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domingo, novembro 24, 2024

A luta diária contra a fome na Amazônia: como a insegurança alimentar afeta a região

EconomiaA luta diária contra a fome na Amazônia: como a insegurança alimentar afeta a região

A Amazônia, conhecida pela sua exuberante biodiversidade, também enfrenta uma dura realidade quando se trata de fome e insegurança alimentar. Segundo especialistas, a região tem sido invadida pelo capital financeiro, que centraliza os recursos naturais e impede a circulação de alimentos da floresta que historicamente era de acesso coletivo.

De acordo com a professora universitária Márcia Oliveira, apesar de sua riqueza natural, cada vez mais a Amazônia vem sendo invadida pelo capital financeiro que centraliza os recursos naturais e não permite a circulação de alimentos da floresta que historicamente era de acesso coletivo.

“As populações ribeirinhas, por exemplo, cada vez mais tem dificuldade de acesso ao território de várzea onde cultiva diversos alimentos para alimentação de boa parte do ano (abóbora/jerimum, batatas diversas, macaxeira/farinha, feijão de praia, cheiro verde, melancia, milho…). Com a dificuldade de plantar as várzeas, os ribeirinhos reduzem a alimentação ao pescado que está cada vez mais reduzido e contaminado; os camponeses de terra firme (seringueiros, quilombolas e outras comunidades tradicionais) há anos enfrentam conflitos socioambientais na disputa pelos alimentos da floresta (açaí, castanha, bacaba, buriti, tucumã, jatobá…). Logo, o grande capital vem se apoderando dos territórios e expulsando as populações locais, impedindo seu acesso aos alimentos coletados em escala industrial para servir ao mercado”, diz.

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Nesse cenário, a professora ainda ressalta que a produção de subsistência está cada vez mais ameaçada. “O incentivo à agricultura familiar em pequenos territórios desapareceu nos últimos anos. Muitos camponeses produzem, mas, não tem condições de escoar alimentos como banana, abacaxi, cupuaçu, caju…”, salienta.

Nesse cenário, Dom Ionilton, Bispo da Prelazia de Itacoatiara, traz à tona a temática da Campanha da Fraternidade de 2023. “O texto base da CF 2023 aponta que as causas da fome estão relacionadas à questão da estrutura fundiária do Brasil. Isso porque nosso território nacional, desde que os europeus chegaram, passou a fazer uma organização fundiária muito desigual, pouca gente com muita terra e muita gente com nenhuma ou pouca terra. Isso gera um problema, inclusive sobre a geração de alimento do campo para a cidade porque, se não tem quem trabalhe na terra, quem vai produzir o alimento? Então, essa questão da estrutura fundiária é um problema”, diz.

Em outra esfera, Carlos Alberto, professor da Universidade Federal de Roraima (UFRR), fala sobre a relação entre as mudanças climáticas e a insegurança alimentar. “As mudanças climáticas têm um impacto significativo na segurança alimentar em todo o mundo. As alterações nos padrões climáticos, como secas prolongadas, inundações, frio intenso, calor intenso e outros eventos extremos, afetam a produção e a disponibilidade de alimentos. Além disso, as mudanças climáticas podem levar à degradação do solo, a perda de biodiversidade, e outros impactos negativos na agricultura”, traduz.

De acordo com o especialista, as alterações climáticas possuem a capacidade de agravar a insegurança alimentar, sobretudo em regiões vulneráveis como as nações em desenvolvimento e comunidades rurais. A diminuição na produção de alimentos acarreta no aumento de preços e na redução da disponibilidade, resultando em fome e desnutrição.

Segundo o Sistema de Informações e Análises sobre Impactos das Mudanças Climáticas (Adapta Brasil), mais da metade dos municípios da Amazônia Legal não possuem condições e estruturas mínimas para enfrentar as consequências da crise. Para o professor, as mudanças climáticas têm afetado de maneira significativa a produção e a disponibilidade de alimentos na região, com eventos extremos como secas prolongadas, grandes queimadas, chuvas intensas e inundações, que prejudicam a agricultura e a pecuária. 

“Nesse contexto, a falta de condições e estruturas mínimas nos municípios da Amazônia Legal para enfrentar as consequências da crise climática, como a falta de acesso à água potável, energia elétrica e saneamento básico, amplia a vulnerabilidade das comunidades locais. Isso porque essas condições são essenciais para garantir a segurança alimentar, o acesso a alimentos saudáveis e para a promoção de práticas agrícolas sustentáveis”, explica. 

Ainda dentro da Amazônia, Carlos Alberto justifica que o aumento da fome na região amazônica é um problema amplamente discutido em nível nacional e internacional devido a diversas variantes, como a questão fundiária. “A insegurança alimentar grave tem crescido em todo o território nacional, afetando populações rurais da Amazônia. Agricultores familiares, ribeirinhos, quilombolas e indígenas, que já possuem uma elevada condição de pobreza (algo que necessita de uma visão mais localizada, pois muitas vezes o que os índices sociais apontam como pobreza, na verdade são modos de vida distintos daqueles das áreas urbanas de uma cultura ocidentalizada)”.

O professor universitário explica que a fome e a insegurança alimentar não estão diretamente relacionadas à produção de alimentos. “Os pequenos agricultores, muitas vezes, não conseguem produzir o suficiente para suprir suas próprias necessidades devido a vários fatores, como falta de acesso a recursos, extremos climáticos, condições de mercado desfavoráveis e outros”.

Por fim, ele relembra que a insegurança alimentar é uma vertente que vai muito além da quantidade de comida. “É importante destacar também que a insegurança alimentar não é apenas uma questão de quantidade de alimentos, mas também de qualidade e diversidade nutricional. Os agricultores familiares, muitas vezes, têm uma dieta limitada e monótona, com pouca variedade de alimentos e nutrientes essenciais, o que pode levar a problemas de saúde e nutricionais a longo prazo, especialmente aqueles agricultores que se transformaram em trabalhadores para o capital e precisam se especializar em uma, duas ou três culturas diferentes e vendem tudo para o mercado, perdendo, dessa forma, toda a diversidade alimentar que era algo tradicional da agricultura de base familiar”, finaliza.

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