Gaza: bombardeios e ordens de evacuação restringem gravemente o acesso à saúde

Diário Carioca
A médica Fida Atiyya al-Girshalli presta serviço médico para os palestinos que vivem em tendas depois de serem deslocados da cidade de Shujaiyye para Rafah, enquanto tentam continuar suas vidas sob condições adversas em meio a ataques israelenses em Rafah, Gaza, em 09 de janeiro de 2024 [Abed Zagout/Anadolu Agency]

Nos últimos três meses, o ataque massivo das forças israelenses na Faixa de Gaza diminuiu drasticamente as opções de acesso a cuidados médicos. O espaço seguro disponível para as organizações fornecerem atendimento às pessoas é praticamente inexistente agora. Ordens de evacuação constantes e ataques contra instalações de saúde forçaram repetidamente organizações como Médicos Sem Fronteiras (MSF) a evacuar hospitais e a deixar os pacientes para trás.

“Estamos gradualmente sendo encurralados em um espaço muito restrito no Sul de Gaza, em Rafah, com opções cada vez menores para oferecer assistência médica essencial, enquanto as necessidades estão crescendo de forma desesperadora”, diz Thomas Lauvin, coordenador do projeto de MSF em Gaza. “À medida que o ataque contra Gaza progrediu, tivemos que evacuar várias instalações de saúde no Norte de Gaza, depois na Área Central.”

“Hoje, estamos limitados a trabalhar principalmente no Sul, porque não podemos atuar em outro lugar”, continua Lauvin. “Em suma, estamos ficando sem hospitais. Somos forçados a deixar os pacientes para trás.”

O sistema de saúde em Gaza praticamente entrou em colapso. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), apenas 13 dos 36 hospitais de Gaza ainda estão parcialmente funcionais: nove no Sul e quatro no Norte. Os dois principais hospitais no Sul de Gaza estão operando com o triplo de sua capacidade de leitos e estão ficando sem suprimentos básicos e combustível.

Em 6 de janeiro, as equipes de MSF foram forçadas a evacuar um hospital novamente. Nossas equipes deixaram o hospital de Al-Aqsa, na Área Central de Gaza, depois que as forças israelenses emitiram ordens de evacuação para os bairros ao redor da instalação de saúde. Essa evacuação forçada restringiu o acesso à nossa própria farmácia, demonstrando a deterioração do ambiente para atividades médicas.

“Deixar o hospital de Al-Aqsa e nossos pacientes foi uma decisão devastadora e nosso último recurso”, diz Enrico Vallaperta, referente médico do projeto de MSF em Gaza. “Ataques de drones, disparos de franco-atiradores e bombardeios nas proximidades do hospital tornaram o espaço muito inseguro para se trabalhar. As condições voláteis nos deixam impossibilitados; praticamente não há espaço seguro para fornecer cuidados médicos mínimos às pessoas”.

As instalações médicas e as áreas ao redor têm sido repetidamente atingidas pelas forças israelenses e submetidas a ordens de evacuação em diferentes partes de Gaza, particularmente no Norte, tornando o acesso à saúde e o fornecimento de cuidados médicos muito perigoso.

Muitos hospitais onde MSF estava trabalhando passaram por essa situação. O hospital Indonésio, no Norte de Gaza, precisou ser evacuado em outubro. Em novembro, o hospital Al-Shifa, o maior de Gaza, foi atingido e os profissionais foram forçados a evacuar do local. Depois, o hospital Al Awda, com o qual MSF tem parceria desde 2018, foi atingido; três médicos, dois deles da nossa equipe, foram mortos.

Agora, esse padrão está se repetindo no Sul, que abriga cinco vezes mais pessoas do que antes da guerra. Em contrapartida, há menos lugares para fornecer cuidados de saúde às pessoas.

O Sul de Gaza tem sido alvo de intensos bombardeios desde que a trégua de novembro terminou. As necessidades de cuidados de emergência, cirúrgicos e pós-operatórios são enormes na região. A falta de capacidade hospitalar está privando os pacientes de tratamento adequado e condições higiênicas apropriadas, o que resulta em um número crescente de ferimentos com infecções e procedimentos médicos realizados em condições extremas. Além dos ferimentos graves, muitas mulheres que foram submetidas à cesariana recebem alta apenas seis horas após o parto para disponibilizar espaço para outras gestantes. Algumas simplesmente não conseguem ser atendidas e dão à luz em tendas.

MSF continua comprometida em fornecer cuidados médicos em Gaza e pede a proteção de hospitais, equipes médicas e pacientes. Nossas equipes estão atualmente fornecendo cuidados pré e pós-parto no hospital dos Emirados em Rafah, dando assistência aos habitantes de Gaza com fisioterapia e cuidados pós-operatórios no Hospital de Campanha Indonésio de Rafah, além de fornecer consultas de cuidados de saúde primária, curativos e apoio de saúde mental na clínica de Al-Shaboura, também em Rafah.

Estamos apoiando o hospital Europeu de Gaza, oferecendo uma pequena capacidade cirúrgica para a unidade de saúde. Nossa pequena equipe de enfermeiros ainda atende pacientes que precisam de curativos. Em Al Awda, no Norte de Gaza, e no hospital Nasser, em Khan Younis, alguns profissionais de MSF estão trabalhando em condições extremamente difíceis, incluindo falta de alimentos e suprimentos médicos devido a ataques aéreos e conflitos nas proximidades.

Reiteramos nosso apelo por um cessar-fogo imediato para poupar a vida de civis, restaurar o fluxo de assistência humanitária e restabelecer o sistema de saúde, do qual depende a sobrevivência da população de Gaza

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Equipe de jornalistas, colaboradores e estagiários do Jornal DC - Diário Carioca