A evolução do garimpo para empresa de mineração

Diário Carioca

Foto: Divulgação/Brasil Mineral

‘A evolução do Garimpo para Empresa de Mineração’ foi o tema do segundo painel do último dia do 8º. Encontro da Média e Pequena Mineração e contou com a participação de Antenor Silva, Conselheiro de Administração da PA Gold e da Brasil Mineral, que atuou como moderador; Gilson Camboim, presidente na Coogavepe – Cooperativa dos Garimpeiros do Vale do Rio Peixoto; Antonio João Paes de Barros, geólogo da Metamat; Luis Mauro Gomes Ferreira, assessor da Diretoria Colegiada da ANM, Giorgio De Tomi, professor da Universidade de São Paulo e diretor do NAP e Pedro Eugenio Procopio Silva, diretor de Operações da Fênix DTVM. 

Gilson Camboim começou o painel dizendo que a atividade garimpeira não é extração ilegal, porque é uma atividade regulamentada pela legislação. “Temos que trabalhar nosso vocabulário para que a sociedade possa nos entender melhor”. A mineração de pequena escala e a atividade garimpeira, quando regulamentada na parte dos garimpos, é muito semelhante à mineração industrial, principalmente nos cumprimentos de recuperação de áreas, ESG, da parte de envolvimento com a sociedade. “O cooperativismo traz este cuidado com o ser humano, de envolver com as pessoas e possui o compromisso de extrair responsavelmente os bens minerais por não serem renováveis e para garantí-los para o benefício das gerações futuras”. Atualmente, na transição do garimpo para pequena mineração, a atividade tem sofrido critérios e exigências iguais aos da mineração industrial, porém, devido ao porte das minas frentes às PLGs – Permissão de Lavra Garimpeira – , elas parecem ser títulos sensíveis, mas têm licença ambiental e título minerário e são responsáveis por fazer o processo de extração, realizar o recolhimento tributário e o pós-operatório de mina, além da obrigação social. 

Ele disse que a Coogavepe atingiu já a produção de quatro toneladas de ouro anuais, tem sete mil cooperados e não realiza sondagem da área, mas um diagnóstico de todas as etapas de extração do ouro. Uma cooperativa de garimpeiros desenvolve trabalhos com escolas até os órgãos que fazem os processos de regulamentação, e já tem enquadrados os ODS. “Olhem pra o garimpo como mais um segmento do setor mineral e diferencie da extração ilegal, pois os garimpeiros podem ser os melhores parceiros na licença social”. 

Antonio João, da METAMAT, apresentou o Programa de Ordenamento e de Regularização da Atividade Garimpeira, voltado à pequena mineração no Mato Grosso. “Todo nosso trabalho nessa área se baseia no preceito legal de que o Estado favorecerá a atividade garimpeira em cooperativas, desde que sejam adotados preceitos de proteção do meio ambiente e promoção socioeconômica dos trabalhadores. “Essa questão dos territórios é fundamental para a regularização dos garimpos, pois irá garantir os direitos constitucionais dos garimpeiros e o estabelecimento de padrões de sustentabilidade social”. 

Hoje trabalhamos com uma proposta de lei para reconhecer os territórios garimpeiros em cidades do Mato Grosso (províncias de Alta Floresta, Baixada Cuiabana e Guaporé, onde predominam os requerimento e alvará de pesquisa). A respeito do regime de PLG, Antonio João disse que a atividade garimpeira atua sobre três pilares: aproveitamento imediato da jazida mineral para ser lavrada, independente de trabalhos prévios de pesquisa; aproveitamento de substâncias minerais garimpáveis e executadas em áreas estabelecidas para a atividade; e o terceiro pilar envolve minerais garimpáveis. “Aí, você vê que gera conflito com a lei (7.805/89), com prática exploratória, sendo fator de insegurança jurídica, porque deixa à margem da lei a maior parte dos garimpos na Amazônia, por exemplo”. 

No Mato Grosso, o programa desenvolvido visa resgatar a cultura das comunidades garimpeiras tradicionais, como forma de reconhecimento de território, criar cooperativas de garimpo representativas, estabelecendo protocolos, para promover a segurança jurídica, pacificar conflitos e promover sinergias (lavra garimpeira e pesquisa), e um Termo de Conciliação, que prevê propor instrumentos que permitam aos garimpeiros atuarem dentro da lei, sobretudo nas áreas tradicionais (licenciamento simplificado). “Mato Grosso tem 66% de áreas protegidas e apenas 33% são áreas com ocupação (agricultura), enquanto a mineração ocupa 103 mil hectares, algo em torno de 0,13% do território estadual”. Em relação à Rigidez Locacional, ele disse que é preciso um trabalho de interlocução com as ONGs e agências ambientais para que favoreçam a mineração e solucionar a incompatibilidade do Código Florestal com o Código de Mineração. 

Luís Mauro Gomes, da ANM, transmitiu o trabalho que a Agência faz para melhorar principalmente a pequena mineração. “Já tivemos reuniões participativas em todo o Brasil para entender o segmento e como atuam no mercado de mineração”. A mineração é vista como uma atividade que não é benvinda nos territórios pelos seus impactos, mas temos que trabalhar para que ela ganhe credibilidade e confiança da sociedade, algo que algumas empresas já conquistaram, para chegar definitivamente em um trabalho de cogestão mineração e comunidade. “A PLG não fica atrás, por causa da atividade intensa de extração ilegal do ouro, que não é garimpo, não é mineração, e acaba por ser pressionada por diversos atores da sociedade”, diz Gomes. 

“Dentro do universo que nós trabalhamos, já definimos domínios socioeconômicos, ambiental, tecnológico e de Governança e também dentro destes próprios domínios, os investimentos, uso de nível  de serviços e valores, taxas de consumo e padrões e extração, processos e tecnologias, tudo para melhorar e aprimorar as regras que vão dirigir esse regime. O principal déficit apontado é a falta de financiamento, o que só conseguiremos com maior conhecimento técnico da atividade executada. As questões de risco têm que ser trabalhadas para o aprimoramento da resolução”. Para a atividade garimpeira evoluir apara uma empresa de mineração, a ANM diz que é preciso agilizar o fluxo processual, incorporar informações relevantes para direcionar a regulação e outras obrigatoriedades da agência, estimular a formalização, estabelecer mecanismos eficazes de fiscalização e de rastreabilidade da cadeia produtiva, em especial do ouro, para evitar os aproveitadores. 

“Para liberar uma PLG, o fluxo demora 195 dias úteis sem considerar faixa de fronteira, mas queremos chegar a 120 dias. Dentre os pontos principais da nova resolução estão a atualização e delimitação dos depósitos garimpáveis e a conceituação de lavra simbólica com o objetivo de evitar que as lavras que não estejam dentro da lei não sejam trabalhadas”. Em relação ao georreferenciamento das frentes de lavra, cada uma deverá informar a produção e comercialização do produto da lavra, sendo que os dados sobre a lavra serão incorporados na apresentação do RAL pelo titular da PLG. Já a garantia de critérios técnicos na instrução de qualquer processo de outorga de lavra, renovação, etc, ampliará o grau de exigências de acordo com aspectos e impactos do projeto, que deverá ter obrigatoriamente um plano de lavra — com maiores ou menores exigências – dependendo dos riscos apresentados (barragens, uso de explosivos ou substâncias químicas perigosas no beneficiamento, lavra subterrânea ou lavra em corpos hídricos). 

Giorgio de Tomi, professor da USP e diretor do NAP, começou sua apresentação dizendo que as operações, na questão da localidade, são permitidas ou não, e no que se refere à documentação, ela é legal ou ilegal. “Se a atividade for proibida, é ilegal e não faz parte do painel. O negócio é com a Polícia Federal”. O foco de meu trabalho não é o tamanho, mas o que está lá em micro e pequena escala. É este pessoal que precisa de ajuda. 

A mineração em pequena escala detém atualmente 87% dos títulos minerários de lavra e cerca de 25% são de PLG de ouro, sendo que são mais de oito mil empresas. “É um setor importante, que produz aproximadamente 30 toneladas de ouro por ano de PLGs (ANM) do total estimado de 100 toneladas de ouro produzidas pelo Brasil anualmente, ou seja, 1/3, é PLG”. 

Uma solução apontada por De Tomi para solucionar este problema é a ferramenta PCRO (Procedimento de Compra Responsável de Ouro), desenvolvida em parceria pela USP e WWF, que faz o controle da origem do ouro. “É um sistema voltado para a PLG e que realiza a localização da mesma e faz um diagnóstico instantâneo da transação”. Para o comprador de ouro, a plataforma proporciona, por meio de uma análise automática de aptidão aos critérios mínimos do PCRO, a verificação eficaz do risco de não conformidade do ouro que pretende adquirir. Além disso, a ferramenta oferece também a alternativa de solicitar aos técnicos da plataforma análises mais completas para os demais níveis de conformidade. Já para o produtor de ouro, a plataforma permite a definição clara de um caminho a ser seguido para uma extração mineral responsável. A ferramenta colabora com o produtor, evidenciando operações responsáveis de extração ou mesmo permitindo uma análise e direcionamento técnico para aumentar seu potencial de conformidade com o PCRO. “Por outro lado, o técnico que opera a plataforma tem uma definição clara e objetiva de dados relevantes para análise de risco de não conformidade da produção de ouro, centralizando o acesso instantâneo a todos os dados essenciais de análise numa única plataforma, incluindo informações dos processos ANM, imagens de satélite, tributação, licenciamento e informações geográficas, todas em um só lugar”, diz De Tomi. 

Para concluir, o professor disse que a mineração precisa aprimorar os mecanismos de comércio de ouro responsável, fortalecer órgãos e instituições, encorajar mecanismos de autorregulação e de transparência nas operações, premiar mineradores que comprovem a origem responsável do metal e expandir o extensionismo mineral para Governança, gestão e compliance. “A gente precisa transformar esse setor”. 

Pedro Eugênio, da DTVM, empresa que atua na comercialização de ouro de PLGs, disse que “ao longo do caminho, a instituição financeira que está fazendo a primeira aquisição de ouro tem que se sentir parte e atuar ativamente em prol de uma mineração artesanal mais responsável”. 

Para fazer isso, Pedro Eugenio diz que a primeira medida é certificar e diagnosticar a origem mineral, saber onde ele está inserido, quais os processos produtivos e a capacidade de produção, relacionamento com ambiente/sociedade/trabalho, manejo de resíduos e rejeitos e a classificação de fornecedores. O segundo ponto é a rastreabilidade do ouro, da origem até o final, e com o emprego de blockchain, autenticidade de dados, geolocalização. “O blockchain são blocos de informações que protegem os dados e a impossibilidade de serem mudados ao longo da cadeia, mas isto não garante que o ouro não esteja sendo esquentado na lavra garimpeira”. 

Outra prática é o monitoramento e as boas práticas de mercado, onde se consegue monitorar as operações, implementar um canal aberto de denúncias, aplicação de tecnologia e softwares e uma compliance atuante. “Isto tudo nos leva a um estímulo de originação responsável do ouro, em que ajudamos o minerador a assumir boas práticas de processo produtivo, através de incentivo financeiro ou por transmissão de cultura positiva”. Tais incentivos financeiros são buscados no mercado e a Fênix procurou a suíça SBGI, uma iniciativa que estimula negociações responsáveis e certificam as práticas de minerações de pequeno porte. “Hoje já temos quatro minas implantadas com a cerificação suíça com bônus gerado, que propicionou a aquisição de um equipamento canadense para eliminar o mercúrio do processo produtivo dentro da baixada Cuiabana”. 

Para Pedro Eugenio, a mineração de pequena e média escala é uma atividade essencial, que precisa ser incentivada no que diz respeito a processos produtivos e práticas ESG, além da criação de programas para mudar o papel da cadeia produtiva, o que faz a pequena mineração ser possível. Finalizando, ele informou que Nota Fiscal eletrônica entra em vigor na próxima semana e que “já fizemos todos os testes previstos. Parabéns à Receita Federal, que a viabilizou rapidamente”. 

Fechando o painel, o moderador, Antenor Silva Júnior, disse que o segmento de extração de ouro precisa abandonar definitivamente o uso do mercúrio, sob pena de sofrer sanções internacionais e até ter impedida a comercialização do metal.

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