O número de casos de contaminação pelo novo coronavírus na Nicarágua é questionado pela imprensa desde o início da pandemia. Enquanto o Ministério da Saúde diz ter registrado pouco mais de mil casos e 46 mortes, a organização não governamental (ONG) Observatório Cidadão contabiliza mais de 4 mil casos e 887 mortes.
Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que “não estabeleceu, e nunca estabelecerá, nenhum tipo de quarentena”.
Na última segunda-feira (1º), um documento assinado por 35 associações médicas qualificou como dramática a situação na Nicarágua e convocou a população a fazer uma quarentena voluntária durante pelo menos três ou quatro semanas. O documento recebeu o apoio de entidades como o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh), o Conselho Superior da Empresa Privada (Cosep) e a Aliança Cívica pela Justiça e Democracia.
“Infelizmente, não vemos uma gestão responsável dessa pandemia por parte do regime e não devemos esperar ações nesse sentido. Tudo o que estamos experimentando na Nicarágua é o resultado da negligência de um regime insensível à dor e ao sofrimento do povo”, afirma a Aliança Cívica pela Justiça e Democracia, entidade composta por estudantes, camponeses, acadêmicos e representantes sociedade civil e de empresas privadas.
O Centro Nicaraguense de Direitos Humanos divulgou comunicado em que lista as “irresponsabilidades do regime de Daniel Ortega e Rosario Murillo (esposa de Ortega e vice-presidente do país) frente à covid-19”. O texto diz que, desde o início da pandemia, Ortega, “em vez de impedir a propagação da doença, invoca marchas massivas, mobiliza trabalhadores do estado e pessoal de saúde para fazer palestras e visitas domiciliares sem a menor proteção. Além disso, eles promovem todos os tipos de atividades turísticas, tradicionais, esportivas e escolares. E assediam, agridem pessoas que tomam medidas individuais, como usar máscaras, álcool em gel, luvas e outros produtos de higiene”.
O governo nicaraguense afirma que a pandemia está sob controle no país e rejeita a adoção de medidas como o fechamento do comércio, por considerar que isso prejudicaria a economia. As autoridades locais dizem ainda que “as pessoas provenientes de países com risco de transmissão estabelecido pela OMS [Organização Mundial de Saúde] e sem sintomatologia, não terão nenhuma restrição em sua mobilidade ou deslocamento no país”.
Ontem (2), durante o informe semanal da Organização Pan Americana da Saúde (Opas), foi feito um apelo à Nicarágua para que o país adote uma quarentena voluntária nacional.
O diretor de Emergências em Saúde da Opas, Ciro Ugarte, recomendou à população que siga as orientações das autoridades internacionais de saúde. “Ouvimos e recebemos comentários de várias entidades, incluindo associações médicas, que apelam à população para implementar ações de distanciamento social, e concordamos com essa medida”. Ugarte cobrou das autoridades nacionais transparência nas informações sobre o número de casos e de mortes.
Números
Nesta terça-feira, balanço dos órgãos de saúde informou que há 1.118 casos positivos e 46 mortes por covid-19 no país. Na última semana, foram registrados 359 novos casos e mais 11 mortes. Os números, ainda que muito abaixo dos registrados pela contagem do Observatório Cidadão, baseada em informações da população e de especialistas, chamam a atenção pelo rápido aumento.
A Nicarágua registrou o primeiro caso da doença no dia 18 de março. Até o dia 26 de maio, tinham sido confirmados 759 casos de contaminação. Os 359 novos casos significam aumento de 47% em apenas uma semana. Em relação às mortes, o país passou de 35 para 46 (11 confirmadas na última semana), o que representa aumento de 31% em uma única semana.
De acordo com o Observatório Cidadão, até o dia 30 de maio, o país tinha 4.217 pessoas infectadas (3.458 a mais do que pelos dados do Ministério da Saúde) e 887 mortes suspeitas de covid-19 (852 óbitos a mais do que o informado pelo governo).