A Igreja Anglicana da África Austral (ACSA) reconheceu Israel como Estado de apartheid, em declaração oficial que contradiz a postura do arcebispo de Canterbury, Justin Welby, sobre a matéria e corrobora denúncias da comunidade internacional de direitos humanos.
Em setembro, durante evento da comunhão anglicana global, Welby se recusou a descrever a ocupação israelense como regime de apartheid
“Como gente de fé que se sensibiliza pela dolorosa ocupação da Cisjordânia e Gaza, e que guarda esperanças de paz, justiça e segurança para israelenses e palestinos, não podemos continuar ignorando a realidade em campo”, declarou o arcebispo anglicano da Cidade do Cabo, Thabo Makgoba.
“Nosso coração chora por nossos irmãos e irmãs cristãos na Palestina, incluindo anglicanos cujos números rapidamente caem”, acrescentou o arcebispo. “Pessoas de todas as crenças na África do Sul têm profunda compreensão do que é viver sob opressão e experiência em como confrontar e superar a injustiça por meios pacíficos”.
“Quando negros sul-africanos que viveram sob apartheid visitam Israel, os paralelos a nossa dor são impossíveis de ignorar”, destacou Makgoba. “Se lavamos as mãos, somos cúmplices da contínua opressão contra o povo palestino”.
Makgoba reforçou apelos para que Israel dê fim à “ocupação em Gaza e na Cisjordânia e reconheça plenamente o direito palestino inalienável a sua autodeterminação”.
A ACSA reúne quatro milhões de cristãos da África do Sul e quatro outros países na porção austral do continente. A organização, que já foi chefiada pelo falecido arcebispo Desmond Tutu, celebrado com o Prêmio Nobel da Paz, teve protagonismo na luta contra o apartheid sul-africano entre 1948 e início da década de 1990.
Três anos atrás, a ACSA expressou seu apoio à campanha de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra Israel, embora sem formalizar até então sua designação do Estado ocupante como regime de apartheid.
A demora decorreu de um intenso lobby da Igreja Anglicana, sediada no Reino Unido.
Ao declarar seu apoio ao movimento de boicote, a ACSA insistiu, porém, que sua história denota “responsabilidade extraordinária dos sul-africanos em defender os oprimidos, da mesma maneira que outros na comunidade internacional os defenderam da opressão”.
Makgoba parece desafiar declarações recentes do chefe de sua igreja — o arcebispo londrino.
“Prefiro não usar a palavra apartheid porque o regime de apartheid na África do Sul — e conheci Desmond Tutu e ouvi o que tinha a dizer — estava imbuído no próprio tecido da constituição”, argumentou Welby.
Tutu, porém, era um notório ativista contra o racismo, tanto na África do Sul quanto em todo o mundo. Sobre Israel e a ocupação imposta sobre o povo palestino, Tutu tinha convicção de se tratar de um regime de apartheid.
Israel não tem constituição escrita, o que demonstra a fragilidade da alegação de Welby. Todavia, tem dezenas de leis racistas que discriminam entre palestinos nativos e colonos judeus, além de práticas flagrantes de apartheid, como discriminação de serviços, ruas e estradas exclusivas, perseguição política, entre outras.
Do MEMO