O primeiro dia de desfile das escolas de samba do grupo especial do Rio de Janeiro foi marcado por um incidente com o sexto carro da Grande Rio ainda na concentração.
A escola de samba de Duque de Caxias, cidade da Baixada Fluminense, foi a quinta escola a entrar no Sambódromo. O problema foi causado pela alegoria “O Carnaval em Minha Vida”. Muito largo, uma das rodas da alegoria ficou presa na agulha de acesso à pista da Avenida Presidente Vargas, quando estava sendo deslocada para entrar na Marquês de Sapucaí.
O incidente assustou os componentes que estavam no carro, caso da professora Juliana Santana, que há dez anos desfila na escola. Depois de ser retirada do alto do carro, após várias tentativas do condutor para soltar o carro preso na agulha, ela explicou o que sentiu.
“Ele [o motorista] tentava dar um tranco, várias vezes, como se o carro tivesse freado e não conseguia”, disse revelando ainda que chegou a sentir cheiro de queimado.A professora informou que, por medida de segurança, integrantes da harmonia da escola pediu para todos os componentes que estavam em pé na alegoria que sentassem para evitar um acidente.
O diretor da Grande Rio responsável pelo carro alegórico, Gilliard Castro, lamentou o imprevisto. “Era uma alegoria muita linda para a escola, mas acontece. A gente tem que encarar, e vamos embora”, afirmou se referindo à escola que naquele momento ainda fazia o desfile na avenida.
Gilliard descartou qualquer possibilidade de frustração pelo incidente. “O sentimento sempre vai ser de felicidade pelo trabalho feito no ano todo. A Grande Rio é uma grande escola e vai superar isso tudo tranquilamente”, ressaltou.
Segundo o presidente da Liga das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (Liesa), Jorge Castanheira, não há no regulamento qualquer punição para este tipo de problema na concentração. A única possibilidade seria caso a escola não conseguisse tirar a alegoria do local, o que prejudicaria a Mocidade Independente que já fazia a sua armação atrás da alegoria da Grande Rio, na concentração.
Com relação aos julgadores, a escola pode ser penalizada se eles concluírem que o quesito enredo foi prejudicado com a ausência da alegoria. “Ela deve perder certamente em enredo. Essa é uma circunstância do manual dos julgadores, que estão lá para avaliar. Mas com relação ao número de carros alegóricos, me informaram que ela passou com cinco carros, se passou com cinco carros está dentro do regulamento”, explicou o presidente da Liesa.
O presidente da Mangueira, Francisco de Carvalho, o Chiquinho da Mangueira, também lamentou o que aconteceu com a alegoria da Grande Rio, pois a verde e rosa desfilaria após a Grande Rio. “Eu lamento profundamente o que aconteceu, porque isso pode acontecer com a Mangueira também, tomara que não, mas a Grande Rio vinha fazendo um grande desfile. Isso é ruim para o espetáculo, mas o tempo que for necessário a Mangueira vai esperar”, disse.
Com o fim do desfile da escola de Duque de Caxias, o carro da escola foi retirado pelos reboques e conduzido pelo Sambódromo até a Praça da Apoteose, onde ocorre a dispersão das agremiações que desfilam. O incidente fez com que o desfile da Grande Rio ultrapassasse o limite de tempo para a apresentação, de no máximo 75 minutos. Com isso, a escola perderá 0,5 ponto. O enredo da escola de Duque de Caxias homenageou o comunicador Abelardo Barbosa, o Chacrinha.
Desfiles
O primeiro dia de desfiles do grupo especial foi também de enredos de protestos. A escola Paraíso do Tuiuti desfilou um enredo com a indagação: a escravidão no Brasil verdadeiramente acabou? A apresentação da agremiação da comunidade do Morro do Tuiuti, no bairro de São Cristóvão, emocionou o público no Sambódromo. A comissão de frente foi muito aplaudida. Ela trazia componentes que se revezavam ora como escravos ora como pretos velhos. A escola criticou ainda a exploração do trabalho no campo e nas minas e as mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Mangueira
A Mangueira animou o público com o enredo que criticou o corte de recursos da prefeitura e o modelo atual das escolas de samba que, em parte, ainda depende de grandes somas de dinheiro para garantir a produção das apresentações. A escola resgatou o carnaval popular. “A ideia é esta. É botar o povo para brincar”, disse Leandro Vieira, o carnavalesco da Verde e Rosa, que sambava entre os componentes durante o desfile descontraído que a escola fez, e que teve resposta positiva do público.
A bateria da escola veio com os ritmistas caracterizados de bate-bola, importante personagem do carnaval de rua. A Mangueira também homenageou blocos tradicionais do Rio de Janeiro, trazendo alas homenageando o Bafo da Onça, Cacique de Ramos e o Cordão da Bola Preta, entre outros.
Em um dos carros alegóricos, uma escultura representava o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, ao lado de uma frase: “Prefeito pecado é não brincar o carnaval”, uma alusão à polêmica do corte de recursos como subvenção às escolas de samba. Em outra alegoria, a Mangueira trouxe um de seus símbolos: o cantor e compositor e presidente de honra da Estação Primeira, Nelson Sargento.
São Clemente
A segunda escola a entrar na avenida no domingo, a São Clemente homenageou a Escola de Belas Artes, onde o carnavalesco Jorge Silveira se formou. A escola do bairro de Botafogo falou de Debret e a sua influência nas artes brasileiras. Lembrou ainda a participação de ex-alunos e professores que trabalharam nas escolas de samba e ajudaram a construir a história do carnaval carioca.
Vila Isabel
A Unidos de Vila Isabel destacou os grandes temas ambientais que terão reflexo no futuro do planeta. O enredo, Corra que o futuro vem aí, a escola defendeu a preservação do meio ambiente. O carnavalesco Paulo Barros ousou mais uma vez com alegorias vivas, aquelas em que os componentes fazem movimentos intensos durante o desfile.
Barros disse, em entrevista à Agência Brasil, que nem mesmo a mudança no grupo de coreógrafos da comissão de frente, formado por integrantes caracterizados de Leonardo da Vinci, faltando poucos dias para o desfile, abalou seu trabalho no barracão. “Eu não meço esforços para aquilo que eu pretendo. O que é necessário eu faço”.
Império e Mocidade
Duas escolas falaram de costumes e influências de outros países no Brasil. O Império Serrano abriu os desfiles no domingo e evoluiu mostrando os caminhos das viagens de Marco Polo, importante viajante da idade média que explorou o comércio com países da Ásia, principalmente a China.
No fim do desfile, o percurso de Marco Polo termina com o retorno da escola de Madureira, quando ele se depara com a festa do carnaval, que, coincidentemente, é na mesma semana do Ano-Novo chinês, comemorado na sexta-feira, dia 16.
A outra escola foi a Mocidade Independente de Padre Miguel, agremiação da zona oeste do Rio, que desfilou com o enredo destacando o que há de influência da Índia no Brasil. Mostrou as frutas originárias do país asiático, que são cultivadas por aqui, entre elas, a manga, jaca e, principalmente, a cana, de onde se extrai o álcool e o açúcar, importantes produtos da economia nacional .
A verde branca apresentou alegorias bem acabadas, entre elas, um enorme carroo com baianas e produtos indianos “É um tabuleiro da baiana cheio de Índia. A gente não faz o caminho das Índias, a gente mostra o que existe dentro do Brasil”, disse o carnavalesco Alexandre Louzada.
O desfile da Mocidade terminou quando o dia amanhecia, destacando ainda mais as cores da escola do bairro de Padre Miguel.
Morte
O mal-estar por causa do calor ou pela ingestão de bebidas alcoólicas provocaram a maioria dos casos, pico de hipertensão, torções e pequenas fraturas. Na prieira noite noite de desfile das escolas de samba do grupo especial do carnaval do Rio, 15 pessoas com casos mais graves precisaram ser transferidas para hospitais.
Uma senhora de 63 anos, vítima de mal-súbito, levada ao Hospital Municipal Souza Aguiar, não resistiu e morreu. Ao todo, a Secretaria Municipal de Saúde disponibilizou 15 ambulâncias equipadas com Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) para transportar os casos mais graves. A Central Municipal de Regulação dá suporte aos casos de necessidade de transferência de pacientes.
Segundo a secretaria, foram atendidos 573 foliões nos postos médicos montados no Sambódromo, na Avenida Marquês de Sapucaí, das 16h de domingo (11) até as 4h de hoje (12). Os desfiles terminaram por volta das 7h da manhã. Ao todo, desde os primeiros dias de desfile, foram feitos 1.079 atendimentos.
Os sete postos médicos instalados no sambódromo voltam a funcionar mesta segunda-feira, a partir das 16h, e prestam atendimento até o fim dos desfiles e saída do público da Sapucaí.