Análise | Governo Bolsonaro ameaça desligar rádios MEC e Nacional sem plano de migração

Diário Carioca
               As rádios públicas MEC e Nacional do Rio de Janeiro estão sob ataque do governo de Jair Bolsonaro e correm risco iminente de serem desligadas. Ambas estão nas origens da música de concerto brasileira e devem ser tratadas como patrimônio histórico e cultural. A migração para a frequência FM deve ser o primeiro passo.
  As emissoras operam em AM e integram o sistema público de comunicação do Brasil.
  São geridas pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que não tem autorização Constitucional para tirá-las do ar. Além da ameaça de privatização, está previsto o fim da faixa AM até o ano que vem, determinado por decreto. O espectro deve dar lugar a faixa de internet 5G, o que faz crescer os olhos das operadoras.
Não está claro o plano para a Rádio MEC, no entanto. A EBC não migrou a emissora pública para a faixa FM, tampouco apresentou plano que contemple ouvintes do interior do estado. Eles podem acabar sendo abandonados. O desligamento da transmissão AM será o fim da estação. Com isso, o governo federal desliga também o passado da emissora, criada por um cientista visionário para promover a cultura e a educação e doada ao Ministério da Educação.
  A música de concerto brasileira também faz parte dessa história.
  Tanto a Rádio MEC quanto a Nacional foram berços de conjuntos e orquestras. É o caso da Orquestra Sinfônica Nacional (OSN), vinculada hoje à Universidade Federal Fluminense (UFF), com o mesmo propósito inicial: fomentar e difundir a nossa música de concerto.
O ataque do governo federal ocorre às vésperas do centenário da Rádio MEC (que é a mais antiga em funcionamento do país), fundada em 1923 como Rádio Sociedade. A música clássica foi o carro-chefe da programação da MEC desde o início, sendo a primeira emissora da América do Sul a difundir uma ópera completa – Rigoletto, de Verdi. 
Em décadas passadas, a emissora também investiu na construção de um espaço amplo o suficiente para abrigar uma orquestra sinfônica e fazer gravações. Hoje, esses estúdios estão fechados pela Defesa Civil e o plano de fazer ali, na sede da Rádio MEC no Campo de Santana, um Museu do Rádio está parado. Outro sinal claro do abandono.
A partir de 1983, a Rádio MEC foi dividida em duas. A música de concerto migrou para a nova frequência FM com alguns programas de gêneros como choro e jazz. Na AM, ficaram programas educativos e culturais, sobre ciência, infantis – como a Rádio Maluca, produzida por Zé Zuca e referência na área –, programas de divulgação cultural e segmentos da música popular.
Não é possível migrar essa programação para a MEC FM. Isso seria descaracterizar uma emissora consolidada que tem perfil e público distintos.
Rádio Nacional
Fundada há 86 anos, a Rádio Nacional sempre teve o papel de desbravar novos gêneros e difundir a cultura brasileira para o grande público. Já teve em seus quadros 16 maestros e 123 músicos regulares, em 1956. Na época, a famosa BBC de Londres, que também mantém uma orquestra, veio ao Brasil saber como funcionava a rádio brasileira.
A emissora se consolidou como a principal do país ao explorar todas as possibilidades radiofônicas – música, informação e dramaturgia. Hoje, tem perfil informativo com jornalismo premiado, foco no esporte e diversos gêneros da música popular.
Sobre a mesa, no entanto, há a ameaça de desligar a Nacional do Rio para que ela passe a transmitir a mesma programação da Rádio Nacional de Brasília. É uma clara tentativa de uniformizar e apagar os conteúdos múltiplos, distintos e diversos das estações.
  Para encerrar, reforçamos que antes de desligar as emissoras AM é imprescindível e urgente um plano de migração para o dial FM no estado do Rio. 
  A EBC e o governo devem ouvir quem ouve as rádios. A faixa AM tem alcance estadual. É preciso solicitar frequências nas regiões do Norte e Sul fluminenses, além de investimentos. Desligar as emissoras sem atender a esse público é gerar um apagão de informação.
*Isabela Vieira é jornalista da EBC e ativista do direito humano à comunicação e Raul d’Oliveira é contrabaixista e pesquisador da história da OSN/UFF.
            Edição: Mariana Pitasse


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