A indignação causada pelo assassinato de George Floyd, um homem negro de 46 anos que morreu ao ser asfixiado por um policial branco no dia 25 de maio em Minnesota, nos Estados Unidos, segue impulsionando protestos em diversos países pelo 9º dia consecutivo.
Com as mobilizações dessa terça-feira (2), a expectativa dos ativistas é que os protestos antirracistas que ganharam os holofotes da imprensa mundial nos últimos dias continuem em ascensão. Atos também estão programados para esta quarta-feira (3).
:: Não há revoltas como essas desde a morte de Martin Luther King, diz ativista dos EUA ::
Mesmo com o toque de recolher determinado em estados como Nova York, Ohio e Georgia, na tentativa de conter os protestos, ações diretas e saques a lojas e estabelecimentos de grandes marcas foram registrados na noite de segunda-feira (1º).
Manifestantes se deitam no chão, em Columbus (Ohio/Estados Unidos), para protestar contra o assassinato de George Floyd nesta terça / Seth Herald/AFP
A continuidade dos atos evidencia que, apesar das ameaças do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que segue desqualificando os ativistas e prometeu usar as Forças Armadas para controlá-los, a população estadunidense segue nas ruas contra a violência policial. As declarações do presidente, na verdade, apresentaram efeito reverso e inflaram os protestos.
Letitia James, procuradora-geral do estado de Nova York, afirmou em sua conta oficial do Twitter que tomará medidas legais para assegurar os direitos dos cidadãos americanos caso Trump de fato execute medidas autoritárias.
“O presidente dos Estados Unidos não é um ditador e não vai dominar o estado de Nova York. De fato, o presidente não tem o direito de enviar unilateralmente militares dos EUA aos estados”, escreveu. “Vamos resguardar o direito a protestos pacíficos e não vamos hesitar procurar a Justiça para proteger nossos direitos constitucionais durante esse período, assim como no futuro”, completou.
Mais de 700 pessoas foram presas após participarem dos protestos no início da semana.
Autoritarismo de Trump enfrenta resistência nos EUA / Reprodução/Twitter
Racismo estrutural
A ativista Njimie Dzurinko, do movimento negro e do Put People First, organização que atua em defesa do acesso à saúde para toda a população americana, participou de um ato na Philadelphia, maior cidade da Pennsylvania, e reforçou como a violência policial contra negros é estrutural nos Estados Unidos.
Ela relembrou casos de outras pessoas assassinadas por policiais recentemente como Breonna Taylor, Ahmaud Arbery, Tony McDade e Regis Korchinski-Paquet. Dzurinko citou ainda que, no estado da Pennsylvania, um homem negro chamado David Kassick foi baleado duas vezes nas costas enquanto estava rendido no chão, após ser parado por policiais porque seu carro estava com o adesivo de inspeção vencido.
Na avaliação de Dzurinko, os assassinatos são a expressão mais visível da violência do Estado contra os pobres, que também reprime a população vulnerável de diferentes maneiras.
“O mesmo Estado que assassina nossos irmãos a sangue frio está separando famílias na fronteira e no sistema de assistência social infantil. É o mesmo Estado que nos impõe sanções econômicas através de cortes na rede de assistência social e a às pessoas pobres ao redor do mundo por meio de sanções contra governos que não se curvam à vontade de nossa classe dominante”, afirmou.
:: Coronavírus: “Sistema de saúde privado está matando as pessoas nos EUA”, diz ativista ::
A crise socioeconômica que se aprofunda em meio à proliferação do novo coronavírus no país, que concentra o maior números de casos em nível global, faz com que a situação seja ainda mais crítica.
“O mesmo Estado que está matando nossos irmãos a sangue frio está dando dinheiro para o sistema privado que lucra com o cuidado à saúde, nos deixando com hospitais fechados e nos impondo taxas de mercado para acessar testes em meio à pandemia”, complementou Njimie.
Revolta internacional
Atos antirracistas também aconteceram no continente europeu, com maior destaque para França, onde quase 20 mil pessoas foram às ruas de Paris nesta terça-feira (2).
A manifestação foi organizada pelo comitê de apoio à família do jovem francês Adama Traoré, que morreu em abordagem policial há quatro anos, e exigiu justiça pra George Floyd. Segundo a família, assim como o morador de Minneapolis, Traoré morreu após ser asfixiado.
Atos em Paris foram duramente reprimidos / Betrand Guy/AFP
Os ativistas foram reprimidos pelas forças de segurança francesas, que utilizaram gás lacrimogêneo para dispersar os manifestantes, que, em resposta, atearam fogo em objetos e atacaram pedras.
O racismo institucional também foi denunciado em protestos em Berlim, na Alemanha, em Londres, na Inglaterra, em Amsterdã, na Holanda e em cidades da Espanha.
:: Morte de homem negro asfixiado por policiais nos EUA gera indignação internacional ::
Em Istambul, na Turquia, ao menos 29 pessoas foram detidas. Atos também foram registradas em Nairóbi, capital do Quênia, país do leste africano.
Já em Sydney, na Austrália, os ativistas relembraram o caso de David Dungay, cidadão aborígene que também foi vítima de sufocamento ao ser contido por cinco policiais na capital australiana em 2015. Na América Latina, a violência policial e estatal foi repudiada em protestos em Buenos Aires, capital da Argentina.
Luto
Pela primeira vez desde a morte de Floyd, Roxie Washington, mãe de Gianna, única filha de George, conversou com imprensa nesta terça (2).
Visivelmente abalada, a mulher lamentou a trágica perda da família. “No fim do dia, eles podem ir para casa e ver suas famílias. Gianna não tem mais pai. Ele nunca a verá crescer, se formar. Ele nunca a levará para o altar”, disse Roxie, acompanhada da garota de seis anos. “Se ela tiver um problema e precisar do pai, ela não terá mais isso. Eu estou aqui pela minha bebê e estou aqui pelo George. Quero que seja feita justiça por ele”, continuou a mãe.
Mãe de Gianna, filha de Floyd, se emociona ao falar com a imprensa e clama por justiça / Stephan Maturen/Getty Images/AFP
Chorando e muito emocionada, ela reforçou que George era um homem honroso e que não merecia ser tratado com tamanha brutalidade pelos policiais. “Eu quero justiça porque ele era bom. Não importa o que todos pensam, ele era bom”.
:: Veja vídeo com as declarações de Roxie ::
Após pressão popular na semana passada, Derek Chauvin, o policial que sufocou a vítima com o joelho e pressionou seu rosto contra o asfalto por mais de oito minutos foi detido e será julgado por homicídio culposo, quando não há intenção de matar. Os outros três policiais que participaram da ação ainda estão sob investigação.
Edição: Camila Maciel