Psicanalista fala da relação entre economia e moralidade: “Não se negocia com vidas”

Diário Carioca

As tentativas de minimizar a gravidade da pandemia de coronavírus e de impedir medidas para combater a disseminação da doença refletem um “raciocínio contábil da biopolítica”, de acordo com o psicanalista Christian Dunker. A ideia de que algumas pessoas podem morrer em nome da economia apareceu em falas de lideranças religiosas, empresários e do próprio presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), nas últimas semanas.

Em entrevista por videoconferência ao Brasil de Fato, Dunker caracterizou essa visão como uma “obscenidade”. Ele questionou a separação entre economia e moralidade e disse que, se uma única vida estivesse em jogo, deveria ser mobilizado todo o esforço possível para salvá-la. “Não se pode negociar, transgredir com a contabilidade de vidas”, afirmou.

Dunker é professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) e mantém um canal no Youtube onde debate psicanálise e temas da atualidade com um público mais amplo. Diante da crise vivida pela humanidade atualmente, ele refletiu sobre a relação das pessoas com o tempo, com a produção e com o dinheiro e também sobre as transformações nas relações humanas e na dinâmica da sociedade que devem vir desse momento.

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A expectativa de Dunker é de que possa haver uma “deflação narcísica”, ou seja, que as pretensões individuais possam ser relativizadas e reduzidas para que sejam ampliados o valor do outro e a solidariedade. Ele comentou ainda como lidar com a ansiedade e o medo diante da incerteza da doença e do isolamento e ressaltou que não faz sentido elevar a cobrança por produtividade.

Ele defendeu que os indivíduos trabalhem para ampliar a tolerância consigo e com os outros. Para o professor, a dificuldade relatada por muitas famílias de conseguirem manter seus idosos em casa acontece porque o apego com o cotidiano “garante que vai haver um próximo capítulo”. 

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Por fim, o professor propôs que o momento sirva para uma repactuação social e que permita uma reflexão que traga a possibilidade de transformação individual, do mundo e da natureza. E estabeleceu um paralelo entre o momento atual e o de uma guerra para comentar a quebra na noção de normalidade e a criação de narrativas sobre o valor dos pequenos gestos. “Isso de estar diante da finitude da morte, da perda das coisas que são mais preciosas não acontece toda hora. Acontece talvez uma vez na vida”, completou.

Confira:

Edição: Rodrigo Chagas


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