Chegar em casa, depois de um dia de trabalho, acessar as redes sociais e os principais sites de notícias, é uma rotina na minha vida. O que não imaginava era que a mesmice fosse quebrada por uma notícia: Robin Williams havia morrido.
Demorou que a ficha caísse. Minha mente virou uma grande sala de cinema onde, em segundos, projetaram-se inúmeros filmes. E eis que começo a rir sozinho, nas poltronas de minha memória, quando surge uma senhora simpática e brincalhona. Apresenta-se como Euphegenia Doubtifire. Olho mais de perto e percebo que aquilo é um cara. Ela (ou ele) olha para mim e diz “Meu primeiro dia como mulher e eu estou recebendo as ondas de calor.” (Uma Babá Quase Perfeita, 1993).
Sem entender o que acontecia, resolvi levantar. Estava decidido a sair desta sala mental e voltar à realidade. Um grito forte me fez virar novamente para a tela. E lá estava Alan Parrish, dizendo: “Vamos sentar todos nós. Vamos terminar o jogo” (Jumanji, 1995).
Então o rosto de Parrish foi se transformando no do incrível professor de Literatura John Keating. Seu rosto foi crescendo na tela, tomando conta de toda minha mente. E ele, sorridente, pronuncia em alto e bom som: “Cape Diem!” (Sociedade dos Poetas Mortos, 1990).
Nesse momento, em uma explosão de cores, aconteceu tudo ao mesmo tempo: um enorme gênio azul vira um cientista com uma borracha verde saltitante, o cientista vira um saxofonista russo, este se transforma em um bombeiro, que vira um locutor, que vira um neurologista, que vira um mendigo, que vira um pai de família na Terra do Nunca, que vira um amante de brinquedos, que vira uma drag queen, que vira um garoto com cara de adulto, que vira um fracassado escritor, que vira um analista, que vira um escritor, que vira um comerciante, que vira um estudante de medicina, que vira um pai de família no Paraíso, que vira um robô, que vira um funcionário de loja de revelação, que vira um apresentador de programa infantil, que vira um suspeito de assassinato, que vira um remontador de memórias, que vira um deficiente físico, que vira um apresentador noturno de rádio, que vira um pinguim, que vira um trabalhador estressado, que vira Roossevelt, que vira um anfitrião de talk show, que vira um violoncelista, que vira um reverendo, que vira um sócio de uma empresa de marketing esportivo, que vira uma babá, que vira o professor de literatura.
John Keating está novamente em minha frente. Mas algo está errado: ele não está tão sorridente. Não! Não é John Keating! É Robin Williams! Mas por que tão triste? Eu me peguei gritando para aquele que havia vivido uma infinidade de vidas: “Carpe Diem”! Ele continua estático, carrancudo, envelhecido.
Será que tem a ver com a perseguição que a máquina Hollywoodiana faz aos grandes nomes do cinema que envelhecem? Será que aqueles olhos queriam dizer que estava cansado de lutar por prestígio o respeito? Aquele na minha frente não tinha a alegria de nenhum dos seus personagens, que sempre encontrava no sorriso a solução para os problemas, sem nunca perder a esperança de que tudo acabaria em um final feliz. Não. O velho Robin que me encara não parece acreditar naquilo que suas inúmeras vidas nos ensinaram.
E, com os olhos marejados, o gênio Robin Williams questiona com a voz embargada: “Carpe Diem? Como?”.
A tela se apaga. Dentro de minha cabeça, um vazio escuro, e meu devaneio acaba.
Adeus, Robin!
P.S.: Carpe diem é uma frase em latim de um poema de Horácio, e é popularmente traduzida para colha o dia ou aproveite o momento. Tornou-se o principal lema dos poetas árcades.