A Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) é um feito extraordinário, fruto de um desejo da sociedade e da ousadia do seu criador: o educador, sonhador e antropólogo Darcy Ribeiro, designado pelo então governador Leonel de Moura Brizola para dar forma à UENF. Seus traços possuem as mesmas linhas arquitetônicas do Centro Integrado de Educação Pública, os Cieps, caprichosamente desenhados pelo arquiteto Oscar Niemeyer. É sempre desafiante tratar da história de uma instituição como a UENF que, na medida em que se desenvolve, ladrilha chão para trajetórias arrojadas de lutas sociais e de ambições do povo fluminense, de outros brasileiros e de estrangeiros.
É na esteira das efemérides institucionais que revisitamos o “Plano Orientador” da universidade, com o objetivo de trazer à baila a proposta original de criação da Escola Brasileira de Cinema e Televisão (EBCTV), aos moldes da Escuela Internacional de Cine Y TV de San Antonio de Los Baños (EICTV), em Cuba.
Já no preâmbulo do Plano Orientador da UENF, Darcy Ribeiro registra que nenhum de seus planos se cumpriu como fora pensado, atribuindo tal fato de que o futuro, felizmente, é sempre imprevisível e surpreendente. Que bom, meu velho Darcy! Apesar dos tropeços e desafios, a Universidade do Terceiro Milênio segue firme e forte, formando milhares de jovens do norte e noroeste fluminense, acolhe a juventude do Espírito Santo, de Minas Gerais e de todo o Brasil. A universidade conta com um sólido programa de iniciação científica, de extensão universitária e seus programas de pós-graduação seguem em plena expansão.
A jovem e vigorosa UENF completou 30 anos em agosto de 2023. Sua trajetória institucional é marcada, sobretudo, por uma história forjada na luta de setores organizados da sociedade campista, que a partir de uma ampla mobilização conseguiram a inclusão de uma emenda popular prevendo a criação da Universidade Estadual do Norte Fluminense na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, de 1989.
O antigo sonho da população de Campos dos Goytacazes pela construção de uma universidade pública começou a ser executado em dezembro de 1991. A Universidade do Terceiro Milênio, o último grande projeto de universidade de Darcy Ribeiro, nasceu com marcas fortes. Foi criada para dominar de forma sofisticada diferentes campos da ciência e foi a primeira universidade brasileira a exigir título de doutorado para todos os docentes. Sem paralelo na história recente, a UENF foi criada para formar cientistas com ênfase na pesquisa e pós-graduação. A Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro completa 30 anos num momento de grandes desafios para o Brasil e o mundo.
– Darcy, por aqui, as coisas não andam fáceis. Nos últimos sete anos tivemos mais um golpe de estado no Brasil. Nossas elites continuam dominantes para dentro e dominadas para fora. Voltamos ao mapa da fome. Cultura e Cinema são artigos de luxo. Atravessamos quase uma década de ininterruptos e incessantes ataques aos campos da ciência e da cultura. Muitas das nossas melhores cabeças bateram em retirada, buscando abrigo institucional fora do país. Para completar, o mundo enfrentou uma das maiores pandemias da história e estamos atravessando uma crise climática sem precedentes.
É nesse contexto que resgatamos o projeto original da UENF, olhando para um passado não muito distante para projetar o futuro. É tempo de resgatar com prioridade e colocar na mesa de debate novamente a criação do curso de Cinema, em nível de graduação e pós-graduação. Originalmente, a instalação da Escola Brasileira de Cinema e Televisão se daria no Solar do Colégio dos Jesuítas, mas o projeto não vingou. E foram muitas as razões e isso poderá ser um ótimo tema de pesquisa do futuro curso de cinema, renovado a partir das aspirações originais e do tempo presente.
As indústrias do Cinema e da Economia Criativa são estratégicas como modelo de produção e se inserem de forma positiva no debate sobre economia verde.
Apesar do fracasso inicial da EBCTV, ao longo dos seus primeiros 30 anos foi no espaço da UENF que tivemos iniciativas pioneiras de alunos e professores na criação de espaços como o “Cine Cabrunco”, a Unidade Experimental de Som e Imagem (UESI) se consolidou e hoje já possui um acervo significativo sobre a região norte e noroeste Fluminense. Mais recentemente, temos a experiência do “Cine Darcy” que oferece uma programação qualificada com produções audiovisuais independentes de todo o território nacional.
Atualmente, o Solar do Colégio dos Jesuítas abriga o Arquivo Municipal de Campos e ainda precisamos mencionar a importância institucional da Casa da Cultura Villa Maria enquanto espaço de pesquisa no campo dos estudos culturais com seus acervos bibliográfico, fonográfico, iconográfico e documental. Retomar o projeto do curso de cinema para a UENF é o desafio posto para a nova reitoria, para a comunidade acadêmica, para parlamentares e para a secretaria de ciência e tecnologia do estado do Rio de Janeiro. Fazer a UENF crescer é amplificar as vozes do Norte Fluminense!
*Fernando Sousa – Cineasta e Diretor Executivo da Quiprocó Filmes. É Bacharel e Mestre em Ciências Sociais pela UENF/UERJ e futuro doutorando em Sociologia Política no PPGSP/UENF, sendo aprovado em 1º lugar para o semestre 2024/01; Gabriel Barbosa – Cineasta e Antropólogo. Diretor da Quiprocó Filmes; e Elis Miranda – Geógrafa. Docente da Universidade Federal Fluminense. É curadora do Cine Darcy da UENF.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha do editorial do jornal DC – Diário Carioca.
Artigo Originalmente publicado no Brasil de Fato RJ