BRASÍLIA, 16 DE JULHO DE 2023 – O cronista Edevaldo Leal publica, hoje, na sua página do Facebook, comentário de Vanessa Bárbara para o New York Times:
– Deveria ter destinado meu corpo para a ciência – ela escreve. – Ser escritor no Brasil é a mais patética das profissões. Eu escrevi um livro, em 2008, que venceu um prêmio literário e recentemente (2013) vendeu a cópia de número 3 mil. O livro custa, em média, 15 dólares (34,8 reais). O valor repassado para o autor é de 5%, então, eu recebia 0,75 centavos de dólar (1,34 real) por cópia vendida. Pelo livro que eu levei um ano para escrever e mais quatro anos para vender, eu recebi em torno de 2.250 dólares (5.220 reais). Deveria ter destinado meu corpo para a ciência.
Edevaldo Leal publica também um comentário meu sobre o texto de Vanessa Bárbara, feito naquele 17 de dezembro de 2013:
– Sou escritor com mais de meia dúzia de livros publicados, entre romances, novelas, contos e poemas. Sou também jornalista. Transito em vários setores da sociedade. Exceto quanto estou entre artistas, noto que as pessoas não leem livro e, por conseguinte, não devem saber o que é literatura. Meus livros vendem a conta-gotas. Essas reflexões levam ao seguinte: o Brasil é um país em construção, semialfabetizado. Políticos, aqui, dedicam-se a roubar, roubar e roubar. Quanto a mim, literatura é missão. Pago as contas com jornalismo e como terapeuta.
Não faz muito tempo, um poeta, amigo meu, com volumosa obra publicada, me disse que estava pensando em pendurar as chuteiras porque ninguém comprava seus livros. Faz alguns anos, em uma Feira do Livro de Brasília, uma escritora me procurou com seu primeiro livro publicado, de poemas, implorando para que eu comprasse um exemplar, porque tinha que pagar a gráfica que imprimiu seu livro. Disse-lhe, com palavras mais amenas do que estas que sua dívida era problema dela e que eu só comprava livros, e os compro muitos, quando me interessam.
Reunindo esses três casos, responderia, hoje, à Vanessa Bárbara, o seguinte:
– Escreve quem quer, e classificar uma profissão, qualquer profissão, de patética, é uma qualificação pessoal. E eu não escrevo focado em vender e ficar rico financeiramente, ou pagar as contas com literatura. Escrevo porque se fosse impedido de escrever minha vida seria um inferno, pois não sinto mais prazer do que experimento quanto estou criando, especialmente quando me sinto imerso nos sons da madrugada.
Dinheiro é uma consequência; nunca um objetivo. Viver para ganha dinheiro é de total falta de conhecimento da vida. A vida é mental, ou seja, espiritual, e no plano espiritual, moeda, dólar, libra, ouro etc., não vale nem um quark. Continuo pondo comida na mesa com jornalismo; sou aposentado como jornalista. Aposentadoria significa que contamos com salário vitaliciamente sem precisar bater ponto em uma empresa. Continuo trabalhando, como jornalista, escritor e terapeuta em Medicina Tradicional Chinesa.
Temos a tendência de acreditar prontamente em tudo o que vemos, sem analisar pessoas e acontecimentos. Todos os grandes escritores ralaram pacas para chegarem ao sucesso atual. Muitos se endividaram para pagar as primeiras edições de seus livros e alguns nem isso conseguiram, como Franz Kafka, por exemplo. O sucesso de público e de dinheiro não tem receita. É consequência das circunstâncias de cada qual, o que envolve até questões cármicas.
Critica-se muito o Brasil como país de semialfabetizados e analfabetos, onde poucos leem, mas isso não impediu que Paulo Coelho se tornasse o maior vendedor de livros do planeta. Nem impediu que contássemos, hoje, com a obra de escritores como Machado de Assis, Graciliano Ramos, Jorge Amado, João Guimarães Rosa, Rubem Fonseca, Dalcídio Jurandir, Márcio Souza, para citar uns pouquíssimos.
Esses escritores contaram com um fator fundamental para obterem sucesso: talento. Escritor sem talento é como qualquer artista sem talento: só produz lixo. Nesse caso, é melhor se tornar resenhista ou apenas gozar da companhia de artistas talentosos, e até escrever sobre eles. Outro fator importante é a disciplina. Se o escritor quiser usufruir de sucesso, algum dia, há de ter produção. Outros fatores são ler, viajar, fornicar, vagabundar, bater papo, viver o agora. E fazer marketing.
Porém há um fator sine qua non para o sucesso, o sucesso total: compreender, mas compreender realmente, que somos seres espirituais. Que a matéria, como dizem os budistas, não existe. Razão pela qual o cânon literário não pode prescindir de escritores como: William Shakespeare, Franz Kafka, Miguel de Cervantes, Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa, Fiódor Dostoiévski etc. etc. etc. Esses, não estavam nem aí para sucesso financeiro. Estavam, sim, conscientes de que cumpriram com sua missão: escrever.