Em 2019 tudo era lua de mel entre Brasil e EUA. Trump era o Presidente na Casa Branca e Bolsonaro acabara de assumir a cadeira presidencial no Palácio do Planalto.
Tudo ia muito bem com e para Trump, que indicava o Brasil como o segundo país aliado militar preferencial fora da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) na América do Sul.
Em teoria o reconhecimento facilitaria a compra de tecnologia militar e armas dos EUA. Uma porta aberta para acesso a parte da força bélica dos EUA.
O fato é que por muito tempo neste mandato, a diplomacia de Ernesto Araújo e Bolsonaro demonstrou-se completamente oposta ao universalismo histórico das relações internacionais brasileiras até então.
Foi inegável a influência de Olavo de Carvalho, de religiosos, e a busca por uma pauta cada vez mais ligada em boa parte ao conservadorismo trumpista e evangélico.
Nesta pauta, cabia tanto alinhamento com países conservadores árabes, aversão ao “globalismo” chefiado pela China, o fantasma do comunismo de sempre, quanto por fim ao bolivarianismo na América Latina.
Tivemos, ainda, ofensas à Brigitte Macron, a indicação de Eduardo Bolsonaro para a Embaixada nos EUA, discussões com Macron, problemas ambientais, campanha para Macri na Argentina, dentre outros feitos.
E assim sucessivamente, entre discursos carregados de ideologia olavista e comemorações pela indicação a OCDE, caminhavam as relações internacionais brasileiras.
Neste momento, no crepúsculo de seu mandato presidencial, Bolsonaro parece bem temerário nas relações exteriores. Pretende visitar Putin durante, talvez, a mais grave crise que se abate entre membros da OTAN e a Rússia. A lide: a conhecida disputa entre uma ex-república soviética, a Ucrânia e Putin – que não se sabe se anda muito racional ou se já está afetado pela síndrome do czarismo após vinte anos no poder.
O fato é que Bolsonaro tem tudo para desagradar a todos, pois Putin não lhe dará nenhuma dica de implantação derradeira de autocracia no Brasil, se é isto que Bolsonaro almeja – Putin pode ser tudo, menos tolo; um alinhamento de última hora não está no radar. O que Bolsonaro pode oferecer que a Venezuela não tenha dado a Putin? A Petrobrás para a Gazprom?
Do outro lado, os EUA não estão muito satisfeitos com o que estão vendo nesta visita.
O que pretende Bolsonaro ao se enfiar entre Putin, Macron, Biden, Alemanha, OTAN,China e Volodymyr Zelensky, Presidente da Ucrânia?
Zelensky, um político pragmático. Um completo outsider que satirizava políticos, que já foi roteirista, ator, comediante, e que é presidente da Ucrânia desde 2019.
O único ponto de contato nesta história é o fato de Bolsonaro parecer mais com Zelensky do que com Putin. Zelensky, um político eleito com o discurso de antissistema, sendo eleito também como uma aventura desaforada do eleitor ucraniano.
Lembremos que há pouco mais de um ano Zelensky estava envolvido com a eleição nos EUA e foi flagrado em gravação com Trump de forma muito servil. Na conversa, Trump pressionava Zelensky a investigar o filho de Joe Biden, pré-candidato à Presidência.
Algo bem maior que o “I love you” de Bolsonaro para Trump, mas com a mesma essência.
É neste ambiente explosivo que envolve gás, petróleo, China, EUA, Rússia, OTAN, que Bolsonaro poderá colocar o Brasil em breve