A maior disputa de poder depois que o senador Ciro Nogueira (PI) foi nomeado ministro da Casa Civil está agora concentrada na área econômica. A pressão da vez sobre o Palácio do Planalto é para a recriação do antigo Ministério do Planejamento. Depois de demarcar território por meio das chamadas emendas de relator, formando um orçamento secreto, como revelou o Estadão, o grupo conhecido como Centrão quer ampliar os domínios sobre a Secretaria de Orçamento Federal (SOF).
A reforma na equipe feita pelo presidente Jair Bolsonaro ressuscitou cobranças por mais trocas na Esplanada. O prestígio conferido ao Progressistas, principal partido do Centrão e até aqui comandado por Nogueira, dividiu aliados do governo e despertou insatisfações em siglas como o PTB e o Republicanos.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, perdeu poder no seu superministério para dar a cadeira de comando da Casa Civil ao Centrão. Com a escolha de Nogueira para o núcleo duro do governo, Bolsonaro teve de fazer remanejamentos, transferindo o general Luiz Eduardo Ramos, antigo titular da pasta, para a Secretaria-Geral. Por causa dessas mudanças, Onyx Lorenzoni foi deslocado para o novo ministério do Trabalho e Previdência, que nasce do fatiamento da Economia.
O apetite dos políticos, no entanto, não para por aí, como se viu no episódio do aumento dos recursos do Fundo Eleitoral para R$, 5,7 bilhões. O momento é delicado porque falta pouco mais de um mês para o envio do projeto de Orçamento do ano que vem. É nessa hora que aumenta a briga na Esplanada para definir quem pode ganhar mais espaço no Orçamento de 2022, ano de eleições em que as verbas precisam ser liberadas ainda no primeiro semestre, por causa das restrições da Justiça Eleitoral e do próprio calendário da campanha.
A perda da SOF, com a recriação do Ministério do Planejamento, seria a capitulação da política econômica de Guedes, que, desde o início, esteve ancorada na ideia de que um superministério poderia garantir mais união em torno da pauta liberal.
Emprego
Até agora, Guedes resistiu à pressão e está promovendo um enxugamento na Secretaria Especial da Fazenda, sob o comando de Bruno Funchal, para fortalecer a aproximação e integração da SOF com o Tesouro, com o objetivo de dar mais agilidade ao coração da área fiscal. À frente do novo Ministério do Trabalho e Previdência, Onyx, por sua vez, ficará com a responsabilidade de tirar do papel a política de estímulo ao emprego, peça de campanha fundamental para os planos de reeleição do presidente.
As mudanças têm provocado queixas de outros partidos que também apoiam o presidente e se sentem preteridos. O Progressistas de Nogueira, por exemplo, tem hoje a Casa Civil, a liderança do governo na Câmara com Ricardo Barros (PR), alvo da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, e elegeu o deputado Arthur Lira (AL) para a presidência da Câmara dos Deputados, com o apoio do Planalto.
Onyx é do DEM e está em campanha para o governo do Rio Grande do Sul, em 2022. Nogueira, por sua vez, quer ser candidato ao governo do Piauí. Os dois devem deixar a Esplanada em abril, ao lado de outros seis ou sete ministros que podem concorrer às eleições. Apesar dos ciúmes de aliados, Onyx não terá mais poder porque tem um orçamento de mais de R$ 700 bilhões, o maior da Esplanada. Trata-se de um gasto obrigatório com o pagamento de benefícios, que não mudam a correlação de forças. O que vai pesar nesse equilíbrio é o tamanho da carta que Bolsonaro lhe dará para o pacote do emprego, em boa parte já desenhado pela equipe de Guedes, que continuará no novo ministério.
O presidente do PTB, Roberto Jefferson, reprovou as mudanças promovidas na “cozinha” do Planalto para abrigar Nogueira na Casa Civil. Aliado de Bolsonaro, o ex-deputado insinuou que o presidente pode ser traído pelo novo ministro e disse que “não confiaria” em um político que apoiou o PT nas últimas eleições.
Em um passado não muito distante, Nogueira já chegou a definir Bolsonaro como “fascista” e, em 2018, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava preso, disse que ficaria com ele “até o fim”. À época, o Progressistas tinha a então senadora Ana Amélia (RS) como vice de Geraldo Alckmin (PSDB), que disputava o Planalto. Nogueira, porém, apareceu na propaganda eleitoral exibindo a hasthag #SouLula. Quando o ex-presidente foi mantido na prisão, ele migrou para a campanha de Fernando Haddad, candidato do PT.
“Eu não tiraria o general Ramos (da Casa Civil), disse Jefferson “Tem o general de confiança. Vai botar um civil? E um civil que o tempo todo, nos últimos 20 anos, apoiou o PT lá no Piauí”, afirmou.
O ex-deputado comparou a escolha de Nogueira ao que viveu o então presidente Fernando Collor meses antes de renunciar para não sofrer impeachment, em 1992. Logo no início daquele ano, Collor – hoje senador pelo PROS – nomeou Jorge Bornhausen, do PFL, para a recém-criada Secretaria de Governo. Não adiantou.
A aliança com o Centrão também constrangeu militares que faziam campanha contra o bloco do “toma lá, dá cá”, associado a “ladrões” pelo general Augusto Heleno, hoje ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
“O ambiente desconexo, desorientado e desunido da articulação política abriu suas portas às chantagens e aos interesses do até então execrado Centrão e fez com que o próprio presidente tornasse pública a sua simpatia pelo fisiologismo do grupo”, criticou o general reformado Paulo Chagas, em um manifesto. Antes bolsonarista, Chagas tem vocalizado o descontentamento na caserna. “Mais do que nunca, mudar é preciso.”
Um dos mais barulhentos representantes da militância ideológica, o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub fez duros ataques ao Centrão e provocou debates entre conservadores após Bolsonaro admitir que integrou o bloco quando era deputado. Em discussões virtuais, Weintraub questionou se algum ministro, à exceção de Onyx, defende Bolsonaro mais do que ele e o irmão Arthur Weintraub, ex-assessor da Presidência. O ex-titular da Educação afirmou não se adaptar à “sacanagem” e disse que o presidente está “nas garras do Centrão”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo