Protesto contra racismo no Rio denuncia a própria realidade local, diz organizadora

Diário Carioca

“Vidas negras importam” e “parem de nos matar”. As frases são ecoadas há anos pelos movimentos de favelas e de mães que perderam os seus filhos por meio da violência do Estado. No Rio de Janeiro, no domingo (31), o grito ganhou as ruas da capital fluminense no meio do contexto de isolamento social causado pela pandemia do novo coronavírus, para dizer mais uma vez: basta! 

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No sábado (30), um dia antes do ato chamado de “Vidas negras importam”, mais um jovem, Matheus Oliveira, de 23 anos, foi baleado numa ação da polícia nos acessos ao Morro do Borel, na zona Norte do Rio. O mototaxista não resistiu ao ferimento e morreu. A investigação do caso está a cargo da Delegacia de Homicídio da capital e há indícios de que os policiais ameaçaram testemunhas e mentiram durante os depoimentos.

De acordo com Buba Aguiar, integrante do Coletivo Fala Akari, que compõe o Movimento Favelas na Luta, responsável pela manifestação, a motivação para ocupar as ruas veio do aumento das operações policiais e das mortes decorrentes das intervenções nas favelas do Rio de Janeiro. Segundo ela, o movimento global denunciando o racismo nos Estados Unidos não foi o que incentivou o ato.

“Temos um número de letalidade em decorrência de ação policial bem maior do que lá [Estados Unidos]. Mas o racismo estrutural, que muitas vezes explicita pelas forças policiais, é global. São pautas idênticas por conta da criminalização de corpos negros e pobres, mas não resolvemos puxar o ato do último domingo porque eles foram às ruas nos Estados Unidos, mas pela realidade daqui”, explicou.

O último levantamento do Instituto de Segurança Pública (ISP), apresentado no dia 26 de maio, mostra que a quarentena causada pela covid-19 não freou as mortes ocasionadas durante operações policiais. Segundo os dados, no mês de abril, ocorreram 177 óbitos em decorrência de intervenções de agentes públicos no estado do Rio, 43% a mais do que no mesmo mês no ano passado. 

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Entre os presentes no protesto estava a coordenadora e fundadora do Movimento Moleque, Mônica Cunha. Ela — que, após perder o filho executado por um policial, em 2006, passou também a ocupar as ruas por mudança da política de segurança — destacou o racismo presente nas abordagens dos agentes de segurança.

“É muito mais difícil uma mulher branca da zona Sul perder um filho, quando perde, na maioria das vezes, é por um acidente de carro. Eu não estou julgando que essa mulher tenha menos dor do que eu, pois a dor de perder um filho é desesperadora para qualquer um. O que eu estou gritando e pedindo é que parem de nos matar, que não fiquem nos assassinando, para que todos os dias a minha ferida se abra. Não quero que nenhuma mãe tenha a sua ferida aberta”, afirmou. 

Contexto global

O ato no Rio contra o genocídio da juventude negra ocorre no momento em que revoltas e protestos antirracistas têm ganhado as ruas do mundo. O caso do assassinato de George Floyd, um homem negro, por um policial branco que ficou ajoelhado em seu pescoço até que perdesse a consciência, na cidade de Mineápolis, no estado de Minnesota, nos Estados Unidos, trouxe à tona mais uma vez o racismo estrutural. 

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De acordo com a antropóloga e professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Flavia Medeiros, as manifestações ocasionadas após a morte de Floyd são uma eclosão de séculos de violência contra o povo negro e marcam um importante momento histórico no mundo.

“Essa canalização do ódio contra a brutalidade policial por conta da produção de morte, não é um evento novo, tanto no Estados Unidos, quanto no Brasil, as revoltas negras fazem parte da existência e resistência dessa população nesse paradigma moderno do estado colonial, capitalista e racista. Estamos vivendo um momento histórico muito importante, mas que é o processo de um acúmulo, de uma continuidade histórica, inclusive dessa geração de jovens que estão na rua”, avalia. 

Fonte: BdF Rio de Janeiro

Edição: Vivian Fernandes e Mariana Pitasse


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