Defesas aéreas iranianas abateram três drones de pequeno porte que sobrevoavam a cidade de Isfahan, no centro do país, reportou a mídia estatal nesta sexta-feira (19), horas após a imprensa dos Estados Unidos citar oficiais anônimos admitindo disparos de Israel.
A televisão iraniana confirmou explosões em Isfahan, porém sem danos.
Voos foram suspensos no país por quatro horas e meia, incluindo sobre a capital Teerã.
Segundo o brigadeiro-general Siavash Mihandoust, comandante máximo de Isfahan, baterias de defesa aérea atingiram “um objeto suspeito”, impedindo danos.
As redes americanas ABC e CBS corroboraram relatos de uma operação israelense.
De acordo com o ministro de Relações Exteriores da Itália, Antonio Tajani, Washington afirmou a chanceleres do chamado Grupo dos Sete (G7) que Israel lhes informou “de última hora” sobre o ataque. “Sem detalhes, mera informação”, reiterou Tajani a jornalistas em Capri, na Itália.
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Na mesma ocasião, porém, o secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, recusou-se a confirmar os relatos de uma operação israelense. “Não vou falar sobre isso, exceto ao dizer que os Estados Unidos não estão envolvidos em qualquer operação ofensiva”.
Blinken alegou que o foco do G7 é na “desescalada”. Questionado sobre o relacionamento entre ambos os aliados, o ministro americano insistiu que Tel Aviv “toma suas próprias decisões”, mas que a Casa Branca continua comprometida com sua “segurança”.
Contenção e escalada
Segundo Dorsa Jabbari, correspondente da Al Jazeera em Teerã, a mídia local buscou minimizar o incidente até então, inclusive ao negar disparos externos.
O ministro de Relações Exteriores, Mohammad Javad Zarif, condenou os “imprudentes fogos de artifício” lançados contra Isfahan e instou líderes globais a manterem enfoque nas “violações de Israel em Gaza”.
Em nota no Twitter, o chanceler iraniano reiterou esforços para desviar atenção. “Um genocídio segue em Gaza”, observou.
Javad Zarif criticou também o veto de Washington a uma resolução do Conselho de Segurança para permitir a filiação plena do Estado palestino nas Nações Unidas, ao indicar “um claro passo na direção errada”.
Segundo analistas, a natureza limitada das ações demonstra falta de apetite das partes por uma maior escalada.
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“Ambos os lados parecem, no momento, buscar sair do ciclo escalatório”, relatou Julien Barnes-Dacey, diretor do programa de Oriente Médio do Conselho Europeu de Relações Exteriores, em conversa com a rede AFP. “Por ora, nenhum lado quer uma guerra aberta”.
“Podemos enfatizar o escopo quase simétrico entre os ataques”, corroborou Hasni Abidi, diretor do Centro de Estudos e Pesquisa sobre Mundo Árabe e Mediterrâneo em Genebra. “Indicativos objetivos nos mostram que, para os iranianos, é assunto encerrado e que Teerã, mais do que Tel Aviv, não tem interesse em seguir com as tensões”.
Uma fábrica militar em Isfahan foi atacada por drones semelhantes em janeiro de 2023, todavia, sem danos à instalação, protegida por baterias aéreas e uma malha de ferro sobre o telhado, a fim de conter eventuais veículos não-tripulados.
O Irã responsabilizou o Mossad, agência de espionagem israelense, pelo ataque e deteve quatro pessoas — uma delas executada em janeiro seguinte.
No último sábado, 13 de abril, o Irã lançou um ataque inédito ao Estado colonial israelense, com uma bateria de mísseis e drones interceptados pelo sistema Domo de Ferro e aliados, conforme aviso prévio de 72 horas.
A operação foi resposta a um bombardeio israelense ao consulado do Irã em Damasco, na Síria, em 1° de abril, que matou dois generais da Guarda Revolucionária.
Governos de todo o mundo pediram comedimento das partes para desescalar tensões. A Casa Branca alegou que não participaria de uma eventual retaliação israelense.
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Isfahan é considerada um centro de importância estratégica, incluindo bases militares. A cidade vizinha de Natanz abriga uma das principais instalações de enriquecimento nuclear do país.
Em discurso realizado em Damghan, no centro do país, o presidente iraniano Ebrahim Raisi não mencionou o incidente em Isfahan, mas enalteceu os disparos a Israel, ao destacar que deram a suas forças uma imagem de “força e união”.
Kioumars Heydari, comandante-chefe das forças de infantaria do Irã, enfatizou que suas tropas permanecem vigilantes sobre quaisquer ameaças aéreas em potencial. “Caso objetos suspeitos surjam no céu, serão abatidos por nossas defesas”, alertou Heydari à mídia estatal.
‘Sem danos’ aos sítios nucleares
A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) informou “não haver danos” às instalações nucleares do Irã. Rafael Grossi, chefe da agência das Nações Unidas, entretanto, reforçou apelos por moderação, ao advertir que sítios nucleares jamais devem ser alvos.
Segundo Ali Ahmadi, perito iraniano de controle de armas, a retaliação “foi muito mais limitada do que muitos esperavam”, de maneira que Israel “possui muito mais limitações em seu alcance operacional do que muitos pensam”.
“Certamente, após a capacidade retaliatória do Irã ser criticada, faz bem divulgar a ineficácia da resposta de Israel”, explicou Ahmadi. “O Irã também precisa preparar o público para uma reação muito mais leve do que vem sendo falado nos últimos dias”.
De acordo com Ahmadi, antes do incidente em Isfanhan, Teerã preparava alternativas para uma retaliação de massa, incluindo o envolvimento de aliados.
Todavia, ao considerar o escopo e o impacto limitado da suposta ação — que preferiu descrever como “sabotagem” em vez de “ataque” —, seria um erro conduzir uma tréplica.
Não obstante, relatos de explosões também chegaram do Iraque e da Síria.
A mídia estatal síria citou fontes de inteligência ao alegar que mísseis causaram danos materiais a instalações de defesa aérea no sul do país. Apesar de não conceder detalhes, seja sobre a área atingida ou a dimensão dos danos, Damasco culpou Israel.
Israel tampouco assumiu responsabilidade pela série de incidentes, embora mantenha disparos cotidianos contra toda a região, incluindo Líbano, Síria, Iraque e Iêmen — países onde Teerã têm influência estratégica sobre grupos aliados também armados.
Nesta quinta-feira (18), António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, pintou um retrato sinistro sobre a conjuntura, ao preconizar o risco de um “conflito regional de larga escala”.
“O Oriente Médio está à beira do precipício”, lamentou Guterres ao Conselho de Segurança. “Os últimos dias vivenciaram uma perigosa escalada — tanto em palavras quanto em ações”.
“Um único erro de cálculo, uma única falha de comunicação, um único engano — pode levar ao impensável, um conflito regional de larga escala devastador a todos os envolvidos”, acrescentou o diplomata.
A escalada de tensões sucede 180 dias de genocídio israelense contra a Faixa de Gaza, deixando 34.012 palestinos mortos e 76.833 feridos, além de dois milhões de desabrigados e milhares de desaparecidos sob os escombros. Entre as fatalidades, ao menos 13.800 são crianças.