Casa Roberto Marinho completa 5 anos com três exposições inéditas

Diário Carioca
ICRM - Fachada. foto Mario Grisolli

Inaugurado em 28 de abril de 2018, o Instituto Casa Roberto Marinho anuncia três novas exposições em celebração aos seus cinco anos. Na mesma data (28/04) serão abertas publicamente Gesto em suspensão, individual em torno da produção artística da paulistana Maria Leontina (1917-1984), expoente do modernismo brasileiro; A criação do artista popular, com peças do conjunto reunido pela ensaísta, poeta, museóloga, historiadora da arte e antropóloga carioca Lélia Coelho Frota (1938-2010); e Coleção no seu tempo, com obras do acervo do instituto. 

Concebida para promover o conhecimento através da arte, sob a direção do arquiteto, antropólogo e curador Lauro Cavalcanti, a Casa Roberto Marinho se consolidou como um centro cultural ativo de artes plásticas com foco em modernismo brasileiro. 

Ao longo desses cinco anos, o instituto realizou 18 exposições e organizou diversas publicações e palestras, além de oferecer programação regular e gratuita com visitas mediadas, ateliês para crianças e famílias, e exibição de filmes de arte. Destaca-se também a parceria com instituições de relevância nacional e internacional, como Museu de Arte de São Paulo (MASP), Instituto Burle Marx, Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), Calder Foundation e Fundació Miró.

“Mesmo em meio ao período de isolamento social, em decorrência da pandemia, a Casa se manteve ativa ao promover um ciclo de conversas on-line com artistas, críticos e curadores de relevo na cena brasileira, que posteriormente resultou numa publicação”, relembra Cavalcanti.

Constituída no decorrer de seis décadas, a Coleção Roberto Marinho soma cerca de 1.400 peças cadastradas, incluindo pinturas, esculturas, gravuras, objetos e desenhos. A seleção reúne grandes nomes da arte brasileira, como Alberto da Veiga Guignard, Anita Malfatti, Antonio Bandeira, Candido Portinari, Di Cavalcanti, Djanira, Iberê Camargo, Ismael Nery, José Pancetti, Lasar Segall, Maria Martins e Tarsila do Amaral. Expoentes estrangeiros como Giorgio De Chirico, Marc Chagall, Salvador Dalí e Vieira da Silva também fazem parte do acervo.

MARIA LEONTINA – GESTO EM SUSPENSÃO
Curadoria: Alexandre Dacosta

Na celebração do seu quinto aniversário, a Casa Roberto Marinho apresenta, no piso superior, um encontro entre Maria Leontina e Lélia Coelho Frota, ao evocar os quase 30 anos de convivência poética e afetiva destas duas figuras da arte brasileira, grandes amigas e cúmplices em vida. Para Lauro Cavalcanti, associar a pintora e a escritora no mesmo tempo e espaço faz sentido pela “liberdade que exerciam” e pela “coincidência de seus repertórios que mesclavam, sem distinção, passado e contemporaneidade”.

A exposição Gesto em suspensão reúne cerca de cem pinturas, desenhos e gravuras de Maria Leontina (São Paulo, 1917 – Rio de Janeiro, 1984) em um recorte inédito, afetuoso e sensível de sua obra. Trabalhos raramente exibidos de diversas fases das décadas de 1940 a 1980, pertencentes à família da artista, a coleções particulares e a instituições, fazem parte da seleção de Alexandre Franco Dacosta, filho da pintora, também artista visual, compositor e cineasta.

Nome de destaque do modernismo brasileiro, Leontina explorou o figurativismo de cunho expressionista, como se vê na obra “Retrato de mulher”, 1949, e na série “As Orantes”, 1966-1967. A partir da década de 1950, passa para o abstracionismo, representado na mostra pela pintura “Da paisagem e do tempo”, 1950, bem como pela série “Os jogos e os enigmas”. 

Na década de 1960, realizou um painel de azulejos para o Edifício Copan e vitrais para a Igreja Episcopal Brasileira da Santíssima Trindade, ambos em São Paulo. Apesar de sua relevância, há muito tempo não se realizava uma exposição extensa dedicada à obra de Leontina e Gesto em suspensão cobre esta lacuna.

“Minha mãe realizou uma pintura entre linhas, entre versos. No hiato, no espaço entre, onde o gesto tinge com leveza a superfície preenchida e aprofunda a percepção de um olhar ampliado pela poesia. Se o ar se refaz líquido, se a matéria se reduz a pó, há algo de imaterial na sua pintura que emana de suas pinceladas e que estão em constante levitação, como se uma brisa contínua soprasse sua forma, sua cor. Uma pintura flutuante, liberta, sem linha do horizonte para sustentar seu voo”, escreve o curador no texto de apresentação.

A montagem inclui comentários críticos de Ferreira Gullar, Frederico Morais, Mario Pedrosa, Paulo Herkenhoff e Paulo Venancio Filho:

“O desenho foi o jogo deflagrador do imaginário de Maria Leontina, o campo de inflexão da linguagem em etapa prospectiva e experimental. ‘Sempre é uma temática que eu sinto surgir quando vou desenhar. Às vezes estudando o desenho saem outras coisas. De repente, percebo um tema. Tenho que explodir’. (…) O desenho foi quase o pouso manso da matéria sobre o suporte e o método de transformação do espaço em estrutura. A mansidão da arte de Leontina não foi só a forma, mas também o modo como a vontade material articulou o mecanismo gráfico.” (Paulo Herkenhoff, 2010)

“(…) Ela dá a seus trabalhos títulos aparentemente literários: sua pintura se aproxima do tipo de formulação da linguagem poética, e esses títulos, mais sugestivos que determinantes, chamam a atenção do espectador para o caráter alusivo das obras”. (Ferreira Gullar, 1959)

A CRIAÇÃO DO ARTISTA POPULAR

Curadoria: João Emanuel Carneiro

Uma das salas no mesmo andar é dedicada à mostra A Criação do artista popular, que pela primeira vez exibe a coleção de Lélia Coelho Frota (1938-2010). Poeta, ensaísta, museóloga, historiadora da arte e antropóloga carioca, Lélia foi responsável por trazer à luz trabalhos de artistas populares, genericamente referidos como artesãos do folclore popular, através da publicação de sua autoria “Mitopoética de 9 Artistas Brasileiros” (Funarte, 1978). 

Para o autor de teledramaturgia João Emanuel Carneiro, filho da colecionadora e curador da mostra, a mãe foi muito precursora ao legitimar esses artistas que eram invisibilizados. Ao longo dos anos, Lélia fez verdadeiras expedições ao interior do Brasil em busca da arte desenvolvida longe do academicismo, baseada no saber popular e autodidata.

“Era final da década de 1970. Eu, uma criança pequena, acompanhava minha mãe na peregrinação à casa de um dos artistas populares que ela elegera para participar do livro ‘Mitopoética’. A casa ficava no Vale do Jequitinhonha, no meio do mato, sem endereço certo. Seguíamos um guia. Era preciso atravessar uma pinguela num rio, com medo de picada do barbeiro, até finalmente chegarmos na casa de pau a pique, sem luz e chão de terra batida aonde minha mãe iria entrevistar o artista.”

“Deve-se a ela, nesse sentido, a personalização do criador popular no vasto campo da arte brasileira, sem os congelar como seres sem faces, personagens quase anônimos de manifestações coletivas”, reitera Lauro Cavalcanti. 

“A formação do artista popular sempre foi diferente à de outro; ele

é autodidata a partir de um certo momento de sua vida, vem de um

fundo comum, às vezes do meio rural, sempre levando à arte que

elabora uma técnica própria de seu trabalho original.”
(Lélia Coelho Frota)

Serão exibidas cerca de 40 peças desta coleção, iniciada na década de 1970, em que os gostos de Lélia se refletem em muitas camadas. A espiritualidade, por exemplo, pode ser vista em algumas das 12 obras de Júlio Martins da Silva (1893-1978), seu pintor favorito de acordo com João Emanuel. 

Dentre os trabalhos de outros talentos revelados pela antropóloga, ganha destaque “Central do Brasil”, de Manuel Faria Leal, que pintava espaços urbanos e faz uma interessante interpretação popular da vida do carioca no século 20, nesta tela de grande dimensão. 

O curador aponta também para o bordado de Madalena dos Santos Reinbolt (1919-1977): “Ela trabalha a tapeçaria com fios coloridos, entrelaçando-os como se fossem uma pintura”, descreve. Nascida em Vitória da Conquista, Bahia, Reinbolt foi uma mulher preta que não teve acesso à educação formal, tendo contato com as expressões artísticas através de sua mãe, ainda na infância. Na década de 1940, mudou-se para o Rio de Janeiro para trabalhar como empregada doméstica e foi cozinheira na casa da arquiteta e urbanista Lota de Macedo Soares e da poeta norte-americana Elizabeth Bishop, em Petrópolis.

“A criação desses artistas populares brasileiros do século XX, genuína, telúrica, às vezes também metafísica, sem filtro nem superego, dando vazão diretamente ao fluxo do inconsciente, era para Lélia como uma descoberta de um tesouro escondido”, analisa João Emanuel. 

COLEÇÃO NO SEU TEMPO

Curadoria: Lauro Cavalcanti

No térreo da Casa Roberto Marinho, o público encontrará a exposição Coleção no seu tempo, com 44 obras do acervo, de vertentes e períodos variados, escolhidas por Lauro Cavalcanti para a ocasião celebrativa. Há trabalhos de Anna Bella Geiger, Antonio Bandeira, Carlos Vergara, Frans Krajcberg, Iberê Camargo, Luiz Aquila, Mira Schendel, Rubem Valentim, Wanda Pimentel e Yolanda Mohalyi, entre outros nomes consagrados.

A seleção inclui também aquisições recentes da coleção e trabalhos que serão exibidos pela primeira vez, como Cosmos jaune, 1972, de Arthur Piza; Paisagem, de Manuel Messias, e uma serigrafia sem título, de 1977, de Emanoel Araújo.

Em destaque pinturas de grande formato, como as de Di Cavalcanti, Ingeborg ten Haeff, Jorge Guinle Filho, Manabu Mabe, Raul Mourão e Tomie Ohtake, além de obras atípicas de estrelas do modernismo brasileiro, como as de José Pancetti. Há, ainda, gravuras concebidas especialmente para mostras anteriores da Casa Roberto Marinho por Angelo Venosa, Beatriz Milhazes, Carlito Carvalhosa, Luiz Zerbini, Paulo Climachauska, Regina Silveira e Vania Mignone. 

A exposição se encerra com uma cronologia (imagem abaixo) que apresenta a sequência de ações do instituto, desde a sua fundação em 2018, com acesso a informações por meio de QR Code.

“Através de mostras de acervo periódicas, a Casa Roberto Marinho reafirma-se como um centro ativo de referência em artes plásticas e cumpre um importante papel, permitindo ao público reconhecer a diversidade de repertório de alguns dos nomes mais relevantes da arte brasileira”, diz Cavalcanti.

SERVIÇO:

Maria Leontina – Gesto em suspensão

+

A criação do artista popular | Coleção Lélia Coelho Frota

+

Coleção no seu tempo | Coleção Roberto Marinho

Aberturas: 28 de abril de 2023, sexta-feira, a partir das 12h

Encerramentos: 16 de julho de 2023

Instituto Casa Roberto Marinho

Rua Cosme Velho, 1105 – Rio de Janeiro

Tel: (21) 3298-9449

https://casarobertomarinho.org.br/

Instagram: @casarobertomarinho

Visitação: terça a domingo, das 12h às 18h (entrada até às 17h15)

(Aos sábados, domingos e feriados, a Casa Roberto Marinho abre a área verde e a cafeteria a partir das 9h.)

Ingressos: R$ 10 (inteira) / R$ 5 (meia entrada)

Às quartas-feiras, a entrada é franca

Aos domingos, “ingresso família” a R$ 10 para grupos de quatro pessoas

A CRM respeita todas as gratuidades previstas por lei

Estacionamento gratuito para visitantes, em frente ao local, com capacidade para 30 carros.

A Casa Roberto Marinho é acessível a pessoas com deficiência.

Share This Article
Follow:
Equipe de jornalistas, colaboradores e estagiários do Jornal DC - Diário Carioca