Em tempos de redes sociais, o desejo de entrar para a história é tanto que todo mundo acaba tendo opinião sobre tudo. Principalmente quando a pessoa em questão é política. Para os mais preparados, haja frase de efeito, e para os outros, o que não falta é grosseria e, infelizmente, manchetes. Tudo porque, assim como nas fofocas, quanto mais cabeludo o assunto, mais atenção ele atrai. E nesse universo de clicks, curtidas, comentários e compartilhamentos, o que vira notícia: o palavrão do presidente sobre um senador, no dia 21, ou a reprimenda de Lula ao público de Recife, no dia 22, que vaiou a governadora Raquel Lyra (PSDB)?
Não é preciso pensar muito para saber a resposta e sentir que, na fala do presidente existe um universo de intrigas por trás do “pi”, aquele efeito sonoro que rádios e TVs usam para encobrir palavrões. Menos de um segundo de rancor que está custando caro. Lula deu chance para o azar e ele surgiu logo depois da entrevista, quando a Polícia Federal (PF), após 45 dias de investigação, divulgou um plano da maior organização criminosa do país, que pretendia atacar servidores públicos e autoridades, como o senador Sergio Moro (União Brasil). Aí, cada um entendeu convenientemente do seu jeito e subiu no palanque. Por exemplo, Deltan Dallagnol (Podemos), que atuou na Operação Lava Jato e atualmente é deputado estadual, declarou que “Lula reagiu a Moro do mesmo modo que o crime organizado”. Dos Estados Unidos, o ex-presidente Jair Bolsonaro também deu o seu “pitaco”, relacionando o caso Celso Daniel, assassinado em 2002, à facada que sofreu em 2018 e ao plano contra Moro como sendo atos da esquerda.
Mais sensato, Moro resistiu à sedução do ódio em um momento de “sangue quente” e discursou no Senado sem atacar ninguém diretamente. Apesar de ex-juiz, demonstrou não ter perdido o juízo.
No meio da fervura, o Ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), declarou que a PF é parte do Estado e que se alguém no governo tivesse a intenção de assassinar o senador, por que os bandidos seriam presos e o plano divulgado? Obviamente, a PF é subordinada ao Ministério da Justiça, mas tem independência de atuação. Entretanto, a declaração do ministro tem a sua lógica. Enfim, cada um tenta construir um filme com peças de outras histórias e o que sobra é a uma colcha de retalhos, aceita sem discussão apenas pelos fanáticos.
Mordendo a língua
Parlamentares do PL, União Brasil e Podemos dizem que a declaração de Lula foi crime de responsabilidade. Esse é um direito deles, mas depois de Jair Bolsonaro, ainda é possível algum presidente sofrer impeachment por falas infelizes? É muita gente tentando escrever a história “de trás para frente”, e… “se colar, colou”!
No fim das contas, a fala de Lula foi completamente infeliz, mas é o problema de quem dá entrevistas demais e acaba tropeçando na própria língua. No mais, é muita atenção para “diz-que-me-disse” de sempre enquanto o todos precisam compreender que a investigação da PF escancara, mais uma vez, o problema da segurança pública no Brasil. As eleições passaram e enquanto o “bicho pega” no Rio Grande do Norte, o inimigo não é o parlamentar de outro partido, mas o crime organizado. É como no título do filme tropa de Elite 2: “o inimigo agora é outro”