Para muitos, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem feito sucessivos esforços de campanha eleitoral – como as motociatas do Rio, São Paulo, Brasília, Uberlândia (MG), Santa Cruz do Sul (RS) e Santa Cruz do Capibaribe (PE) – muito antes do período permitido para tal. A tendência a driblar a lei eleitoral não se restringe ao Presidente, porém.
“Conforme os artigos 36 da Lei das Eleições e 240 do Código Eleitoral, a propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 15 de agosto – isto é, entre 16 de agosto e a véspera da eleição”, explica o advogado e professor de Direito Constitucional Antonio Carlos de Freitas Júnior. Ele acrescenta que, no caso de propaganda por televisão, rádio, comícios e reuniões públicas, “há vedação para 48 horas antes da eleição”.
Antes deste período, segundo o especialista, “as atividades políticas em geral são permitidas”. “A legislação antes de setembro de 2015 era mais restritiva, mas, com a Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015, houve um grande alargamento da possibilidade de atuação antes das eleições. Na verdade, a vedação expressa atual é que não se pode fazer pedido explícito de voto antes de 16 de agosto do ano da eleição.”
Além disso, explica Freitas, “menções específicas ao cargo e à necessidade de determinada pessoa exercer determinado cargo sugerem a realização de propaganda eleitoral extemporânea, fora de hora, que pode ensejar sanções da Justiça Eleitoral”.
A punição para este tipo de conduta é multa – podendo variar de R$ 5 mil a R$ 25 mil, “tanto para o beneficiário quanto para o responsável, podendo chegar ao custo do anúncio, se for por anúncio e este for de valor maior”.
Segundo Freitas, há dois outros problemas a considerar. “O primeiro diz respeito ao uso de canais, agendas e eventos oficiais para a exaltação de qualidades pessoais – o que, obviamente, ofende o princípio da impessoalidade, dentre outras repercussões jurídicas. O segundo eixo, no campo eleitoral, seria certo abuso do poder político e do uso dos meios de comunicação, que podem embasar o ajuizamento de ação de investigação judicial eleitoral com objetivo de impugnar a candidatura.”
Pedido explícito não pode – Mas participar de homenagens e eventos – e publicar fotos e vídeos nos perfis das redes sociais antes do período oficial – pode? “Pode, desde que não envolva o pedido explícito de voto; é necessário, portanto, o teor do que foi veiculado e falado em tais eventos ou publicações”, diz o advogado.
E o eleitor pode ser fiscal do processo eleitoral? “Sim: o eleitor tem papel fundamental no processo eleitoral”, garante. “Caso verifique alguma conduta irregular, ele poderá acionar o Ministério Público Eleitoral, pelos seus canais de denúncia e informação, bem como a própria Justiça Eleitoral, informando sobre irregularidades cometidas por meio da Ouvidoria do Tribunal Superior Eleitoral e aos Tribunais Regionais Eleitorais em seus sites e canais de denúncia.”
Como exemplo de campanha eleitoral fora de hora, o especialista cita um caso recente. “Julgando caso ocorrido nas eleições de 2020 no município de Queimadas (PB), o Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba manteve condenação, considerando como propaganda extemporânea o compartilhamento de vídeo, em rede social – que reproduzia a frase ‘o povo disse e pediu que de novo quer ele lá, agora como prefeito é o seu melhor lugar’ – por entender que a mensagem caracterizou pedido de votos e induzia o eleitor a votar no pré-candidato, influenciando, assim, o processo eleitoral.”
Outro: “Também nas eleições de 2020, em relação ao município de Maracaju (MS), o Tribunal Regional Eleitoral do Mato Grosso do Sul manteve sentença que considerou como propaganda extemporânea a publicação em rede social, por pré-candidato, de mensagem que continha as chamadas ‘palavras mágicas’ – termo utilizado quando o pré-candidato deixa de empregar a palavra voto e passa a fazer uso de expressões como ‘você me conhece’, ‘dê um voto a minha pessoa’, ‘conto com o apoio de vocês, ‘me ajuda aí pô’, ‘me ajuda a continuar projetos’ e ‘preciso dos amigos e da confiança de quem me conhece’. Ainda que não sejam explícitos, essas frases carregam em si os elementos sintáticos essenciais de um pedido de voto.”
Fonte:
Antonio Carlos de Freitas Júnior é advogado e professor de Direito Constitucional. Foi coordenador de políticas públicas de juventude na Prefeitura de São Paulo, presidente do Conselho Municipal de Juventude de São Paulo e Ouvidor na Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). Bacharel, Mestre e Doutorando em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em Direito e Processo Constitucional pelo Instituto de Direito Público (IDP). Autor de obras jurídicas voltadas para a prática da advocacia e concursos públicos em geral