Na Presidência, Bolsonaro não pode responder por suposto crime de rachadinha

Diário Carioca

Jair Bolsonaro (sem partido), enquanto presidente da República, não pode ser denunciado e responsabilizado criminalmente pelo suposto crime de peculato, ao qual a ex-cunhada do capitão reformado, Andrea Siqueira Valle, o acusa. Segundo o artigo 86 da Constituição Federal, o “Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”, ou seja, por crimes anteriores ou que não tenham relação com o mandato. 

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É o que se chama de “imunidade presidencial”, segundo a advogada Tânia Maria de Oliveira, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD). Caso o crime de peculato (apropriação de dinheiro e bens públicos para proveito próprio ou alheio) seja confirmado, Bolsonaro irá responder somente quando deixar a Presidência, na justiça comum. Até lá, a prescrição do crime segue suspensa.

A investigação em si, que é anterior à denúncia e, logo, à responsabilização, pode ocorrer. É o que ocorreu com o ex-presidente Michel Temer (MDB). Em 2017, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin autorizou a abertura de uma investigação contra o então presidente por um suposto crime cometido em 2014. Temer teria recebido R$ 10 milhões de executivos da Odebrecht para auxiliar na campanha de Paulo Skaf (MDB) ao governo de São Paulo nas eleições daquele ano.

Para Thomaz Pereira, professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e doutorando pela Escola de Direito de Yale, nos Estados Unidos, Bolsonaro apenas pode responder “se, enquanto estiver na Presidência, cometer algum crime relacionado a esse crime anterior”, como por exemplo uma tentativa de obstrução da Justiça.

Isso significa que se o presidente tentar atrapalhar as investigações pode configurar um novo crime, ainda que relacionado ao anterior, pelo qual ele pode responder criminalmente.

Neste caso, se for um crime comum que tenha relação com a Presidência, a denúncia é feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Por exemplo, recentemente, a ministra do STF Rosa Weber autorizou a PGR a abrir um inquérito para investigar Bolsonaro por suposta prevaricação no caso Covaxin.

Se for um crime de responsabilidade, a denúncia pode ser feita por qualquer pessoa, mas no âmbito da Câmara dos Deputados. Configura um crime de responsabilidade qualquer ato contra “a existência da União; o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação; o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; a segurança interna do País; a probidade na administração; a lei orçamentária; o cumprimento das leis e das decisões judiciais”, segundo o artigo 85 da Constituição Federal. 

O suposto esquema de “rachadinha”

Segundo Andrea Siqueira Valle, em três reportagens publicadas pelo site UOL, nesta segunda-feira (5), Bolsonaro montou um esquema ilegal de entrega de salários de seus assessores dentro de seu gabinete, mais conhecido como “rachadinha”, enquanto ocupava o cargo de deputado federal entre 1991 e 2018. Andrea é irmã de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda mulher do presidente. 

Conforme o relato da ex-cunhada, a então esposa do deputado recrutou familiares para trabalhar no gabinete do deputado federal: não seria necessário trabalhar todos os dias, mas apenas distribuir panfletos durante as campanhas eleitorais. O preço? Devolver 90% do salário todos os meses.

Andrea afirmou que Bolsonaro chegou a demitir do gabinete André Siqueira Valle, seu irmão, após se negar a entregar quase 90% de seu salário de assessor a Bolsonaro, em 2007.

“O André deu muito problema porque ele nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha que devolver R$ 6 mil, ele devolvia R$ 2 mil, R$ 3 mil. Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou: ‘Chega. Pode tirar ele porque ele nunca me devolve o dinheiro certo’”, afirmou Andrea à reportagem da colunista Juliana Dal Piva.

Tanto Andrea quanto André fizeram parte dos 18 parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda mulher do presidente, que foram nomeados para o gabinete de Bolsonaro, enquanto ainda era deputado federal.

Edição: Rebeca Cavalcante


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