Não resta a menor dúvida de que a retificação de nome é um grande passo para as pessoas que não se identificam com seu nome de registro, para muitos geram traumas, medos e momentos bem desconfortáveis. Em meados de 2018 o STF autorizou pessoas trans a mudarem o nome mesmo sem cirurgia ou decisão judicial, todo cidadão tem direito de escolher como deseja ser chamado. Assim definiu o Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, ao reconhecer que pessoas trans podem alterar o nome e o sexo no registro civil sem que se submetam a cirurgia. O princípio do respeito à dignidade humana foi o mais invocado pelos ministros para decidir pela autorização. Uma grande vitória dentro de um país com pensamento tão rústico e conservador como o Brasil.
Grande parte da sociedade ainda não “entende” a necessidade de as pessoas fazerem a troca dos nomes que elas não se identificam, muitos questionam, mas poucos procuram saber a fundo a sequência de coisas que um “simples” nome pode mudar na vida de uma pessoa. Hoje, o Brasil é o país que mais mata transsexuais, os números são gritantes e não pararam de crescer mesmo durante a pandemia. A comunidade LGBTQIA + é uma das maiores comunidades no Brasil que luta por igualdade, respeito e equidade em nossa sociedade, infelizmente ainda não obtiveram voz suficiente a ponto de fazer a sociedade entender ou pelo menos respeitar que como o outro se identifica não desrespeito a ninguém além da própria pessoa. Ser LGBTQIA+ em um país onde não se tem direito de ser quem você é, é muito difícil. Agora imagine a situação de pessoas transsexuais, a realidade não é fácil há muito tempo, pois, são diversos fatores para se enfrentar, além do preconceito da sociedade, existe uma luta interna, de autoaceitação, ou seja, a retificação de um nome envolve muitos fatores, até mesmo antes de entrar com a solicitação, é todo um processo de autoconhecimento e de vida. Envolve fatores sociais, socioeconômicos, psicológicos, pois, “ser diferente” no Brasil não é uma tarefa muito fácil, é um déficit cultural, ainda mais quando o Líder do mesmo, tem uma visão totalmente distorcida sobre o direito das pessoas, ferindo até mesmo a própria Constituição Federal.
Diante de um fato tão importante e tão pouco falado, convidamos a influenciadora digital Isabelli Potter para nos contar todos os detalhes de trâmites feitos para alteração de seu nome.
Isabelli Potter teve sua certidão de nascimento retificada recentemente, a influenciadora digital contou com o auxílio de sua assessoria jurídica para entrar com todos os trâmites necessários para fazer a retificação de forma mais rápida. “Optei por contratar uma assessoria jurídica pelo fato de estar fora do Brasil, é inviável para mim, ir para o Brasil resolver essas questões burocráticas devido ao meu tempo e a minha rotina ser toda aqui fora. A retificação do meu nome foi super especial para mim, pois, consegui homenagear uma das pessoas mais importantes da minha vida, minha avó materna, ela se chamava Clelia Potter da Rosa, decidi fazer essa homenagem para tentar expressar um pouco da minha gratidão por ela ter me criado, sem a criação dela eu não seria a mulher que sou hoje e não teria suportado passar por diversas situações que já passei, o nome Clélia Potter para mim, significa muito amor, força e luz, pois tem a essência da minha amada avó”. Disse
Isabelli Clelia Potter da Rosa, conhecida como isa Potter irá nos tirar algumas dúvidas sobre sua retificação:
Quanto tempo dura o trâmite de retificação?
Falar de tempo é falar de sorte nesses casos, pois varia muito, conheço pessoas que demoraram bastante tempo, mas também conheço pessoas que não demorou tanto, mas acredito que entre 6 meses a um ano.
Quais documentos são necessários?
É necessário alguns documentos, pois, estamos falando de uma mudança de nome, então, tudo que implica e envolve seu nome é necessário comprovar, através de certidões e meios comprobatórios. Citarei algumas documentações abaixo, mas peço desculpas caso esteja esquecendo de algum item.
Certidão de nascimento atualizada
Certidão de casamento atualizada, se for o caso
Cópia do RG
Cópia da identificação civil nacional (ICN), se for o caso
Cópia do passaporte brasileiro, se for o caso
Cópia do CPF
Cópia do título de eleitor
Cópia de carteira de identidade social, se for o caso
Comprovante de endereço
Certidão do distribuidor cível (estadual/federal)
Certidão do distribuidor criminal (estadual/federal)
Certidão de execução criminal (estadual/federal)
Certidão dos tabelionatos de protestos
Certidão da Justiça Eleitoral
Certidão da Justiça do Trabalho
Certidão da Justiça Militar.
Além de alteração de nome nessa mesma certidão é possível alterar o gênero?
Sim, é possível! Antigamente mulheres trans precisavam de laudos médicos e até mesmo se submeterem a cirurgias de readequação genital para conseguir alterar seus próprios nomes e gênero na certidão, com a evolução do judiciário foi “facilitado” estas mudanças. Eu mesma não fiz a cirurgia e consegui ter êxito em fazer as mudanças e estou super feliz por isso, a cirurgia não está nos meus planos.
Em algum momento já passou pela sua cabeça a dúvida da retificação? Se sim, teve algum preparo psicológico para isso?
Nunca tive nenhuma dúvida sobre fazer a mudança de nome e gênero na certidão, mas como antes era mais difícil eu então via dificuldades. Eu penso que até demorei a buscar a mudança devido viver fora do Brasil, mas graças a Oxalá tudo correu bem e consegui.
Não precisei de nenhum apoio psicológico, antes sim tínhamos que fazer análises para receber um laudo que levava a patologias para gerar autorização mudança do nome social, fora a obrigação de readequação genital, se você não fizesse, você não muda a o nome.
Um caso que acompanhei foi o da Roberta Close, que demorou anos para fazer a retificação.
Era vergonhoso, imagina você ter passado pela cirurgia e ainda pelo stress para conseguir retificar o nome, só de pensar já fico nervosa. Conheço amigas que ficaram traumatizadas com a demora que o sistema tinha em reconhecer o gênero após a cirurgia, atualmente tudo mudou, não é o ideal ainda, mas mudou muito, ainda a dificuldades, mais nada se compara como antes, ainda bem né que hoje mudou tudo e estou retificada.
O processo é calmo ou é desgastante?
Acredito que o processo seja sim, bem desgastante, pois envolve muitas coisas, né? Muitos documentos e comprovações. No meu caso foi mais tranquilo pela assessoria jurídica ter me poupado da parte mais burocrática, né? Mas é um processo, todo processo tem suas complexidades.
Qual a idade mínima para fazer a retificação na certidão de nascimento?
É preciso ter 18 anos ou mais para poder trocar seu nome e/ou gênero nos documentos. Menores de idade, mesmo com autorização dos pais, precisam entrar com um processo judicial. Uma alternativa para pessoas trans com menos de 18 anos é utilizar o nome social, que pode ser inserido no RG e deve ser respeitado em escolas, hospitais e outras instituições.
Conforme as respostas que Isa Potter nos concedeu o judiciário está em um processo evolutivo constante, pois, houveram diversas melhorias no atual quesito desde os últimos tempos, desde adequações nas leis como nos trâmites, antes era necessário toda uma preparação psicológica, uma sequência de laudos, um desgaste emocional muito grande, porque era tudo muito difícil de se fazer e entender, mas está tudo cada vez mais resolutivo. “Acredito que ainda temos muito o que melhorar, mas só de já evoluirmos não podemos reclamar, não é mesmo? Meu sonho é que um dia a retificação seja algo mais simples de se resolver, estamos rumo a esse caminho. Para mim, foi simples e resolutivo, devido ao apoio jurídico que tive, mas como sei que diversas pessoas não têm o privilégio que tive de ter um acompanhamento jurídico durante o processo, eu torço muito para ser o mais simples possível futuramente”. Desabafou
Com mais de 29 mil seguidores no Instagram, Isa Potter dá voz a causas importantes e mostra todo seu lifestyle. “Eu sempre lutei e sempre lutarei pelos direitos LGBTQIA +, pois, me representa por completo. Uso minha influência para deixar claro para as pessoas diversos assuntos que muitas pessoas acham tabu ou julgam que devem ser escondidos. Mas comigo o negócio é mais embaixo, eu falo, eu luto, dou voz, escuto e gosto de ser escutada. Meu movimento não é em vão, sabe? Hoje estou aqui falando sobre a retificação na certidão de nascimento, algo que deveria ser comum e banal, algo que é de direito nosso, mais é tão banalizado e menosprezado, e digo mais, eu falarei quantas vezes for necessário sobre esse e qualquer outro assunto. Tudo que for me levar para progredir e fazer outras pessoas progredirem me faz bem, essa é meu propósito por aqui, lutar por todos os direitos, sejam eles mínimos, básicos ou não. Direito é Direito”. Disse
“Uma situação super constrangedora que acontece sempre, é sobre as pessoas julgarem umas às outras pelos órgãos genitais. O que importa para o outro se sou uma mulher trans ou uma travesti? Do que isso interfere e muda na vida do outro? O que isso influência no caráter das pessoas? É uma grande vitória podermos comemorar o avanço dos direitos que antes eram cumpridos de qualquer forma e hoje são cumpridos, mas não entra na minha cabeça questionamentos insensíveis assim, situações assim, geram medo, inseguranças de diversas formas em várias áreas da vida, sabe? Julgo que isso é um problema cultural, pois, desde que vim para a Europa, sou respeitada com meu nome, sem precisar passar por perguntas que me constrangem, sabe? Aqui eles se dirigem a mim pelo meu nome, no Brasil, as pessoas parecem não entenderem e não compreenderem quando o assunto é alguma transsexual ou mulher trans. Temos diversas celebridades que são super respeitadas no mundo todo e no Brasil usam nomes artísticos. Qual a dificuldade entre chamar a pessoa pelo nome que ela se identifica? Não dá para entender”. Desabafou
A influenciadora nos contou que em breve irá lançar um conteúdo em seu Instagram com uma breve resenha falando sobre a retificação do seu nome e quais foram os maiores questionamentos que ela recebeu. Fiquem ligados no ig de Isabelli Potter @isabelli_potter e acompanhe todo conteúdo.