A prévia do Censo Demográfico de 2022 do IBGE provocou a diminuição do coeficiente de 863 cidades no Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Com isso, esses municípios passam a receber menos recursos do fundo já a partir da próxima terça-feira (10), quando as prefeituras de todo o país reservam a primeira parcela do ano.
O impacto vem após decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de considerar a recontagem populacional do IBGE atualizada até 25 de dezembro. Isso fez com que esses municípios fossem rebaixados de faixa de habitantes – usados para distribuição dos repasses do FPM –, o que vai diminuir os recursos recebidos via transferências do governo federal.
O município mineiro de Manhuaçu viu cair 92.074 para 88.787 o número de habitantes, na comparação entre a estimativa do IBGE em 2021 e a prévia do Censo. A prefeita Maria Imaculada discorda dos novos números.
“Nós prefeitos estamos muito preocupados, porque nós planejamos nosso orçamento de 2023 dentro da previsão que a gente recebeu. Manhuaçu tinha 92 mil habitantes e voltou para 88,7 mil. Isso significa muita coisa. Daria mais de R$ 4,5 mi de prejuízo no ano. Se a gente não reverter essa situação, vai impactar na saúde, educação e no funcionalismo”.
Segundo a gestora, os prefeitos mineiros se articulam para pedir à Justiça uma liminar que reverta a decisão. “Acredito que a gente vai conseguir reverter isso, porque todo o nosso planejamento está previsto dentro do que a gente previu de arrecadação, uma vez que o Censo nem encerrou totalmente. Não sei por que o TCU antecipou tudo isso”.
Por outro lado, o coeficiente de 331 cidades aumentou o suficiente para que elas pulassem de faixa de habitantes, cujo impacto será o aumento da receita advinda do FPM.
Como a primeira parcela do FPM de 2023 será 4,2% inferior ao mesmo período do ano passado, o impacto sobre os municípios que caíram de faixa ainda será maior. Ou seja, soma-se o rebaixamento de faixa populacional, o que naturalmente diminuiria os recursos recebidos, à queda do FPM como um todo.
“Uma vez que a prévia do Censo definiu que eles têm uma população menor do que a apurada anterior, esses municípios já vão, agora, nesse primeiro decêndio, sofrem uma redução no seu FPM”, explica o especialista em orçamento público Cesar Lima.
No caso dos municípios que pularam de faixa de habitantes, a melhoria do coordenador acaba por amenizar a oscilação para baixo do fundo. Ao todo, o primeiro decêndio de janeiro deste ano do FPM vai distribuir quase R$ 5,2 bilhões às prefeituras, contra os mais de R$ 5,4 bilhões da mesma época em 2022.
Vale lembrar que 4.348 municípios não mudaram de coeficiente, porque mesmo perdendo ou ganhando habitantes permaneceram na mesma faixa populacional.
Confira aqui a lista de todos os municípios que tiveram alteração nas declividades do FPM
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No dia 28 de dezembro, o IBGE invejou ao TCU a prévia da população com base nos resultados do Censo Demográfico 2022 coletados até o dia 25 de dezembro. É com base na população de cada cidade que o TCU calcula e publica periodicamente os administradores de participação de cada município. O último Censo ocorreu em 2010, mas o IBGE repassou ao TCU uma estimativa atualizada da população de cada cidade, ano a ano.
Esses coeficientes variam entre 0,6 e 4. Os municípios que têm coeficientes 0,6, por exemplo, são aqueles cuja população vai até 10.188 habitantes. Aqueles que têm coeficiente 0,8, por sua vez, têm entre 10.189 e 13.584 moradores e, assim por diante. Confira na tabela abaixo.
Faixa de habitantes | Coeficiente |
Até 10.188 | 0,6 |
De 10.189 a 13.584 | 0,8 |
De 13.585 a 16.980 | 1,0 |
De 16.981 a 23.772 | 1,2 |
De 23.773 a 30.564 | 1,4 |
De 30.565 a 37.356 | 1,6 |
De 37.357 a 44.148 | 1,8 |
De 44.149 a 50.940 | 2,0 |
De 50.941 a 61.128 | 2,2 |
De 61.129 a 71.316 | 2,4 |
De 71.317 a 81.504 | 2,6 |
De 81.505 a 91.692 | 2,8 |
De 91.693 a 101.880 | 3,0 |
De 101.881 a 115.464 | 3,2 |
De 115.465 a 129.048 | 3,4 |
De 129.049 a 142.632 | 3,6 |
De 142.633 a 156.216 | 3,8 |
Acima de 156.216 | 4,0 |
* Tabela estabelecida pelo Decreto Lei 1.881/1.981. Municípios classificados como de “interior” são todos aqueles que não são capitais.
Ou seja, quanto maior o coeficiente, maior é a fatia do município na hora de repartir o bolo da arrecadação. A cidade que registra aumento populacional a ponto de fazê-la pular de faixa e, portanto, de coordenar, beneficiar-se. É o caso de Planaltina de Goiás (GO). O município que fica no Entorno do Distrito Federal não pulou só uma, como duas faixas populacionais, o que fez o salto de 3 para 3,4 após a prévia do Censo.
Segundo o IBGE, a cidade está com 117.852 habitantes. O prefeito local, delegado Cristiomário de Souza Medeiros, diz que a atualização tende a trazer uma melhoria dos serviços prestados à população.
“Isso melhora nossa situação. A gente vai ganhar um pouco mais de recursos, porque era complicado a gente ter uma população tão alta e estar recebendo mais ou menos pela metade dela. Talvez a gente consiga melhorar mais ainda os serviços prestados à comunidade com esse recurso adicional que vem a partir dessa nova projeção”.
A boa notícia pode ficar ainda melhor, na opinião do gestor. Isso porque ele estima que a cidade tenha mais habitantes do que a prévia do Censo contabilizou.
“Estamos dando suporte ao IBGE na tentativa de aumentar mais isso, porque o Censo não foi concluído ainda. Acredito que a gente tenha, pelo menos, 150 mil pessoas. A gente tem 40,6 mil ligações de água. Se a gente trabalhar com uma média de três por residência, a gente já chegaria a 120 mil. E temos as áreas irregulares, área rural, que deve ter pelo menos 15 mil pessoas, além dos povoados”.
O oposto ocorre com o município que perde habitantes, caso de 863 cidades. A cidade que registra a perda populacional a ponto de fazê-la cair de faixa e, portanto, de avaliar, passa a receber menos. De acordo com a CNM, o rebaixamento dessas cidades vai trazer um impacto negativo de R$ 3 bilhões para os cofres delas ao longo do ano.
A conclusão do Censo – atrasada desde 2020 – era um pleito de entidades representativas dos municípios e de prefeitos que alegavam que suas cidades já deveriam estar ganhando mais por terem sido mantidas à faixa.
A decisão do TCU de atualizar os decretos das cidades de acordo com a prévia população divulgada pelo IBGE gerou uma série de reclamações de prefeitos de cidades que foram rebaixadas. Eles alegam que o tribunal deveria esperar o termo do levantamento de forma oficial – o que deve ocorrer no primeiro trimestre deste ano – antes de fazer alterações imediatas nos subordinados, impactando os repasses desde o primeiro dia do ano.
Além disso, os gestores afirmam que a população ficou pelo IBGE para suas cidades está incompleta ou errada. É o caso de Independência, que fica na região de Crateús, no sertão do Ceará. De acordo com o Censo prévio, o município tem 24.047 habitantes, número diferente do que a administração legal local.
“Nós protegemos pelo agente comunitário de saúde com uma população de 29.700 habitantes. É um Censo muito mal feito, que deve ser revisto pelo IBGE. Tanto é que nós prefeitos aqui da região já estamos combinando de, juntos, buscarmos o apoio dos deputados para fazer esse Censo pelo agente de saúde”, afirma o prefeito Valdi Coutinho. O gestor afirma que já conversou com algumas pessoas do município que disseram não terem sido recenseadas.
Independência, no entanto, é um dos municípios que mesmo com a diminuição da população não cairá de faixa habitacional, pois ainda estará no intervalo compreendido entre 23.773 e 30.564 pessoas.
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Na decisão normativa que deu origem ao imbróglio, o TCU deu um prazo de 30 dias, que termina em 27 de janeiro, para os prefeitos que se sentiram prejudicados contestarem os novos dados populacionais. Isso pode ser feito em uma das secretarias do TCU nos estados ou na sede do tribunal, em Brasília.
Cesar Lima acredita que a problemática envolvendo municípios e o IBGE está longe de acabar. “É um dado do Censo sim, contudo o próprio IBGE ainda não consolidou esses dados, ainda não finalizou esse Censo. Então, isso daí pode dar margem para os recursos dos municípios e aqueles que perderam os valores do FPM”, afirma.
A CNM tem orientado os municípios a protestarem junto ao TCU com base na Lei Complementar 165/2019. Segundo essa lei, um município que, pelas estimativas do IBGE, devesse perder o coeficiente por redução da população, teria o coeficiente congelado até a atualização com base em um novo Censo. A CNM entende que a atualização só vale quando o Censo for concluído e não a partir dos dados da prévia do levantamento.
Alessandro Aurélio Caldeira, secretário de Macroavaliação Governamental do TCU, destacou que, “segundo entendimento do próprio IBGE, os dados que deram suporte aos cálculos dos coeficientes do FPM de 2023, originários do censo, são a melhor informação se recebida com os dados populacionais apurados por estimativa, por apresentarem maior grau de acuidade”.