E os problemas reais do país com isso?

Fernando Ringel
Léo Lins - Foto: Divulgação

A vida é pura ironia, como prova o humorista Léo Lins, frequentemente citado pela extrema-direita como um exemplo de alvo de censura, e que teve cancelada a reserva para o seu show no teatro municipal de Pomerode, em Santa Catarina. O motivo foram as piadas que ele fez para divulgar o evento, consideradas ofensivas pela administração municipal. Um prato cheio para as perguntas de quem quer ver o circo pegar fogo nas redes sociais: em uma das regiões com votação mais expressivas para Jair Bolsonaro, Léo Lins foi censurado? E a liberdade de expressão? Qual é o problema em fazer piada? O mundo está chato? Nessa briga, quem vai ser chamado de comunista? Está aí um exemplo sobre como as palavras vão sendo tão distorcidas que acabam perdendo o sentido. 

Nessa mesma linha, a deputada Bia Kicis (PL) postou um vídeo com imagens da Ditadura Militar e comentários antigos de Lula. Em um dos depoimentos, da década de 1990, ele diz: “eu penso que se houvesse uma eleição e o Médici fosse candidato naquele tempo, ele ganharia”. A fala é complementada por outra, mais antiga, em que o petista complementa: “foi exatamente na época de maior repressão política que houve o maior crescimento econômico do Brasil”. Enfim, uma salada de alho com bugalho, misturada com o joio e o trigo que, até o momento, rendeu mais de 73 mil curtidas e 1700 comentários só no Instagram. 

Entretanto, a coisa não se restringe a um lado específico da política, como comprova o Congresso Nacional do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Realizado no último domingo, para a eleição da presidência da legenda, tudo seguia normalmente até militantes começaram a discutir e se agredir fisicamente. O motivo? A gota d’água para o desentendimento teria sido uma frase de Leon Trotsky, revolucionário russo morto em… 1940! 

Picuinhas do passado, problemas do presente

Enquanto a galera do “amor venceu” e a da “moral e bons costumes” xingam a mãe de desconhecidos por causa de política na internet, os problemas reais estão por aí, tão comuns que nem sempre viram notícia. E para isso, só mesmo quando a coisa descamba para o absurdo, como no caso ocorrido em junho, quando Jonair Alves da Silva, morador de Ceilândia, Distrito Federal, morreu após aguardar mais de 13 horas por uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Outro exemplo ocorreu em Recife, Pernambuco, onde o pobre dono de uma moto Honda Fan estacionou para tomar banho de mar e, ao voltar da praia, encontrou o veículo no chão, sem as duas rodas. Tudo feito em plena tarde de sábado, dia 30. De acordo com nota emitida pela Polícia Civil “as investigações seguem até o esclarecimento do fato”. 

E nisso tudo, várias CPIs vão sendo encerradas em Brasília, como se fossem temporadas de seriados. Serviram basicamente para criar notícias e memes, como demonstra a da Lojas Americanas, que mesmo com uma dívida de 20 bilhões que sacodiu a economia, acabou sem nenhum pedido de indiciamento, e a do MST, que não foi prorrogada e acabou sem ter ao menos o relatório final analisado. Enfim, esse país é complexo. Ainda bem que o brasileiro tem bom humor.

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Fernando Ringel é Jornalista e mestre em comunicação