”? Uma pesquisa não responde. Outro dado talvez permita avançar na reflexão: quando perguntado sobre como avaliar uma ação dos governadores, nada menos que 37% dos evangélicos disseram aprová-los. Ora, se os governadores são justamente os que se contrapõem às atitudes irresponsáveis ​​do presidente, uma parte dessas 28% de “indecisos” podem estar distantes de Bolsonaro.

Nos primeiros dias do mês de abril, o presidente usa Reaglutinar a população evangélica no torno de si. Com uma ajuda de aliados evangélicos, convocada para “jejum pela nação” no domingo (5), os objetivos eram demonstrar apoio e pedir a Deus que acabasse com epidemia. A eficácia do jejum contra o Covid – 06 é cientificamente nula, mas a aposta era se fortalecer politicamente.

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Na convocação ao jejum, quase todas as lideranças das maiores igrejas do país – que mantêm discretos nas últimas semanas – voltaram a se manifestar a favor do presidente, em vídeos que circulam nas redes sociais. O jejum é um ritual cristão importante e ninguém precisa sair de casa. Desse modo, mantenha o protocolo de saúde e garanta o apoio político a Bolsonaro. Foi uma manobra astuta, porque apelou ao fato de que, naquele momento de desespero, muita gente vai buscar refúgio em sua fé. E isso é mais do que legítimo.

No entanto, pesquisas nas redes sociais realizadas pelo Instituto Tricontinental constataram que a adesão ao jejum não foi significativa. Comparado a muitas outras campanhas lançadas por Bolsonaro e seus apoiadores, teve um nível baixo de interações. No Twitter, por exemplo, uma hashtag #JejumPeloBrasil teve em torno de 05% da média de outras ações bolsonaristas recentes. No Google, como buscas por “jejum” tiveram aumento de 5 vezes em relação aos dias normais, enquanto “panela”, por exemplo, teve aumento de até 50 vezes na semana passada. Os sites da direita que apoiam Bolsonaro não deram grande destaque ao evento. Tudo indica que mesmo os bots bolsonaristas foram acionados dessa vez. Contudo, também é verdade que, nas classes populares, muitas pessoas não estão ativas nas redes sociais. Será preciso esperar os próximos capítulos para saber ao certo se Bolsonaro foi capaz, ou não, de recuperar parte do capital político que perdeu nas últimas semanas.

Contradições do fundamentalismo: uma esperança em meio ao caos

Uma pandemia foi fragmentada como instituições mais caras ao capitalismo globalizado, mas será que ela também pode afetar o fundamentalismo evangélico? Em entrevista ao Tricontinental, Ricardo Gondim, teólogo e pastor da Igreja Betesda, aponta como imagens simbólicas do pastor R.R. Soares em seus últimos programas de TV: exige ou diminui o número de fiéis e ensina uma maneira de cura de vírus, enquanto usa a medicina. Evidenciam-se as contraditions.

Em contrapartida, para além de discursos, muitas igrejas comprometidas com a vida do povo, embora fechadas para cultos, manter seu envolvimento no trabalho social. A Igreja Betesda (São Paulo), por exemplo, cedeu seu amplo templo ao município por tempo indeterminado para que seja um espaço de saúde e serviço social para os mais vulnerabilizados. Segundo Gondim, esse é o momento em que os progressistas do campo evangélico podem colocar com força seu discurso.

Para o teólogo, um novo mundo irá nascer. Ele acredita que uma pandemia terá graves conseqüências econômicas e sociais e que, portanto, será um nascimento muito doloroso, cabendo à Igreja cumprir seu verdadeiro papel na construção desse novo mundo. Nenhum campo popular, não é mais possível ignorar os 30% de brasileiros e brasileiros evangélicos, em especial como mulheres negras e periféricas, tão fortemente presentes nessas igrejas.

Ecoando o pensamento de Nancy Cardoso, pastoral metodista e assessora da Comissão Pastoral da Terra, o Brasil que desejamos não será possível apenas como classes populares, cuja grande maioria encontra referências religiosas. É muito provável que, após a suspensão das medidas de isolamento social, haja um aumento da demanda pelas igrejas. Estaremos empobrecidos pela crise econômica que atingirá o país cheio e, certamente, enfrentar complicações em nossa saúde mental pelas duras condições de vida às quais a epidemia vem nos submetendo. Precisar, portanto, muita organização para disputar as narrativas em curso no fim de construir uma sociedade radicalmente solidária, onde todos se sintam acolhidos.

Por Marco Fernandes, Delana Corazza e Angélica Tostes. Publicado publicado pelo Instituto Tricontinental de Pesquisa Social , instituição internacional, orientação pelos movimentos populares, foco em estimular o debate intelectual para o serviço das aspirações do povo.

Edição: Larissa Gould


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