Ao contrário de outros tribunais da cúpula do Judiciário brasileiro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não tem membros vitalícios. A Corte, que será responsável por julgar Jair Bolsonaro (PL) pelas acusações de crimes eleitorais cometidos por ocasião da exposição contra as urnas eletrônicas para embaixadores, tem regras especiais de composição estabelecidas pela Constituição.
O TSE, de acordo com o texto constitucional, deve ser composto por ao menos sete membros titulares. A maior parte deles oriundos de outros tribunais superiores. Dos sete, três devem ser integrantes do Supremo Tribunal Federal, eleitos em voto secreto pelo integrantes do próprio STF. Outros dois são do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), escolhidos em procedimento igual ao do Supremo. As duas vagas restantes são escolhidos pelo Presidente da República a partir de duas listas tríplices com nomes de advogados e elaboradas também pelo STF.
Cada integrante do TSE tem um mandato de dois anos. Os juízes vindos do STF e da advocacia podem ser reconduzidos para mais um mandato de mesmo período. Além disso, a presidência e a vice-presidência do Tribunal Eleitoral devem ser ocupadas por magistrados oriundos do Supremo. Já o cargo de corregedor-geral eleitoral necessariamente deve ser preenchido por um juiz vindo do STJ.
Devido à importância e impacto do julgamento a que Bolsonaro é submetido, cujo resultado final pode torná-lo inelegível por oito anos, a expectativa é de que o julgamento seja conduzido pela integralidade dos membros titulares.
Alexandre de Moraes (Presidente)
Talvez o mais famoso integrante do TSE por conta de sua atuação durante o período eleitoral de 2022, Moraes está em seu segundo período de dois anos como membro do Tribunal, encerrando sua participação na Corte em 2024. Como presidente do colegiado, o magistrado tomou decisões rápidas no curso da disputa presidencial. Exemplos foram a intimação do então diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), para que abordagens nas estradas fossem imediatamente interrompidas, e a rejeição imediata de argumentos da chapa de Jair Bolsonaro (PL) sobre supostas irregularidades na inserção de propaganda eleitoral em rádios.
Outro elemento importante que pode ter peso no julgamento é o fato de que Moraes, como presidente do TSE e condutor de inquéritos no STF, é um dos alvos preferenciais de grupos bolsonaristas.
Cármen Lúcia (Vice-presidente)
Também vinda do STF, Carmen Lúcia foi empossada como vice-presidente do TSE há quatro semanas. A magistrada é conhecida por manter um perfil relativamente mais contido no debate público. Recentemente, enviou investigações contra Bolsonaro fora do âmbito eleitoral para instâncias inferiores, contrariando e leitura de Moraes de que elas deveriam permanecer no próprio Supremo.
No âmbito eleitoral, por outro lado, Carmen Lúcia se envolveu em uma polêmica jurídica que é tida como relevante entre aqueles que tentam fazer projeções sobre o resultado no julgamento do ex-presidente no TSE. Nem tanto pelo seu próprio posicionamento, mas pelo contraste com outro integrante da Corte Eleitoral. A magistrada rejeitou pedidos da chapa bolsonarista para que fossem excluídas inserções da campanha petista que qualificam o então presidente como “genocida”. Na ocasião, entendeu que deveria prevalecer a liberdade de expressão no debate eleitoral.
Kássio Nunes Marques
Terceiro titular do TSE a vir do STF, Nunes Marques foi o último destes a ingressar na Corte Eleitoral. Nunes Marques é visto como bastante leal àquele que o indicou ao Supremo: Jair Bolsonaro. O magistrado é conhecido por ter derrubado, sozinho, uma decisão do TSE que cassou o então deputado estadual Fernando Francischini, um dos principais aliados de Bolsonaro no Paraná. Marques também foi um dos votos no STF para manter o indulto do ex-presidente ao ex-deputado federal Daniel Silveira, outro dos mais extremistas a pertencer ao entorno de Bolsonaro e recentemente envolvido em investigações sobre a suspeita de tentativa de articulação de um golpe de Estado.
Benedito Gonçalves (Corregedor-Geral Eleitoral)
Integrante do TSE pelo Superior Tribunal de Justiça, Benedito Gonçalves será responsável por iniciar os votos no julgamento, enquanto Corregedor-Geral Eleitoral. O magistrado, há décadas no STJ, sempre figura em listas de possíveis nomes a serem indicados ao STF. Na figura de Corregedor, Gonçalves foi o responsável por elaborar o relatório e o voto que seriam seguidos pelo restante do TSE no caso que levou à cassação de Deltan Dallagnol.
Além de ter recebido o pedido do PDT que criou o processo pelo qual Bolsonaro é agora julgado, Gonçalves já acatou um outro pedido no curso do procedimento que desfavorece a chapa bolsonarista: a inclusão da chamada “minuta do golpe” como elemento de prova, no sentido de que o documento reforçaria o argumento de que o ataque às urnas eletrônicas fazia parte da plataforma política de Bolsonaro.
Raul Araújo
Também oriundo do STJ, Raul Araújo é visto como o integrante do TSE mais próximo do bolsonarismo, apesar de ter chegado ao Superior Tribunal de Justiça por indicação de Luiz Inácio Lula da Silva. Um dos exemplo desta suposta proximidade foram decisões suas que suspenderam propaganda que chamava Bolsonaro de “genocida” – a divergência com Carmen Lúcia – e que chegaram até a intervir no festival musical Lollapalooza, restringindo a manifestação de artistas. Além disso, anteriormente rejeitou um pedido para que a chapa bolsonarista fosse investigada pelo uso de recursos públicos, dos fundos partidário e eleitoral, para o financiamento de caravanas para participantes de atos no Sete de Setembro.
As posições de Araújo, e seu contraste com Carmen Lúcia, levaram o TSE a transferir julgamentos sobre propaganda eleitoral para o Plenário, uniformizando as decisões. A grande dúvida é se a postura do magistrado, vista como uma forma de blindagem a Bolsonaro, eram ocasionais ou mais profundas.
Floriano Azevedo e André Ramos Tavares
Os mais novos integrantes do TSE chegaram ao órgão como juristas indicados pela Presidência da República. Os dois são professores da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, mesmo estabelecimento no qual leciona Moraes. Este último foi o “padrinho” e principal defensor da indicação de ambos à Corte, processo que contou com o abandono de tradições informais do Tribunal Eleitoral, como a indicação de ministros substitutos ao cargo de titulares.
Azevedo, que chegou a ser diretor da Faculdade de Direito, foi um dos principais articuladores da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito, documento político que saiu em defesa do sistema eleitoral brasileiro justamente após a famosa reunião de Bolsonaro com os embaixadores.
Por serem novidades no órgão, há poucos elementos para tentar prever o posicionamento de cada um deles sobre o caso. Espera-se, entretanto, que possivelmente estejam alinhados a Moraes.
Edição: Rodrigo Durão Coelho