“Fome Fala” é uma série de ficção científica em formato de podcast cujo cenário se confunde num curso temporal não linear, indo das favelas até alguma paragem de um Brasil ainda não colonizado. Produzido pelo coletivo Rango de Classe, o podcast já conta com dois episódios lançados, e segue construindo sua temporada com novos capítulos no Spotify e no YouTube.
A série se passa numa quebrada fictícia povoada por deuses, onde dois parças, separados pela vida, buscam uma forma não convencional de voltarem a se encontrar. “Parafraseando Mano Brown: cada favelado é um Universo em crise. E em nossos universos, a fome fala. Como seres humanos que pensam, sentem, andam, têm suas necessidades físicas e espirituais e muitas outras coisas, a fome que nos bate não precisa ser literal. Podemos sentir fome de um bom rango, mas também de afeto, de presença, de liberdade, etc.”, comenta Nayê Ribeiro, comunicador e membro do coletivo. Os personagens relacionam-se entre o mundo real e o imaginário a partir de seus estômagos, que passam a funcionar como um portal no momento em que vão dormir. A fome é vista sob um amplo sentido: a fome de sonhos, de futuro, de relações, de saúde. Desse modo, o coletivo trabalha e produz um outro tipo de alimento: o cultural.
Os episódios são nomeados em referência ao grupo de rap Racionais MC’s. D’Ogum, um dos roteiristas da série, comenta: “Os Racionais MC’s tem um contexto social importante no Brasil para a periferia e os jovens negros. É uma grande referência, que formou parte do pensamento crítico não só do pessoal do coletivo como também de toda uma geração, de suas consciências racial e social, de seus estilos. Há uma máxima popular por aí que diz que, para toda situação da vida, existe uma frase deles que contextualiza o momento, e eu concordo.”
“”Fome Fala” é um projeto único porque tem uma narrativa que mistura a fantasia com a realidade da maioria das pessoas que vivem nas quebradas do Brasil afora. No episódio 3, por exemplo, nós acompanhamos os parças voltando no tempo lógico até a época da invasão europeia onde eles tentarão mudar o curso da história. Nesse percurso, acompanhamos também as reflexões que eles desenvolvem a partir de suas experiências de vida ao serem sugados para dentro de uma ampulheta. Eles são filósofos iguais aos que a gente conhece no nosso dia a dia”, diz Ronaldo, também roteirista da série.
A história foi criada, roteirizada e dirigida por Lincoln Péricles (Filme de Domingo, 2019), Ronaldo Dimer (Tempos de Cão, 2017) e D’Ogum (Monólogo da Fome, 2019; Do Banzo ao Orun, 2018), e foi contada pelas vozes de Jonnas Rosa – multiartista, produtor e educador – e Adriano Araújo – renomado ator de cinema – que assumem respectivamente os personagens Mano Tangente e Mano Tagarela. O artista e engenheiro de som Caue Gas foi responsável pela captação, edição e mixagem do programa, que conta com narração de Leticia Maria, cantora e multiartista, e participação especial de Francineide Bandeira, produtora executiva do Rango de Classe.
Seguindo a frase de Solano Trindade “É necessário buscar na fonte de origem e devolver ao povo em forma de arte”, Rango de Classe é um coletivo que nasce da reflexão política e pessoal do grupo sobre alimentação e qualidade de vida na periferia. “Existimos para pensar práticas difusoras de informações dentro das quebradas, para que possamos nos apropriar de nossas forças ancestrais longe das máquinas de produção que só nos tiram sem dar nada em troca”
Acompanhe os episódios no Spotify e YouTube: https://open.spotify.com/show/6LNh3Biv2zV6FEEsq7m3gy?si=c3ae1f6ff2274084 + https://www.youtube.com/@rangodeclasse