Suspeição de Moro fortalece democracia e sistema de Justiça, analisam juristas

Diário Carioca

Ao decidir pela manutenção da suspeição do ex-juiz Sergio Moro no julgamento do processo do “triplex do Guarujá”, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deu um passo no sentido de fortalecer a democracia e as instituições brasileiras, segundo avaliam juristas ouvidos pelo Brasil de Fato. 


 


O entendimento de que o então magistrado foi parcial ao condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso “triplex do Guarujá” foi ratificado pela maioria dos ministros por 7 votos a 2, após longa e acalorada sessão na última quinta (22).  

Apesar da maioria formada, a sessão foi suspensa por um pedido de vista do ministro Marco Aurélio. O presidente do Supremo, Luiz Fux, também deve votar quando o julgamento for retomado. Todo o processo do triplex será anulado e terá que recomeçar do zero na Justiça Federal de Brasília após a decisão ser oficialmente confirmada.

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Para o jurista Marcelo Uchôa, professor de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor), tanto a manutenção da suspeição de Moro quanto o reconhecimento da incompetência da 13ª Vara de Curitiba responderam a uma necessidade histórica de deixar claro o que efetivamente aconteceu com o ex-presidente Lula e expuseram as ilegalidades da operação.

“É o começo da retomada da credibilidade das instituições para o Brasil. Faz com que comecemos a ter esperança de que daqui pra frente, todos os abusos e retrocessos e vulnerações jurídicas que aconteceram por força de ação da Lava Jato não aconteçam mais”, comenta Uchôa, que conclui:

“O julgamento acabou demonstrando que o presidente Lula só foi preso porque um juiz suspeito manobrou um processo judicial para que isso acontecesse. É fundamental porque mostra como ele sofreu uma injustiça”.

Golpe frustrado

Sérgio Graziano, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), concorda que a decisão do plenário evidencia como as condenações envolvendo o petista decorreram de um processo eminentemente político e repleto de intercorrências.

A exemplo do ministro Edson Fachin, que em decisão monocrática sobre a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba estabeleceu a “perda de objeto” de outros processos apresentados pela defesa do ex-presidente, como a suspeição de Sergio Moro.

Mesmo com a decisão da 2ª Turma do Supremo em março, que manteve a validade do habeas corpus em questão e declarou Moro suspeito, a discussão foi levada ao plenário novamente. 

O que, para Graziano, é um flagrante da possibilidade de atuação de exceção no tribunal. Sem poupar palavras, ele afirma que o ministro Edson Fachin tentou dar um golpe julgando a competência da Vara e, ao mesmo tempo, tentando salvar a Lava Jato e Sérgio Moro. 

“Uma tentativa de golpe muito grande e escancarada”, afirma. “O fato de ter ido ao plenário já é uma temeridade. Rever decisões de Turma é algo absolutamente inusitado, deixa instável, permite e legitima a prática de ‘ao gosto do cliente’ que está sendo julgado. Julgamentos de exceção com consequências gravíssimas em razão das injustiças que podem gerar”. 

“A democracia sai fortalecida, o sistema de Justiça sai fortalecido e Lula também. Não foi só a 2a Turma que decidiu por maioria. Foi uma ampla maioria que se formou a favor da democracia e da Constituição”, reforça o membro da ABJD.

Votos contrários

Houve bate-boca no plenário durante o julgamento após exposição do ministro Luís Roberto Barroso, que ao fazer uma enfática defesa da Lava Jato, destoou dos demais colegas. 

Ele chamou de “pecadilhos”, “fragilidades humanas” e “maledicências” o comportamento dos integrantes da Operação e reprovou as mensagens publicizadas pela Vaza Jato.

“Manchou muito a trajetória dele, a forma como tentou conduzir, depois fazendo interrupções pontuais no voto do ministro Gilmar e querendo colocar que quem se opõe à Lava Jato, que quem decide pela incompetência da 13ª Vara e pela suspeição é corrupto. Tentou fazer isso com algumas sutilezas, entre uma frase e outra”, relembra Graziano.

O ministro Lewandowski, por sua vez, refutou o posicionamento e contrargumentou que ser crítico à força-tarefa não significa ser favorável à corrupção.

“Um juiz indicar testemunhas para a acusação não me parece pecadilho. A combinação do momento de oferecimento de denúncia, não me parece pecadilho. A combinação com relação a prisões preventivas”, rebateu, citando os efeitos econômicos da Lava Jato.

Barroso sustentou o argumento de que as mensagens obtidas pela Vaza Jato eram ilícitas e, posteriormente, também entrou em conflito com o ministro Gilmar Mendes. A sessão acabou com corte dos microfones dos magistrados  pelo ministro Luiz Fux.

A queda de Moro



Sergio Moro: ex-juiz, ex-ministro (do presidente Jair Bolsonaro, à direita) e atual suspeito de ter manobrado o Poder Judiciário para obter a condenação de um desafeto político/ Evaristo Sa / AFP

Com as transgressões processuais e rupturas constitucionais cometidas pela Vara de  Curitiba confirmadas pela instância máxima do país, Marcelo Uchôa defende que os personagens envolvidos sejam responsabilizados pelas ilicitudes cometidas contra o ex-presidente Lula e que afetaram Brasil como um todo ao interferir diretamente no pleito eleitoral de 2018. 

“Lula passou 580 dias presos, viu familiares morrerem e foi impedido de se candidatar à presidência A Lava Jato tentou passar uma borracha em sua história e promoveu uma criminalização da política que abriu espaço para fascismo”, ressalta. 

O jurista lembra que apesar da suspeição ter sido mantida e atestado que Moro “maquinou dolosamente o processo e frustrou o sistema de Justiça”, é preciso que as responsabilizações sejam investigadas pontualmente para que condenações contra o ex-juiz de fato aconteçam.

A primeira consequência, entretanto, é imediata com o evidente derretimento da figura pública de Moro e desmoralização da Lava Jato. 

“Ele [Moro] tinha certeza que ia entrar para a história como o grande super herói que resgatou o Brasil em um estado de calamidade e transformou em um mundo ético. O Moro hoje é um sujeito sem credibilidade”, afirma Uchôa. 

A ida de Moro para o Ministério da Justiça a convite de Bolsonaro após as decisões que tiraram Lula da corrida eleitoral e o fato de, após romper com o presidente, tornar-se diretor de uma empresa de consultoria americana que é dministradora judicial da Odebrecht, empreiteira investigada pela Lava Jato, são outros elementos que fortalecem duras criticas ao ex-juiz.

“Está mais do que escancarado que aquele super-herói é um moribundo que anda vagando por aí tentando ter credibilidade. No cenário jurídico, falar em Moro ou Dallagnol é atestado de completa alienação ou de burrice. Duas pessoas que não representam nada para o Direito. Frustraram a Justiça e desacreditaram as instituições que representam. Eles que defendiam o fim da corrupção corromperam violentamente o processo”, reprova o jurista.

Edição: Vinícius Segalla


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