Há alguns anos, chamou atenção uma barricada de livros em uma janela de um apartamento para se proteger de tiros. O local? Kiev. O contexto? A guerra na Ucrânia. Em um ambiente de violência brutal como a situação de guerra, não houve quem não visse na foto uma certa poesia, “livros protegendo pessoas”, “livros contra armas”, “cultura contra barbárie”. Longe deste cenário, no entanto, os livros precisam sair das janelas e se esconder atrás de pessoas: eis a guerra cultural.
Esporadicamente nos chegam notícias da situação da guerra cultural que se desenrola nos Estados Unidos. O país apelidado de Terra da Liberdade tem vivido em algumas de suas regiões uma onda de conservadorismo que ameaça o acesso a livros que contrariem seus interesses e visões de mundo, ou seja, pondo em risco o livre acesso ao conhecimento.
Neste contexto, figuras que costumam exercer suas atividades frequentemente com discrição são conduzidas aos holofotes. Ou às trincheiras. É o caso dos bibliotecários que são normalmente retratados como pessoas casmurras, nada divertidas, pouco sociáveis, que apreciam mais livros que gente, mas, em uma situação de liberdade restrita, são um dos principais agentes a se posicionar contra a censura, ou seja, a favor da pessoa leitora.
Nesta guerra cultural que vive os Estados Unidos, a situação pode piorar. Segundo uma matéria do The New York Times, bibliotecários chegaram a ser ameaçados de prisão, chamados de criminosos por manter no acervo livros “condenáveis”. Ainda que os censores não sejam maioria, acende um alerta. Até onde isso pode levar?
Pensando na situação da maioria das bibliotecas do Brasil, da falta de verba, dos acervos defasados e que, ao contrário daquelas, tem uma baixa procura, uma Pollyanna poderia exaltar a atenção do censor com o acervo de uma biblioteca pública. Isso quer dizer que são usuários da biblioteca? Oxalá fosse. Porém, é interessante perceber como os funcionários de biblioteca recebem um upgrade na imagem. Tornam-se heróicos, guardiões do conhecimento, um tipo de guerreiros da liberdade. Suas lutas travadas no dia a dia (e que ninguém costuma ver) ganham a atenção, mesmo que momentaneamente, de todos. Dá esperança, como todo bom herói deve proporcionar e como todo cidadão merece.